Catalisador (ou A Lídia foi embora...)
José ganhou um importante prêmio em química, oferecido pela Federação Internacional de Química Aplicada. Na solidão do amplo laboratório de sua Universidade, produziu um catalisador para uma complexa reação. Há muito que cientistas da área investigavam esta possibilidade, financiados pela indústria de bens duráveis que desse catalisador necessitava. A mágica da produção a um baixo custo, seria agora possível.
Ao leitor desinformado, ofereço a generosidade. O que é um catalisador? É uma substância que aumenta a velocidade de uma reação química. Aumenta a velocidade do inevitável...
Lídia vivia uma vida tumultuada em seu lar. O casamento, de certo que não é uma instituição falida como vociferam muitos nesses dias. Todavia, há de se ter liga entre os envolvidos. Ligações químicas coesas, de maneira que não se quebrem mediante fatores exógenos.
A desconfiança acerca dos passos de uma mulher por parte de um homem, faz os olhos deste cintilar mais do que os de lince.
Lídia era monitorada pelo esposo dos pés a cabeça em seus mínimos detalhes. Lídia tinha sido um Moisés esculpido por seu esposo um Michelangelo. O esposo de Lídia tinha a certeza que ela tinha sido por ele concebida. Lídia nascera de suas costelas e não havia dúvidas disso para ele.
Não havia diálogo. Na cama, mais do que a troca de fluídos e carícias do sexo, a conversa se esvaíra por parte de Lídia. Em muitas ocasiões, os ombros, os braços e antebraços de Lídia eram sacudidos pelas mãos aflitas de seu esposo. Lídia: uma natimorta de propósito a ele. Lídia, um Moisés. Seu esposo, no calor da impossibilidade de acesso a ela em muitas ocasiões, gritava na calada da noite "parla! parla!".
Se acaso se pretende a mudança, é necessária a coragem para o novo. José encontrava frequentemente Lídia entre xícaras de café e um amor de momento consentido e ciente da situação de cada um: Lídia casada e indecisa no que se referia ao próprio futuro mas afeita a José. José? Homem que ali estava para Lídia, geralmente ao fim de seu expediente no laboratório.
Lídia objetivava vida nova. Todavia, faltava-lhe o tônus que incita a decisão certeira. Qual decisão? Sair de tudo aquilo e ser feliz com José. Mas José já havia deixado claro que a sua ação não poderia ser estabilizante de um futuro magnífico com ela.
O sonho de Michelangelo de seu ex-esposo, no qual Lídia não era estátua e falava, não se concretizou. A imagem de Lídia se confundiu com o vazio do horizonte de descampado que havia na frente da casa do antigo casal. Lídia tinha sumido.
José ensinou à Lídia, em suas conversas tanto no café quanto na cama, algumas lições de química. As mensagens que José enviava à Lídia não foram mais respondidas. José, experto na dinâmica das múltiplas reações existentes no mundo, sabia o que ele tinha sido. Ele tinha sido exatamente aquilo que Lídia escrevera em bilhete de mensagem última a ele na vida:
"Fui ser feliz! Foste querido! Necessário! Um catalisador!"