Prenderam-no ali
Tivera princípios, cumprira normas, fizera-se uma triste pessoa de confiança, respeitável. Morava numa cadeia com vista para o mar, sendo que do mar nem a aragem chegava ao seu reduto. Entre ele e a liberdade havia um vidro grosso de convenções, família, vizinhos, colegas, amigos. Estava livre mas inibido e quem se reprime fica, incontornavelmente, preso. Viveu a vida que quiseram para ele e, agora, com a maturidade a adiantar-se a passos largos, imaginou o que faria se cortasse da sua vida todas as amarras. Sentia-se um barco atracado, um homem amarrado, um ser que nunca experimentara o erro a que tinha direito. Chegara à meia-idade sem emoções fortes, sempre previsível e morno. Quando tomava coragem para mudar tudo, ela chegou. - É casado? Que bom que é. Fico só com a sua parte mais lúdica e deixo a roupa para ela cuidar. Se gostar troca-se tudo, se quiser nunca mais atará ao pescoço uma gravata. Se eu fico aqui para sempre? Nem imagino. Ando livre, fico só enquanto durar o amor. Poucos dias? Anos? Ficarei o tempo que for preciso, dedicada até ao fim do prazer, da harmonia. Se ficar doente, cuidarei, mas só se, em vez das correntes, sentir em si um homem que só está porque quer.