AMOR E AMBIÇÃO - CAPÍTULO XL
XL
Dona Tuninha e seu Zé da Guia começam sentir o recrudescimento da saudade de suas filhar. A despeito de receberem, diariamente, ligações de Dora pra contar seus feitos no seu dia a dia, eles sentem a falta das rezingas entre as irmãs, que só cessavam mediante ameaças de apanharem de cinto ou de varas de goiabeiras.
O regime de educação recebido pelas meninas foi o mesmo que seus pais receberam. Sem tirar nem pôr.
Aquele casal tradicional, representante da família paraibana do interior, não imaginava que suas filhas adolescentes trocariam o ninho paterno-maternal tão cedo, por um acasalamento repentino e ainda pagando o preço de morar longe dos pais, fora da cidade natal. Mas aconteceu e agora só lhes resta curtir a saudade. Saudade boa porque as notícias que vinham também eram boas. Artur cuidando bem de Dora, e essa era a maior preocupação dos pais, devido ao gênio da filha. Genilsom também está se entendendo às mil maravilhas com Zefinha e com Valquíria. O incômodo maior é a saudade.
Dona Carminha e seu Evaldo padeciam desse mesmo sentimento, em relação ao filho. Mas já havia um bom tempo que eles conviviam com a ausência de Genilsom. Até porque ele passou quatro anos morando em alojamentos universitários, em S. Luiz, durante os estudos acadêmicos, bem longe de casa. Para eles a dor da saudade era diminuta. Mas quando ele vinha em casa era uma festa.
Dona Carminha e seu Evaldo ainda não sabiam da presença de Zefinha e de Valquíria na casa de Genilsom. O filho lhes queria fazer uma surpresa. O mais surpreendente foi a reação de dona Carminha quando soube que a nora já estava em S. Luiz, havia quase quinze dias. E o choque mais forte foi quando soube da vinda da irmã caçula de Zefinha. Não que o povo nordestino seja puritano, no tocante ao convívio conjugal, mas as mães conhecem os filhos que têm. E aquela mãe zelosa não aprovou nem um pouco a decisão tomada pelo filho. Mesmo respeitando a independência dele, ela não abriu mão de externar seu ponto de vista. E lhe pediu que tomasse as rédeas do seu novo lar. E que também não perdesse de vista os ensinamentos que sua mãe colocou a disposição dele, visto que seu pai delegou a ela essa tarefa.
Ao chegar à casa de seus pais Genilsom pára seu carro em frente ao portão, com o motor desligado. A intenção era surpreendê-los. Abriu a porta dianteira e a traseira, para a saída de Zefinha e de Valquíria. Bateu palmas. Esse é um costume das pessoas do interior. Dona Carminha atende com os olhos reluzentes diante do filho. Mas logo mudou o semblante quando viu sair do carro Zefinha e Valquíria. Elas ainda ajeitavam suas saias justas e curtas e Dona Carminha já as olhava com um misto de surpresa e descrença do que via.
--- Oi, meu filho, quer me matar de saudade, é?
--- Oi, mainha, benção.
--- Deus te abençoe, filho.
--- Essas meninas são Zefinha e Valquíria, sua irmã caçula. Elas vieram para S. Luiz, tem quase duas semanas.
--- Estão morando onde?
--- Lá na minha casa.
--- Credo!!!!
O semblante de dona Carminha alternava entre o empalidecer e o avermelhar. Tentando esconder o sentimento de horror, ela abre a casa aos três.
--- Vamos entrar. Seu pai, como sempre, a essa hora, está vendo desenhos na TV... Vocês, meninas, fiquem à vontade. Bem... Se for possível ficar mais à vontade.
Em algumas regiões, ficar à vontade significa se despojar das roupas ou usar vestes que cubram o mínimo do corpo.
Dona Carminha até se esqueceu de apresentar-se às meninas, mas Genilsom fez as honras da casa, mesmo notando que a surpresa não fizera bem aos olhos nem ao gosto de sua mãe. E quando ela não gosta, todos percebem. De um jeito ou de outro ela demonstra.
--- Filho amado, eu queria saber se as costureiras de S. Luiz ou lá de Silva, na Paraíba, estão economizando tecido para fazer roupas femininas.
