Declaração de amor ao mundo pausado - PerfeBleu
E rapidamente passaram-se dois anos, desde que Alessandra entrou na escola, até o fim do ensino médio. As coisas ficaram assim: Guinevere seguia tentando a vida em uma faculdade, ao mesmo tempo que cuidava dos dilemas em casa. Débora estava noiva e no quinto mês de gestação, todos aguardavam ansiosamente pela sua nova filha que viria ao mundo, porém, ocorreu que poucos meses antes, Tiago houvera abandonado ela e ela seguiu cuidando da filha só, sem sequer ajuda de pensão.
Rebeca, por sua vez, havia entrado em um curso técnico de enfermeira e em pouco tempo já estava trabalhando de estagiária em um hospital no centro, o que para ela já era um ótimo começo de carreira.
Quanto a Alessandra, ela conseguira uma bolsa para estudar no exterior devido a suas ótimas notas no colégio, e se preparava para partir. Ao mesmo tempo, descobrira o paradeiro de seu pai e sua vida começou a tomar proporções e horizontes diferentes, de uma forma totalmente positiva e inesperada. Felipe, que foi seu ex-namorado estava engajado em um novo relacionamento e trabalhando em um restaurante, como lavador de pratos, respectivamente.
Entre todos, o rumo de William foi o mais incerto. Depois do divórcio de sua mãe e o suicídio de Michael, ele houvera saído da escola para poder repensar sua vida. Não concluiu o ensino médio e parecia não querer pisar novamente em uma escola. Além disso tudo, ainda não houvera conseguido tirar Alessandra de sua mente, e isso ainda o atormentava dia e noite. Mas ele prometeu a si mesmo, que não importava o quê acontecesse, ele ia lutar até o fim para se livrar daqueles sentimentos, e isso fazia constantemente.
Esse parecia ser o fim da história, quando os amigos se separam e de pouco em pouco vão perdendo o contato, e ao seguinte, a amizade. Tudo o que William disse parecia estar se cumprindo. Era só questão de tempo para que ninguém se falasse novamente pois estariam em novas fases de sua vida, e o passado se tornaria apenas uma memória divertida ou quem sabe triste. Então o que nos resta? Sentar no chão e desenhar um novo plano de vida? Mas os planos tem uma tendência a simplesmente falharem (e frequentemente eles falham).
Como que por falta de acaso, quando tudo parecia perfeito para Alessandra, aconteceu o seguinte:
Ela estava fazendo a janta e separando a marmita (morava sozinha), e começou a se sentir muito tonta, seu lado direito do rosto começara a perder o movimento e ela não conseguia se sustentar em pé. Arriscou dois passos mas caiu no chão, sua fala parecia embolada, não tinha nenhuma reação e estava com uma vertigem súbita. Sua cabeça não parava de doer, e subitamente ela perdia a visão de um lado do olho. Estava tendo um acidente vascular cerebral, ou mais conhecido como, AVC. Se ela conseguisse ligar para a emergência a tempo, no prazo máximo de 3 horas, conseguiria reverter maior parte das sequelas do acidente. Porém ao pegar o telefone, mandou uma mensagem para Guinevere e essa a ligou em pouco menos de 5 minutos.
"Que está acontecendo Sam?" Dizia Guinevere do outro lado da linha, parecia ter percebido que a situação estava estranha. Ela ouvia de Sam apenas palavras confusas e sons involuntários. "Já entendi, vou na sua casa agora, aguenta aí amiga!"
A poucos Quilômetros dali, William estava observando a lua solitário como de costume. Cheio de pensamentos atoa e sem sentido. Foi quando sua mente começou a trazer da lembrança, imagens suas com Alessandra. Memórias que costumavam ser felizes, mas que com o tempo, se tornaram apenas imagens tristes de um passado que ele se esforçava muito em esquecer.
