Ele Disse Adeus...
Entrei no restaurante apressada. Já estava atrasada para o almoço com meu marido. Procurei localizá-lo e fui até a sua mesa. Estava surpresa e feliz com seu convite. Nós dois trabalhamos muito e geralmente só nos vemos à noite. Quando ele ligou me chamando para um almoço com ele, fiquei super feliz.
Ele estava sério e parecia nervoso. Eu cheguei alegre e feliz e o cumprimentei com um beijo. Comecei a conversar descontraidamente. Ele continuava sério. Perguntou o que eu queria beber e o que iria pedir.
-Aconteceu alguma coisa? Você está tão sério.
-Preciso ter uma conversa séria com você. Por isso te chamei pra almoçar comigo.
-Uma conversa séria? Não poderia ter aguardado até a noite?
-Não. Prefiro não ter esta conversa com você em casa.
-Vamos conversar então.
Eu já estava séria e sem graça. Estava pressentindo que o assunto não seria nada agradável. Ele respirou fundo e disse:
-Eu não quero que você pense que sou um canalha.
-Se você não me der motivos pra pensar assim, eu não vou pensar.
-Olívia, é difícil pra mim falar…
-Fale, Paulo. A melhor maneira que existe pra abordar um assunto é de forma direta. Não somos crianças. Somo adultos e podemos encarar qualquer coisa de frente.
-Eu quero me separar de você.
-Como?
-Sim. Eu já tomei minha decisão. Eu vou sair de casa. Os trâmites legais a gente vê depois.
Enquanto ele falava, em poucos segundos passou um filme por minha cabeça. Há seis meses, no reveillon, nós fizemos uma viagem linda, como uma segunda lua de mel e estávamos apaixonados, ainda ontem estivemos nos braços um do outro nos amando como sempre. Nada de anormal. Como este homem pôde fingir tão bem?
-Você tomou a decisão? Como isto aconteceu? Quando foi que você tomou a decisão? Todos estes dias estávamos tão bem. Pensei que você continuava me amando como eu continuo lhe amando.
-Bem, as cosias vão acontecendo e quando a gente percebe, não dá mais pra continuar.
-Existe outra?
Ele ficou um pouco desconcertado.
-Não, não existe. Acho que casei muito novo e não curti a vida como devia. Chega uma hora em que a gente quer ser livre. Quer ter seu próprio espaço e autonomia pra ir e vir sem compromisso com ninguém.
-Que desculpa mais fajuta. Eu nunca cerceei sua liberdade. Nós sempre tivemos espaço e autonomia.
-Acho que não adianta a gente ficar discutindo este tipo de coisa. Minha decisão está tomada. Vou tirar a tarde livre pra pegar minhas coisas na sua casa. Quando você chegar a noite eu já terei ido embora.
A minha vontade era de chorar, de dar vazão ao nó que estava em minha garganta. Mas eu me mantive firme.
-Já estava tudo programado então? Até um lugar pra você se mudar? Como você pode ser tão dissimulado? Até ontem estávamos dividindo a mesma cama e nos amando como se estivesse tudo bem. Como você pôde agir assim comigo? Estou enojada.
-Eu não sou dissimulado. E não tem nada arranjado e nem programado. Vou para um hotel por enquanto.
-Por enquanto?
-Sim, até encontrar um lugar pra ficar.
Eu não conseguia dizer mais nada.
-Podemos almoçar? Eu quero resolver logo as coisas.
-Você acha que eu tenho condições de almoçar? Não sou fria e dissimulada como você.
-Como você disse, somos adultos e temos que agir como tal.
-Quando você contratar um advogado para tratar da separação você me avisa.
Levantei e sai do restaurante com toda a classe e elegância de que fui capaz.
Já no meu carro, me recusei a chorar. Dirigia com calma e tentava me concentrar no trânsito. Mas em minha cabeça os pensamentos fervilhavam.
Eu conheci Paulo quando ele entrou para a faculdade de medicina. Eu já era uma médica, especialista em neurocirurgia, eu já tinha todas as graduações, pós graduações e doutorados. Era professora e quando ele foi meu aluno começamos a flertar.
Ele é quatorze anos mais novo que eu. Mas isto não tinha a mínima importância pra nós.
Ele sempre foi um cara centrado e meio nerd. E nos apaixonamos perdidamente.
Eu já era uma médica conhecida, tinha minha clínica muito bem conceituada. Ele estava com vinte anos e cursando ainda medicina.
