AMOR E AMBIÇÃO - CAPÍTULO XLI
XLI
Artur chega em casa portando um enorme embrulho desproporcionalmente leve, em relação ao tamanho. Dora se surpreende com o conteúdo. Não constava no rol das coisas desejadas por ela. Adquirir patrimônios utilitários era sua prioridade. Aquilo não fazia parte do seu mundo domiciliar. Começa, ali, o aparecimento da diferença sócio cultural entre dois seres que se amam fervorosamente. Mas a robustez do amor que alimenta aquela convivência propicia que eles usufruam as positividades de uma desejada união. Eles aprenderam a jogar pela janela do vigésimo andar todas as coisas abstrato-negativas que surjam diante deles, no dia a dia.
O amor pelas artes plásticas chegou precocemente no coração de Artur. Na primeira infância já gostava de reproduzir desenhos dos gibis que ganhava. Daí até à paixão pela arquitetura levou um bom tempo.
A cara de paisagem feita por Dora, diante do quadro, repousado sobre a mesa da sala, antes que essa escolhesse a parede onde gostaria de se expor, chamou a atenção de Artur.
Teria sido aquele jeito de olhar, uma confissão de desconhecimento? Ou uma demonstração de desaprovação pela aquisição?
A dúvida não teve vida longa na cabeça de Artur. Sua mulher não é pessoa de ocultar o que pensa. Pensou, fala na lata. Sua fala é incisiva mas sem grosseria.
--- Amor, quer saber?... Gosto das paredes da sala limpinhas, sem nada, além da tinta.
--- Ok. Vou pensar num lugar onde meu quadro sinta-se bem, sem incomodar o gosto do meu amor. Até porque o meu gosto pelas artes plásticas independe de onde elas estejam.
--- Vixe!!! Com esse modo de falar , não demora, você vai se candidatar a senador.
--- Adoro seu humor rascante.
--- Por falar nisso, amor, vamos abrir aquela garrafa de vinho português que teu pai deu pra nós?
--- Bem pensado. Vou ligar pro restaurante nos mandar uma porção de petiscos.
A noite, ornamentada pela lua cheia, testemunhou, com a habitual secura do ar de Brasília, a felicidade de Dora e Artur, regada a vinho português e frango a passarinho. Momento oportuno para conversar sobre o crescimento da família. E Artur deu partida no motor daquela novíssima máquina de reprodução.
--- Amor precisamos falar sobre nosso futuro... O que você acha?
--- É um ótimo momento.
Dora disse que pretendia voltar a estudar, trabalhar e, só depois dos vinte e cinco anos pretendia ter filhos.
--- Preciso da tua opinião.
--- Teu pensamento vai ao encontro do meu. Se você pretende trabalhar, é primordial que volte a estudar e se forme... Já me matriculei num curso “on line”, de direito. No meu caso, eu preciso de conhecimento da legislação brasileira. O Senado é uma casa de leis... E você já escolheu a carreira?
--- Já. Economia... O quê você acha?
--- Ótimo. Se você tiver afinidade com as exatas, melhor ainda. Estaremos embarcando no mesmo trem. Juntinhos... E quanto aos filhos, prefiro que venham depois da tua formatura. Estudo demanda tempo. E filhos demandam mais tempo ainda. Mas, como nada é definitivo, vamos administrando as dificuldades até que elas se tornem mais fáceis.
--- Nossa!!! Que aula!!!
--- Aos poucos a gente vai equilibrando nossas ações, equiparando nossos quereres, sempre na busca de um envelhecimento feliz e digno de receber a dádiva da longevidade.