Agosto de 2013

A primeira curtida despertou interesse mútuo, Alice na correria da vida usou algumas palavras chave para entender o que era Bernardo. Parecia interessante seu jeito de falar e as atitudes maduras que propunha ao conversar. Teve sinceridade de ambas as partes, atualmente o amor romântico está em declínio, porém as estatísticas mostram que a palavra apaixonado é uma das mais procuradas nos sites de busca. Alice estava desimpedida, buscava conhecer pessoas novas com ou sem compromisso, era experiente, madura, certeira. Bernardo estava correndo atrás de seus objetivos, incansável, almejava muitas coisas boas, trabalhador e inegavelmente atraente. Teve muita troca de ideias, ela se mostrou interessada, ele a encheu de elogios. No final vários beijos dentro do carro. Um adeus, e novamente estavam sós. Uma semana se passou até o segundo encontro, muita conversa, decisões, exposição de pensamentos, beijos, carinho. Pra Bernardo já não importava muita coisa, passou a semana toda pensando nela. Estar ao seu lado o trazia paz. Pra ela estava bom, apenas conhecendo um cara legal. Foram pra casa dela, fizeram muito sexo naquela noite. Houve sentimento, ela se entregou, ele a satisfez por completo. No dia seguinte foi embora, novamente seguiram suas vidas. A conversa continuou por mensagens. Ele queria vê-la porém ela dizia estar trabalhando demais. Passaram duas ou três semanas até o terceiro encontro. Muito carinho, conversa, beijos e sintonia, além do sexo intenso que acontecia pela segunda vez. Na hora de ir embora ele pediu pra ela prometer que não ficaria mais tanto tempo sem vê-lo. Partiu esperançoso, pensando estar partilhando de mútuo sentimento. Passaram -se dois meses desde o último encontro. Combinaram de se ver numa balada.

Tocava uma bela música eletrônica ao fundo, nao importava diante do olhar inesquecível, que já havia se encontrado dentro de sí, e continuava buscando uma liberdade inexplicável.

Bernardo, quando avistou esse olhar, sorriu com os olhos. Por dentro lágrimas, de tristeza e felicidade. Há dez anos atrás passou situação semelhante com Juliana. Superara fazia pouco tempo, e sem intervalo conheceu Alice há alguns meses, acabando com suas esperanças de ser feliz sozinho. Levando ao conhecimento de sua vida a força de duas noites de sexo envolvente e a abstinência de olhos negros como tempestade. Entreolharam-se, beijaram-se no extremo calor da vida, entregando ao corpo doses fartas de serotonina, iludindo o amor. Bernardo, entre as luzes de neon, disse:

- Fico perguntando-me por que você faz isso comigo. Nao é tão fácil a gente se apaixonar no decorrer da vida. Se estamos com o mesmo pensamento por que não apostar na felicidade?

Alice penetrando em seu corpo com os olhos respondeu:

- Preciso ver mais, o tempo nos traz a realidade mesmo sem querermos. Ele nos mostra a verdade mesmo sem pedirmos. Vamos deixar o tempo agir por nós.

- O que posso te mostrar de mim estando tão distante? Somente acompanhando teus passos por redes sociais. Sem saber teus pensamentos, sem compartilhar meus sonhos, sem toque, sem olhar nos olhos...

Alice, lúcida, compenetrada nas próprias palavras explicou:

- A vida é uma sequência de perdas e ganhos, erros e acertos. Tudo é definitivo e tudo é passageiro. As consequências de cada ação vem quando já esquecemos. Por isso não entendemos.

Bernardo seguia tenso, apaziguado pelos entrebeijos e carícias que não supriam metade da sua sede por Alice. Abaixando um pouco o olhar, continuou:

- As vezes acerto, as vezes erro, e sei que isso é fatal nesse jogo. Será que a vida quer de mim tanta resiliência? É tão cansativo pra mente, pro corpo, não conseguir nada além do básico. Eu quero ir a fundo, no teu seio, entre tuas pernas, sentir teus cabelos, tua língua. Esbarrar no teu amor.

Nesse momento mirou fundo na íris dela, percebendo ainda mais cores dentro do seu olhar. Ela respondeu passando a mão em seu rosto:

- Sim. Momentos assim tem valor pra mim, como já tivemos. Mas você se confundiu dentro de si, em seus próprios sentimentos. Precisa se conhecer, aceitar, saber o que quer primeiro.

- Finge que se preocupa, que quer alguma coisa. Mas foge, observa de longe, parece até que posso te fazer mal. Busca o tudo em sí próprio, zela pela liberdade de ser quem é. Entrega-se aos dias, um de cada vez, tornando-o parte de sua construção, e não me deixa fazer parte de nada.

- Talvez seja esse o segredo da vida, dedicar cada dia a nosso favor. E no final teremos uma vida inteira de dedicação ao autoconhecimento... Prazeres passionais? Já vivi todos, já sofri todos... Mais do que você certamente. Afinal são dez anos de diferença entre nós

- Ja conheço teus trejeitos. Sei que não precisa de amor quando está em boa fase. Prefere amar-se do que ser amada. Julga a vida como ela é. Tende a ser fria nas horas certas. Pensa primeiro em sí. Seu coração está em constante transformação, transpirando uma luz que pode ofuscar a visão, e até cegar quem se aproximar demais.

- Enxergar além dos olhos não é uma tarefa fácil, é preciso muita prática. Em você enxerguei potencial, mas não está pronto ainda para dar o que eu quero.

Nesse momento ela molhou os lábios com água, desfrutando de suas virtudes inconscientes, valorizando sua sensualidade intrínseca, mostrando que é difícil viver. Bernardo sentindo -se desiludido, pasmo, obsoleto, antiquado, imaturo, idiota, descrente e sozinho, ainda ponderou:

- Com esses cabelos negros que refletem como prisma, tu consegue tudo que quer. Carimbando a vida das pessoas sem aviso prévio. Extinguindo esperanças de te conquistar. Mostrando que a vida é muito mais escorregadia do que parece.

Alice não precisava dizer mais nada, estava suprema, linda, inteira, plena, sóbria, decidida e livre, disse apenas, "com certeza".