Seis meses depois de nos conhecermos ele foi morar em meu apartamento. Vivíamos um amor lindo e delicioso. Ele era cativante, um pouco introvertido como todo nerd, meio caladão, extremamente inteligente e apesar da pouca idade, era culto e tinha muito bom gosto e maturidade.
Na cama a gente se encontrava e era uma loucura. Só, carinho, amor e prazer.
Depois que ele se formou, nos casamos.
Durante todo este tempo que estivemos juntos eu fui, a princípio, seu suporte financeiro e emocional. E durante todo o tempo em que estivemos juntos eu o ajudei com sua clínica, com minha experiência.
Se hoje ele é um médico renomado ele deve muito a mim que estive ao seu lado, ajudando, incentivando, compartilhando experiências e capacidades. Mas nunca cobrei e nem vou cobrar nunca. Fiz tudo por amor, por companheirismo, por fidelidade e cumplicidade. E quando se age por amor, o que se faz não tem preço.
Agora, depois de vinte anos juntos, ele vem e me fala com a maior naturalidade que quer se separar. Que quer seguir sua vida sem mim. Que quer ser livre para curtir sua vida.
Por alguns momentos ali naquele carro as lágrimas insistiam em rolar, mas eu me contive.
Cheguei em minha clínica e fiz todos os atendimentos que estavam programados, mesmo morrendo por dentro.
No fim do dia, ainda sem conseguir comer nada, já que um nó amargo permanecia em minha garganta, fui para casa.
Cheguei e ele já tinha se retirado com tudo que lhe pertencia.
Sentei então no chão e chorei. Nem sei por quanto tempo estive ali chorando, me desesperando, morrendo de pena de mim. Pensei que não conseguiria sobreviver.
Eu estava completamente sozinha. Eu fiz todas as vontades dele e agora estava ali sozinha. Nem filhos eu tive porque ele não queria ser pai, me queria só pra ele, como dizia.
E agora ele me deixa no total abandono. E eu pensava, eu recordava tudo e chorava.
Eu chorei toda a mágoa, toda a dor, toda a tristeza que a decisão dele me causou.
Ele não me amava mais, mas eu continuava o amando como no primeiro dia que o vi.
Eu estava sofrendo, era quase uma dor física. Era um incômodo que feria minha alma como um espinho.
Depois de muito tempo, levantei, tomei um banho e me lavei daquele dia.
Finalmente consegui fazer um lanche pra me manter em pé.
Eu vesti minha melhor camisola e fui pra minha cama. Aquela cama que dividi com ele por tanto tempo. Eu me apossei daquela cama que agora era só minha. Consegui dormir e me refazer para o dia seguinte.
No dia seguinte eu me arrumei e fui trabalhar. Senhora me mim, eu entrei na clínica e embora meu coração ainda sangrasse eu não demonstrava nada.
Dias depois fiquei sabendo que ele não só estava com outra como ela estava grávida. Ele estava dando de presente a ela o filho que recusou a mim. Por isso ele apressou a nossa separação.
Ele não só foi canalha comigo como foi também covarde.
Nunca achei que ele devia gratidão a mim por tudo que fiz por ele, mas sempre pensei que merecia o seu respeito. E ele me desrespeitou ao se deitar comigo estando já com outra.
O tempo passou. Meu coração cicatrizou, eu voltei a viver em paz e sem mágoa ou raiva. Meses depois eu me dei de presente férias e uma viagem.
Quando voltei estava tranquila, descansada e pronta para uma nova etapa em minha vida.
Hoje, depois de três anos de separação, eu já o esqueci. Não sinto mais nada por ele. Já posso encontrá-lo sem sobressaltos no coração. Ele conseguiu matar em mim todo aquele amor que eu sentia.
Ele, no entanto, já se separou daquela mulher que na realidade foi só uma aventura. Ele trocou uma vida de amor e companheirismo por uma paixão, por uma aventureira que queria dar o golpe da barriga e garantir uma alta pensão alimentícia. Sei que ele se arrependeu e algumas vezes deu sinal de querer voltar pra mim. Mas eu não voltaria pra ele nem que ele fosse o último homem na face da terra.
Estou sozinha, mas aberta a novos encontros. Sei que um dia vou amar de novo. E de novo, se preciso. Eu sou uma mulher forte, determinada, cheia de vida e personalidade.