Despedida

Ela olhou em volta e sorriu com os rostos conhecidos. Droga, ia sentir falta de tudo isso. As vozes, os risos, suas bochechas ja doiam de tantos sorrisos que deu desde que se sentou no barzinho. Claro que nenhum dos risos foi forçado ou fingido, mas quando seus olhos cruzaram com os dele, foi como se cada um dos momentos anteriores ganhassem um tom mais cinza. Ele nunca perdia esse efeito que tinha nela.

Ele deu um sorriso hesitante, ja tinha percebido que ela parecia um pouco diferente aquela noite, mas realmente parecia estar se divertindo. Ela não bebeu, ele notou, mas antes que pudesse refletir mais, seu celular vibrou com uma notificação dela.

"Preciso falar com você a sós, tudo bem?"

"Sim, quer ir agora?"

"Me dê um momento no banheiro, te encontro na praça?"

"Claro"

Ela não estava se acovardando, não, só precisava jogar um pouco de água no rosto e então estava pronta. A praça não era uma escolha tão boa, eram lembranças demais, mas estava feito. Quando saiu do banheiro, encarou alguns dos seus amigos e preferiu não pensar muito nas reações que vira no rosto daqueles que entenderam para onde ela estava indo. Não importava realmente, ela precisava fazer isso.

Ele estava encostado em uma pilastra, ainda se lembra de como ela não gosta de ter conversas sérias sentada tão perto. E aquela parecia ser uma conversa séria. Ele não ficou surpreso quando ela apareceu nervosa, as mãos no bolso da jaqueta, sua destra as vezes escapando para mexer com seu colar. Um tique ansioso. Ele esperou.

— Eu estou indo embora. - Ela começou de forma abrupta. Eles não estavam tão perto um do outro, mas não tão longe que ela precisasse gritar. Ele abriu a boca, sua cara em uma expressão confusa e ela explicou antes que ele falasse. — Não agora, hoje, estou me mudando. De cidade... De estado.

Ele fechou a boca completamente surpreso. Ela olhava em volta, diretamente pra sua orelha, seus pés, mas nunca no olhos dele porque sabia que perderia a coragem.

— Ninguém sabe ainda, vou contar quando voltarmos, mas eu precisava... - Ela respirou frustrada com seu proprio nervosismo, suas unhas cravaram na palma da mão na tentativa de parar de tremer. — Eu não posso ir sem te falar algumas coisas. Não posso deixar isso pairando pela minha cabeça.

— Hum... Ta bem, eu acho. - Ele não ia mentir e dizer que não estava nervoso, tinha o pressentimento de onde estava indo essa conversa, mas o fato é aquilo ali era sobre ela. Não sobre ele. Não sobre eles. — Me diga o que quiser, sabe que sempre pode me dizer tudo.

Ela sorriu, não riu, mas lhe deu um sorriso doce. Embora tenha achado graça, ela achou melhor não ir por esse lado se quisesse realmente se libertar desse nó na garganta de vez. Então ela fechou os olhos, inclinou a cabeça pra trás só um pouco, o suficiente para que quando suas pálpebras abrissem, tudo o que ela pudesse ver fosse o céu estrelado.

— Eu amo você, sabe. - Um sorriso involuntário tomou a boca dela enquanto seu corpo ia parando de tremer. — Eu acho... Eu sei, na verdade, que nunca amei ou amarei alguém como te amei. Você foi meu príncipe encantado. O amor da minha vida.

Ela sentiu seus olhos queimarem, mas maldito seja seu sorriso que não saia dos seus lábios porque não importa o quanto doesse, ela ainda acha esse sentimento lindo. Seus olhos ainda estão cravados no céu quando ela continua:

— Quando falam de amor, quando leio sobre amor, ainda é você que vem na minha mente. Você foi uma parte da minha vida que sempre vou levar gravada em minha mente e meu peito. Eu amo nossa história, nossas lembranças, ainda me lembro do calor no peito quando ouvia sua voz pelo celular. - Ela desceu então o olhar ja se sentindo mais calma. — Mesmo depois de tantos anos do nosso fim desastroso, ainda amo você.

A respiração dele estava engatada. Ela não tinha terminado ainda.

