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AMOR QUE NASCEU NA QUARENTENA
 

          O dia amanheceu, fez sol, mais tarde algumas nuvens empanaram o céu e choveu de noite... de repente amanheceu de novo. A rotina era a mesma para Antônio, o alcunhado Milizirdo. A vida não mudava. Uma rotina das rotinas. Quando chegava um amigo para visita-lo, antes de atender, olhava para todos os lados pra ver se os filhos não estariam por perto para não ser repreendido pelos mesmos.
          Alguém, não se sabe se é um golpista, andou procurando pelo senhor Antônio (sobrenome Itagliano), mas ninguém o conhecia. Dizia que este havia ganhado um prêmio, mas teria que confirmar com documentação para poder entregá-lo. Com esse nome não o encontrou. Todos ali e na região conheciam o homem por seu Milizirdo. Este apelido ganhou porque sem querer, tinha por hábito um jargão ‘’mili’’. Por exemplo, se uma comida estava gostosa dizia: Mas esse almoço estava ‘’mili’’ gostoso. Para se gabar que seu cavalo era muito bom, falava: ‘Meu cavalo é ‘’mili’’ bão’. Também quando reclamava que alguma coisa não dava certo, murmurava: Eia ‘’mili’’ inferno. E assim por diante. Aí pegou o nome Milizirdo.
          Este homem na quarentena teria que fazer alguma coisa para passar o tempo. Começou a mexer no celular. O filho baixou alguns aplicativos no aparelho. Também num computador, fuça daqui e fuça dali e de repente descobriu que poderia fazer alguns cursos online e gratuitos. E fez. Ficava horas a fio estudando. Os filhos até se preocupavam. Brincavam entre eles dizendo: - Esse ‘’véio’’ vai ficar louco. Quase nem come, só fica no computador e no celular.
          De repente aprendeu a lidar em redes sociais. Ali foi o mapa da mina. Fez várias amizades. Marcava até possíveis encontros após a pandemia. Nos cursos que fazia, falava com uma jovem senhora para tirar as dúvidas. De repente esta mandou uma mensagem que o deixou estarrecido. Primeiro elogiou a sua força de vontade em se aplicar tanto para aprender. Ali foi uma terapia excelente. Começaram a conversar. Sem pejo, muito cedo um acordava o outro para dizer bom dia e saber se dormiu bem. E mesmo à distância se apaixonaram um pelo. Quando um precisava sair, o diálogo era mais ou menos assim:
          - Amore mio. Preciso sair pra cuidar da vida. Fica em paz, meu Mili.
          - Tá bom amore, entendo...
 
          Mas quando acontecia um entrevero muitas vezes por ciúmes, mudava um pouco o tratamento entre ambos. Em lugar de amor ou amore mio era:
          - Milizirdo o que você fez ontem à noite que nem passou aqui pra falar comigo.
               Ele todo sem jeito respondia:
          - Pois é dona Tere. Não foi possível. A internet estava péssima e meu filho pegou o celular...
           Enfim, um pequeno bate-boca, de repente quando menos esperavam estavam em diálogos de amor novamente trocando carinhos...
 
          Ali naquela quarentena se consolidou um grande amor. O resultado do isolamento que aconteceu o encontro dos dois apaixonados: Mili e Tere, ou seja, Milizirdo e Terezinha. Juntaram os trapos como se diz na região. Três meses depois oficializaram a linda união dos dois. A felicidade enfim bateu nas suas portas. Formaram um casal querido e de respeito, sendo aceito na sequência pelos filhos de ambas as partes.
 
(Christiano Nunes)