A Dama de Preto
     Don acordou com uma sensação estranha naquela manhã de domingo. A sensação de que nunca mais a veria, não parava de perturbar seus pensamentos. Levantou-se, acendeu um cigarro, pegou seu copo de uisque, como de costume e foi para a sacada.
     Olhava serenamente a rua fria, calma, nostágica, até parecia meio melancólica. Talvez, não fosse a rua, mas  ele mesmo estivesse com seu ser tomado de uma profunda sensação de angústia naquela manhã em que caia uma forte neblina, anunciando o despontar do inverno. Aquele dia frio, não era como os outros dias em que sua dama de preto ia embora antes que ele acordasse. Não, não era o mesmo alvorecer!
     Don a conhecera em uma festa a fantasia. Estava ela lá, mascarada, parada, deslumbrantemente linda, com seu vestido preto e longo, cabelos negros como uma noite tomada pela bruma, boca carnuda e exuberantemente vermelha. O olhar de Don ficou enfeitiçado, simplesmente não conseguia desviar os olhos daquele espetáculo de mulher.
     Ele caminhou até ela, cumprimentou-a com a elegância de um verdadeiro cavalheiro e convidou-a para dançar. Dançaram o baile inteiro, conversaram, beberam, riram de forma extravagante e, finalmente, Don ousou convidá-la para tomar um uísque em sua casa. Ela aceitou com a condição de que ele não perguntaria seu nome e nem tiraria sua máscara. Don estranhou, mas seu desejo era tão ardente que ele aceitaria centenas de outras condições. Foi uma noite realmente incrível! A dama de preto proporcionou-lhe a melhor noite que já tivera em toda sua vida, regada a uísque, fogo e paixão.
     No dia seguinte quando Don acordou, ela não estava mais lá. Um turbilhão de sensações invadiram seu ser. Ele sentiu um misto de paz e caos, de paixão e saudade invadir suas entranhas.
     - Sei que nunca mais a verei! Oh, minha dama de preto!
     Ele fez o ritual de todos os dias e saiu para o trabalho.
     Os dias passaram e Don contemplava todos os crepúsculos com um único pensamento: - Será que algum dia terei o prazer de vê-la novamente? Não, sei que não voltarei a sentir aqueles lábios, aquela pele, aquele corpo, aquela presença.
     De repente, alguém toca a campainha. ao abrir a porta, Don fica estático e igualmente eufórico.
- Você?
- Achou que eu não voltaria?
     Ela estava ainda mais linda do que na noite do baile. Vestido preto, curto, lábios cor de carmim e sua máscara que não lhe permitia mostrar o rosto. Aquela noite de quarta feira foi para Don, um momento único que ficaria gravado como selo em sua memória. E assim, toda semana, a dama de preto, misteriosa e bela, vinha visitar seu amado. Amado? Amante? Fetiche? Quem poderia explicar? 
     Don vivia entre a felicidade e o suspese. Aceitara todas as condições impostas por aquela mulher poderosa e fatal que lhe dominava de uma forma tão inexplicável, mas não sabia até quando ela permaneceria em sua vida. Essa insegurança lhe tirava o chão. 
     Naquela manhã de domingo em que, como de costume, ela saia antes que o dia amanhecesse, Don viu algo estranho na cama e teve a plena convicção de que o conto de fada acabava ali. Don, viu uma rosa vermelha, uma máscara e um bilhete que dizia:
" Para você meu Don Juan, eu já mostrei muito mais do que deveria. Sua sempre DAMA DE PRETO".
     Se ela voltará algum dia, quem saberá dizer? Mas, como diz Vinicius de Morais: Que seja eterno enquanto dure!

     
     
Josy Matos
Enviado por Josy Matos em 20/04/2021
Reeditado em 20/04/2021
Código do texto: T7236867
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