— Todo mundo quer saber como a gente consegue ser amigo ainda, depois de tudo, mas só a gente sabe como foi difícil. Eu me lembro da primeira vez que nos abraçamos depois do nosso reencontro. Se tudo tivesse ficado bem ali... Mas éramos dois teimosos. - Ela levantou seus olhos para olhar nos dele, e quase riu com a expressão aturdida que encontrou. — Não quero reatar, respira. Não é isso. Nós... Estragamos tudo, não é?! Dois adolescentes perdidos que estragaram o que tinha tudo pra ser uma linda história de amor com felizes para sempre. Nos magoamos, nos machucamos e ficamos pra sempre marcados.

Ele lhe deu um sorriso triste, e ela retribuiu sem conseguir evitar. Seus olhos queimavam e sua garganta ameaçava fechar, mas ainda tinha coisas a serem ditas.

— Eu... Não quero que nos perdemos, que uma mensagem sua no meu celular seja um motivo de surpresa, embora sempre deixe meu coração acelerado. - Ela deu uma risadinha. — Você faz parte da minha vida, não quero que sejamos só uma lembrança um do outro depois que eu for embora.

— Não tenho a intenção de te cortar...

— Sei que não, acredite, mas isso acontece. Pessoas ficam pra trás. Então, eu preciso dizer mesmo que nunca mais diga novamente. - Ela cansou um pouco de lutar contra as lágrimas e elas escorriam pelo seu rosto devagar quase que respeitando o momento. — Eu amo você em todos os sentidos. Amo o jeito que nos conhecemos, as nossas memorias e nossa história. Você é o amor da minha vida, mesmo que nunca mais fiquemos juntos, que você vire uma história que contarei aos meus afilhados ou netos.

Ela se engasgou, era tão bom esvaziar seu peito, mas quando os olhos dele também se encheram d'água, ela precisou fechar os olhos e sentir. Ela sentiu aquilo que estava procurando. Que estava precisando pra ir embora. Por mais que quisessem colocar uma reticência, uma vírgula, aquilo era um ponto final.

— Eu nunca vou esquecer você. - Ela respirou fundo e lhe deu um sorriso em meio as lágrimas. — Como esqueceria? Você foi meu amor épico.

Ele praguejou e olhou pra cima na tentativa de não deixar as lágrimas caírem. Era uma despedida então. Uma despedida que poderia ser definitiva.

— Você... Está se despedindo. - Não foi uma pergunta, mas foi uma afirmação idiota. Muito obvia, então ele se recriminou e balançou a cabeça tentando clarear a mente. — Não acho que eu esteja pronto pra nunca mais te ver.

— Eu também não, mas se isso acontecer... Você precisa entender que eu quero sua felicidade mais que qualquer coisa. Quero que encontre alguém que entenda seus medos, suas inseguranças e compartilhe seus gostos. Alguém que mereça seu amor e que lhe faça sorrir. - Quando a primeira lágrima dele escorreu, ela tropeçou nos próprios pés tentando chegar a ele, se jogando em seu peito e se encaixando perfeitamente naquele abraço. Foi como se uma barragem se rompesse e ela, com o ouvido apoiado na altura do coração dele, murmurou baixinho: — E se você se casar, me conte, mas por favor, não me envie o convite.

Quando ele pegou seu rosto com toda a delicadeza e a fez olhar em seus olhos, ela hesitou, mas então ele deu um pequeno sorriso, selou os lábios na testa dela e murmurou também baixinho:

— Não, não acho que eu queira um convite seu também. Só quero saber se está bem e feliz.

Ficaram um tempo assim, as lágrimas ainda caindo pelos seus rostos, mas não era como se fizessem algum esforço pra pararem. Era um choro de partida, de despedida. Um pranto de rompimento.

Anos atrás eles terminaram uma história bonita, cometeram erros e se machucaram, mas nunca realmente conseguiram se afastar por completo. Eram atraídos um para o outro de tempo em tempo, retomaram a amizade perdida para o amor desastroso, se acomodaram e nunca pensaram no dia que seriam apenas lembranças um do outro.

Quando mais tarde aquele abraço foi desfeito, as lágrimas enxugadas, ele segurou a mão dela enquanto voltavam ao bar e ela contava a notícia ao resto dos amigos. Suas mãos continuaram entrelaçadas pelo resto da noite até o momento em que precisavam ir embora. Nunca soltar uma mão doeu tanto. A incerteza do futuro nunca doeu tanto.

Um adeus nunca doeu tanto quanto doeu para os ex amantes.

Bianca Gonçalves
Enviado por Bianca Gonçalves em 02/12/2021
Código do texto: T7398761
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