O Passado
Nas histórias diferentes que contamos há, subjacente, um conto remissivo. Temo-lo inconsciente ligado a palavras nem tão essenciais. Fazemos associações, fugimos para o outro lado dos conceitos, das cores, dos cheiros mas a ideia volta, aflora, espreita-nos a distracção e acorre ao débil chamado interior.
Depois de ter muitos anos Rosa Maria, olhando para o rasto da sua vida amorosa, no meio do vendaval de afectos, de procuras, de ganhos e muitas perdas defrontava-se, sempre, com as três grandes referências, síntese perfeita mas desgarrada do que poderia ter valido a pena. O primeiro amor cujo odor, falas e evocação a empolgara, O homem espiritual e sexualmente neutro que lhe fez os filhos e o que agora tinha, velho e acomodado, em cujo olhar repousava. Todos os demais chegaram sem ideias de ficar e, se marcas deixaram, apagara-as à força de as refutar.
Pousadas as mãos no regaço, olhos perdidos na brancura da cal, Rosa vi-os chegar e, uma vez mais se perdia de fulgor, de mornidão, de quase indiferença em ondas sucessivas de emocionadas memórias. Agora é tarde, pensou, mas se pudesse voltar ao passado e os achasse ao mesmo tempo, enfrentaria o povo da terra, os pais e o resto da família que tinha em França e haveria de dizer-lhes: - gosto de maneira diferente destes três. Fico com todos.