Reencontro

Saiu de casa. Nos primeiros instantes lhe pareceram determinados os passos. – Nunca mais volto, pensou. Hei-de fazer vida em qualquer outro lugar mas aqui, decididamente, nunca mais, pensou. Ainda um último olhar para a rua que se afunilava nas suas costas e pareceu-lhe que ali ficava uma parte importante de si mesma. Deixava a dependência e ainda estava tenra para a autonomia que teria de enfrentar. Quando chegou ao destino achou estranhos os usos, as pessoas, a maneira de estar e de pensar.

Chorava sempre que se recolhia para dar descanso ao corpo moído do trabalho. As mãos tornaram-se avermelhadas e grossas, as unhas sem verniz eram cortadas rente e os cabelos enrolados dentro da touca acabavam por tornar grotesca a sua figura.

Dele nunca mais soubera. Quando obteve uns dias de licença, quase sem pensar, voltou à sua terra. Fervilhava a Praça com a romaria dos santos e muitos dançavam ao som roufenho dos altifalantes do circo.

Reconheceu-o . Bebia numa barraca. Estava só, magro e calado. Mostrou-se e não foi notada. Poderia ter evitado o encontro, poderia ter ido gozar a licença para outra terra, poderia não ter desejado vê-lo de mais perto. Em vez disso, apagou todos os registos penosos, aproximou-se dele, abraçou-o e perguntou: - ainda te lembras de quem eu sou? A resposta que não deu, aflorou ao rosto moreno e ela leu-a: - a mulher da minha vida!

Edgardo Xavier
Enviado por Edgardo Xavier em 23/12/2021
Código do texto: T7413858
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