Livre Pra Me Amar

Eu acordei, olhei em minha volta. Demorei alguns segundos pra colocar minhas idéias em ordem e processar aquela situação. Novamente eu tive uma recaída. Olhei para o lado e estava sozinha naquela cama que me parecia tão imensa quanto a vergonha que eu sentia de estar ali. Sentia uma ressaca moral, sentia que mais uma vez eu quebrei a minha promessa e me desrespeitei como mulher inteligente e independente.

Não queria me levantar. O que eu queria era desaparecer dali e aparecer em minha cama.

Finalmente eu me levantei, me arrumei, vesti minhas roupas.

Sobre a cadeira um bilhete: “A noite foi maravilhosa, quando sair jogue a chave por debaixo da porta. Saí para caminhar e me exercitar. Vou demorar.”

Uma lágrima rolou por minha face. Não por este descaso, mas por vergonha de mim mesma.

Eu me refiz e saí dali. Peguei um táxi. Durante o trajeto eu olhava para o nada.

Cheguei em casa sem coragem de me olhar no espelho.

Entrei no chuveiro e tomei um longo banho.

Feito um filme tudo passava por minha mente.

Eu conheci o Leo em uma festa há três anos. Ele é o tipo de homem envolvente e cativante que sabe levar qualquer mulher na sua conversa. É um homem lindo, másculo, que transpira charme e sensualidade, além de um carisma que deixa qualquer mulher encantada.

Eu estava sozinha há algum tempo. Na realidade nunca havia me apaixonado verdadeiramente por ninguém. Tive alguns relacionamentos passageiros e sem importância, do tipo sem compromisso. Apenas envolvimento físico. E muitas vezes sexo casual.

E ao conhecê-lo eu me encantei. Quando eu estava com ele era como se não existisse nada nem ninguém em volta.

A princípio ele me tratava como uma deusa. Sabe capturar suas presas. Por seis meses nós vivemos um amor intenso e eu me sentia a mulher mais feliz do mundo. Ele sabe como agradar uma mulher, como deixá-la alucinada de amor e prazer.

Aos poucos ele foi se tornando distante e só me procurava quando me queria em sua cama. Eu mendigava sua atenção e todas as vezes que ele me procurava eu me entregava facilmente. Eu era uma presa fácil pra ele e perdi o meu amor-próprio, minha autoestima, minha capacidade de me preservar.

Eu o procurava e ele me desprezava. Ficava dias sem me ligar ou me procurar, mas era só ele fazer um sinal que lá estava eu em seus braços.

Meus amigos não conseguiam entender o que estava acontecendo. Eu que sempre fui dona das situações, estava ali presa naquele relacionamento tão sem reciprocidade.

Depois de mais de dois anos eu comecei a cair na real e sentir que precisava sair daquela situação incômoda.

Ele se sentia confortável achando que eu sempre estaria à disposição dele pra quando ele quisesse me usar. E eu sempre me enganava e tentava enganar a todos dizendo que se ele me usava eu o usava também pois sentia um prazer enorme com ele.

Mas não era assim. Ele nunca estava a minha disposição pra quando eu quisesse usá-lo.

Sempre era quando, como e onde ele queria.

Comecei a prometer a mim mesma que não mais aceitaria aquela situação. Mas muitas vezes a paixão e tesão que sentia por ele me fazia capitular e cair em seus braços.

Desde de uma vez que saímos juntos e ele me deixou sozinha dormindo em um motel, eu prometi a mim mesma que eu não sairia mais com ele. Pra mim foi o máximo do desrespeito e falta de amor.

Muitas vezes ele ligou e pediu perdão, explicou o que o fez tomar esta atitude, disse que foi uma emergência mas que nunca mais faria nada para me magoar. Eu me mantive firme e irredutível por um tempo.

Mas agora novamente, feito uma mulher que não se valoriza, eu caí nos braços dele. Ele me encontrou em uma festa nessa noite. Aos poucos foi me envolvendo, tirando meus sentidos, minha capacidade de pensar e de me preservar. E eu acabei em sua cama pra ser desprezada mais uma vez e acordar sozinha como se não merecesse a atenção e carinho de um homem. Aquela noite de prazer intenso não valeu a pena. Eu me senti péssima. Eu me senti como uma mulher qualquer que só serve pra ser usada e descartada.

Depois desse dia ele me procurou algumas vezes e eu me recusei encontrá-lo. Evitava encontrá-lo pessoalmente pois sabia que poderia não resistir aos seus encantos.

E eu acabei encontrando pessoalmente com ele. Ele veio com todo o charme e o encanto que tanto sabe jogar em cima de suas presas.

Eu estava louca de vontade de cair nos braços dele. Ele me beijou e eu me entreguei. Ele sugeriu irmos pra minha casa. Eu aceitei.

Durante o trajeto eu fui pensando e na minha cabeça foi passando tudo que eu já tinha vivido com ele. Ele nunca me respeitou como mulher. Ele nunca me tratou como se eu tivesse importância pra ele. Eu senti que não poderia mais aceitar aquela situação. Se eu sucumbisse mais vez depois de tantas promessas a mim mesma, eu perderia de vez o respeito por mim.

Chegando na porta da minha casa eu disse que não queria mais nada com ele. Que ele não iria entrar. Que nossa história terminava ali. Que eu não aceitava mais ser tão desrespeitada. Que ele nunca mais me procurasse ou falasse comigo.

Ele tentou argumentar. Não adiantou, eu estava irredutível. Tentou me beijar pra me fazer perder o juízo e eu me mantive firme. Finalmente eu estava conseguindo me libertar dele, me amar, me valorizar.

E disse pra ele tudo isto que eu estava sentindo.

Ele, com cara de paisagem, ainda fingia não saber que eu aprendi a me amar. E agora eu me amava muito mais do que eu o amei. Ele, embora pedisse todos dias para me perder, não acreditava que eu fosse capaz de colocar um ponto final naquele relacionamento abusivo e desrespeitoso.

E eu, soberana e empoderada, entrei em casa. Sorri o meu melhor sorriso.

Tomei um longo banho pra me lavar definitivamente da presença dele em mim.

Borrifei em meu corpo o meu melhor perfume. Vesti minha lingerie e camisola mais lindas, guardadas para uma ocasião especial com ele.

Olhei-me no espelho, ajeitei meus cabelos e sorri me achando linda.

Deitei em minha cama livre leve e solta. Entre um pensamento e outro de liberdade e de livramento, grata a mim mesma pela atitude que tomei, adormeci feliz.

Nádia Gonçalves
Enviado por Nádia Gonçalves em 24/12/2021
Reeditado em 24/12/2021
Código do texto: T7414327
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