SARAH JANE
Sarah Jane. Não é um nome único e nem memorável, do tipo que se vê em histórias.
Às 5h23 da manhã, ela estava sentada à beira da calçada. Ou melhor, deitada. Com o tronco na avenida e as pernas na estrada, parecia uma aleijada. A barra de seu vestido quase tocava sua calcinha e alguns dos acessórios colocados, mais cedo, haviam sido perdidos por aí. Sua cor de pele falsamente bronzeada abrigava um delineado negro e grosso borrado, assim como seu batom vermelho. Tinha uma pinta logo acima da boca - uma característica que amava e, às vezes, odiava em si mesma - e cabelos mechados em tom de mel e castanho.
A hora de dormir era segura, onde quer que fosse, pois a fazia esquecer-se do motivo de ter ido parar nos lugares em que acabava adormecendo - ou desmaiando de bêbada. Depois de mais ou menos uma semana, arrumou-se da mesma forma, foi à mesma festa, pensou no mesmo cara, bebeu as mesmas bebidas, usou as mesmas drogas e quando, finalmente, sentiu-se exausta, arrependeu-se, como sempre fazia.
Mas aquela madrugada de algum dia aleatório de setembro foi diferente. Seu coração jamais havia doído tanto na vida. Zean havia a deixado para sempre. Ele não aguentou, era duro demais conviver com um furacão daqueles. Não era como se não a amasse. Na verdade, foi, justamente, por isso que fez o que fez.
Mais ou menos, uma semana atrás, houve um diálogo, em que pontos sinceros foram expostos - quer dizer, pelo menos da parte dele. Sarah Jane o olhou com profundidade depois de uma transa incomparável e, com lágrimas nos olhos, que refletiam nos brilhantes olhos castanho claro de Zean, prometeu-lhe que sairia daquela vida e que não havia nada que pudesse impedi-la de mudar completamente por ele (exceto por aquela vida em si).
Agora, ela estava ali, recuperando os sentidos ao acordar. Seu corpo inteiro doeu. Quando as lembranças, de horas atrás, começaram a voltar, arregalou os olhos e tocou o próprio corpo, sentindo o vestido quase deixando as coxas; o rosto, sentindo pigmentos de maquiagem em lugares onde não deveria haver e, finalmente, a cabeça, que parecia estar concentrando todo o peso do corpo naquele ponto isolado.
Sentiu-se deplorável, inválida, envergonhada, frustrada, descrente. Em uma autoanálise de segundos, sua ficha, sobre quem havia se tornado, caiu, e um choro sentimental e escandaloso se iniciou, ecoando pela rua vazia. Sarah levantou do chão e olhou ao redor, assustada. Ao tentar andar, percebeu roxos em suas pernas e a virilha grudando, imunda de urina e de menstruação, que, ao menos, tinha noção que ainda vinha.
Ela soltou um grito desesperado, assustando os pássaros que jaziam nos fios de luz, correndo as mãos pelos cabelos secos.
Sarah havia perdido Zean e, estranhamente, não podia dizer o mesmo de si mesma. Não é possível perder algo que você nem mesmo tem.