Se ela valer a pena
Se ela valer a pena.
Estava escrito em um muro cinza que cortava a cidade em dois grandes centros e, por entre eles, havia um trem cheirando a ferro dilatado. Pintado de branco com margem de preto ao lado de uma árvore imensa, as letras garrafais me furavam os olhos: trago a pessoa amada em sete dias. Tratar com Mãe Lena. De súbito, ri. Mirei o horizonte, incrédulo. Segui viagem. Engarrafado em meio ao caos do centro da cidade, no meio da avenida, te vi. Sério. Sei que você estava em casa, mas te vi. Você usava aquela blusa do flamengo que usa em dias de jogo. Aproximei-me. Senti. Ri do descontente. Era outro alguém. Próxima parada Xerém. Por alguns instantes cochilei, tá foda essa rotina. Abri os olhos e, de fronte a mim, esse outro alguém ainda estava. Como um (per)seguidor de meus rastros. Olhei mais de perto e constatei que realmente não era você. Muito diferente, achei graça quando percebi que até tinha piercing no nariz e, risos, você jamais usaria piercing no nariz. Trabalho. Reuniões e mais reuniões. Minha cliente tem uma voz tão afinada quanto a sua. Sonhei sentado ouvindo-a.
Brincando com meu celular, dirigindo no caminho de volta pra casa no arco, vejo escrito: Lena. Meu Deus, quem é Lena? Liguei, claro, minha curiosidade tem sede de respostas. - Oi, sou a Mãe Lena, sinto cheiro de procura. Você quer encontrar seu amor? -, disse-me em um tom suave de quem tem magia na voz. Sim. Não pensei muito. E, de uma maneira inesperada, ela me disse seu nome. E eu me assustei. Não, ela não poderia chutar, ela nem sabia que você... - Sim, eu sei. -, respondeu-me à minha indagação mentalizada. - Semana que vem você me trará, então?-, apressei-me. - Esqueça -, desandei. - Mas no anúncio dizia...-, tentei. - Você não leu a parte que a árvore tampou com a sombra... Trago a pessoa amada em sete dias, se...-, brincou de fazer suspense. - Se...-, indaguei.
Pi, pi, pi.
Caiu a ligação.