A PRAÇA
Todas as noites, ao voltar para casa, Ana passava pelo mesmo lugar. A única praça da cidade próxima ao colégio onde estudava. Cabisbaixa, nunca olhava para as pessoas, tinha vergonha. Precisava ser diferente, descolada como suas amigas, mas não era. Por outro lado, a capacidade de aprendizagem e experiências com outras áreas, como os estudos, talvez fosse uma das qualidades da garota. A região onde morava era rural, vinha à cidade durante a semana para estudar. O dia era laborando na lavoura ou cuidando dos animais. No intervalo, estudava pra caramba. Até aí nenhuma novidade.
Uma noite, enquanto passava pelo lugar de sempre, ao levantar a cabeça sentiu um choque. Estava diante dos olhos mais lindos que já vira. Lembrava até o olhar de seu cachorro Jupi. Aquilo a fez rir.
– Ei, morena, faz que olha, pelo menos, né?
– Está falando comigo?
– Sim, com quem mais seria?
– Ora, por que olharia para mim?
– Se olha no espelho, gata, é cega?
Querendo sair dali, pois estavam chamando a atenção de muitos dos estudantes que vinham se divertir um pouco. Sairia apressadamente, mas foi puxada pelo persistente garoto ou melhor homem.
– Me larga, ela falou. Vai se arrepender, cara.
Dando um safanão, o corpo do homem se abalou ao ponto de quase cair. Ana soltou-se e saiu pisando duro. Que ódio daquele fanfarrão. Como ousou se intrometer em seu caminho.
O tempo passou e Ana esqueceu aquele inoportuno homem. Fez o ensino médio, passou no vestibular, foi estudar na capital. Na universidade Federal. Escolheu teatro. Na turma dela, estudavam três rapazes, com os quais fez amizade. No segundo período, entraram mais dois. O professor era um cara enigmático que ficava olhando sempre para a Aninha. Ela se incomodava, nem sabia por quê. Até que, no final do período fizeram um churrasco. Ana foi. Lá ela se encontrou com o Paulo, era o nome do professor estranho. No auge da festinha, Paulo todo empolgado, convidou a moça para dançar. Relutante, mesmo assim aceitou.
– Oi, pequena selvagem, lembra de mim? Sou o cara que quase me derrubou na praça da tua cidadezinha, recorda?
Naquele momento Ana viu que eram os mesmos olhos de Jupi, seu cachorro, só que dessa vez, aconchegou-se ao corpo de Paulo, onde encontrou abrigo. Se me conta, eu crio um conto.