--- Eu sei que faz tempos que a senhora e meu pai não saem de Santa Luzia mas a TV tem o papel de difundir as tendências da moda. E a juventude acompanha isso. Mas eu entendo a sua surpresa. Entendo e respeito, pois isso foi o que aprendi com a matriarca desse lar.
Ganilsom tratou de pôr panos quentes na ironia da mãe; apresentou as meninas ao pai que cochilava no sofá, sendo assistido pela TV, sem nenhuma cerimônia.
Dona Carminha puxa duas cadeiras para as meninas. Visitantes e inicia uma palestra e demonstra sua posição na família. Fêmea Alfa.
--- Zefinha, sinta-se uma mulher bafejada pela sorte. Mas quem tem sorte é porque tem merecimento. Meu filho é um homem bom. Foi educado sob as mesmas regras que eu segui, desde a minha infância. Das namoradas que ele ma apresentou seu nome foi o que eu mais ouvi. Mesmo sendo um namoro à distância você falou mais forte e mais alto no coração dele. A surpresa que ele quis me fazer sobre a tua chegada, por si só, não teve muita influência no meu humor mas a presença da tua irmã, com esse corpo de menina e esse semblante de mulher, numa casa onde deveria habitar apenas o casal recém construído, é assustador.
--- A senhora tem toda razão de se sentir assim. E também concordo que sou uma mulher de sorte. E acho que minha irmã também se sente uma mulher de sorte. Porque quando seu filho me disse que queria que eu trouxesse a Valquíria pra me fazer companhia, eu entendi que estava diante de um homem de verdade. Não sei nem se merecemos esse presente de Deus. Mas a senhora pode ter certeza que a gente vai evoluir, pra ele se orgulhar de nós.
--- Fique certa que ele já se orgulha de vocês. Por isso ele resolveu dividir um teto com a mulher que ele ama. Percebo uma maturidade precoce em você. O que eu não via nas mulheres adultas que namoraram com ele. Vou apostar na felicidade de vocês.
Ela resolve abrir e mostrar o conteúdo de sua caixa de ferramentas pra Zefinha.
--- Veja que eu falo na felicidade de vocês. Não falo nas felicidades de cada um. Isso por eu conhecer meu filho de corpo e alma. Ele merece uma felicidade conjugal. Caso contrário, apenas a alma dele me dirá, numa algazarra sonora, que está infeliz... Só as mães ouvem os gritos silenciosos das almas dos filhos. Espero que eu me explicado direitinho. Agora vocês conversem aí que eu vou pra cozinha fazer um almoço pra nós. Acho que a filosofia do Genilsom me contagiou. Tenho que parar de ler aqueles cadernos velhos dele.
Genilsom viu uma bela oportunidade para adentrar na conversa.
--- Mainha, com a sua permissão, eu gostaria de colocar meu ponto de vista nesta questão.
--- Fala, filho.
--- Eu gosto muito da mulher que vive comigo. Nosso primeiro encontro foi inusitado, mas logo deu jogo. Cupido resolveu nosso “game” logo no primeiro “match point”.
--- Filho, por favor, fala nossa língua.
--- Desculpe, mainha. É força do hábito.
--- Deixa essa língua doida lá pro teu jornal... Continua.
--- Eu quis dizer que nos apaixonamos, um pelo outro, logo no primeiro saque. A paixão evoluiu e virou amor. Um grande amor. Quando Zefinha me disse que já podia vir pra S. Luiz minha, mente foi ao céu e voltou muito mais feliz. Era tudo que eu queria ouvir. E quando se está muito feliz a mente se recusa a se ocupar de coisas negativas, passadas presentes ou futuras. Mas ela precisava ficar por lá mais alguns dias. Valquíria teria que assumir as funções dela e da irmã Dora, que já tinha ido pra Brasília com o marido. Isso consumiria tempo. E a fome de amor também tem pressa. Segui os ditames do meu coração: -- Traga a Valquíria pra te fazer companhia... Quanto ao almoço, mainha, eu sugiro que a gente vá naquele restaurante lá do centro da cidade e ficamos com mais tempo pra trocarmos idéia... Aceita, mainha?
Claro que sim.