"Droga, até hoje eu não consegui deixar de gostar dela? Será que vou estar preso nisso para sempre? Já acabou tudo, não tem mais o que fazer. Ela vai para fora do país, é impossível que eu reveja ela, ou que voltemos a conversar. A vida dela está indo pra frente enquanto eu continuo aqui, na mesma situação de sempre. Mas nunca foi diferente, ela sempre foi melhor que eu em tudo. Nunca precisou de ninguém para nada... Sou eu esse lixo de ser humano que ainda vive covarde apegado ao passado porque tenho medo de seguir em frente com a minha vida..."
— Mas por que penso tanto nela? Por que essa sensação tão ruim a seu respeito? O que será que está acontecendo com ela agora? — Vocalizou um de seus pensamentos. E naquele momento seu coração estava extremamente conturbado por causa de Alessandra, e ele resistia a todo tempo para poder não pensar nela, porém, sua situação só piorou depois que ouviu a sirene de uma ambulância que corria escandalosa entre as ruas.
Uma semana depois, Alessandra estava internada em observação, iria passar três meses no hospital para se recuperar. Perdeu maior parte dos movimentos de modo que estava usando fraldas, e dificilmente conseguia falar. Ela estava entendendo tudo e sua mente parecia não ter sido afetada, somente seus movimentos.
Quem estava em uma rotina para acompanha-la era Guinevere e Rebeca (que trabalhava em um hospital perto).
— Será que ela vai voltar a ter uma vida normal? Tipo, depois que meu avô teve AVC nunca mais foi o mesmo...
— Bom, ela vai ter sequelas para a vida toda, mas se ela se esforçar e realizar a fisioterapia e as sessões com a fono, com certeza vai estar melhor em menos de três meses. Só que a viagem dela estava marcada para daqui duas semanas, não tem mais como ela ir...
— Sim, e também está muito puxada essa rotina. Ninguém da família dela mora aqui na cidade, e ninguém se prontificou a vir, imagina se ela não tivesse amigas? Se pelo menos uma outra pessoa pudesse nos ajudar, ia ser legal, para falar a verdade não sei quanto tempo vou aguentar ficar indo e vindo...
— Pois é, é uma situação complicada... Mas, vamos ter fé de que Deus vai provê algo para ela. Sempre foi uma menina da igreja, não acho que isso que aconteceu foi a toa, tudo tem um propósito...
Naquela mesma noite aconteceu o seguinte, a mãe de William, que se chamava Maria, frequentava a mesma igreja que Alessandra, e as vezes conversava com ela. No culto daquela noite o pastor pediu para orarem pela vida dela que estava hospitalizada e planejavam fazer plantões para ficarem com ela no hospital. Então ela chegou em casa comentando exatamente isso para William, e ele em um instante ligou tudo.
— Uma irmãzinha da sua idade teve AVC e está internada. Ela está precisando de gente para ficar no hospital com ela, estou pensando em ir sabe? — Comentou Maria esperando algum tipo de aprovação dele. Mas William parecia ainda não ter notado de quem ela falava, mas sentia algo familiar sobre aquela notícia.
— Sério? Poxa que chato... Por acaso foi a filha do Antônio? Aquela que cantou uma vez?
— Não, essa daí já mudou de igreja. A que aconteceu isso é outra...
— Mas nunca ouvi falar de AVC em jovens, ela vai conseguir se recuperar né?
— Eu não sei como está a situação, só Deus para saber. Dizem que ela ia para o exterior mês que vem, e que agora não vai mais poder.
— Mãe... — Disse ele totalmente perplexo, e nesse exato momento se estremeceu por inteiro. — Qual o nome dela?
— Alessandra.
Aquele nome... aquele bendito nome tornou a aparecer novamente. Logo, cada neurônio, cada sinapse, cada proteína de seu corpo, pareciam direcionados para somente uma causa: Alessandra. Tudo começou a correr muito intenso em sua mente, a ambulância da semana passada, aquela sensação horrível. Logo ele levantou num vigor nunca antes visto e perguntou, correndo entre a casa e se vestindo, e logo calçando o tênis.
— Eu conheço ela, era minha amiga. Onde ela está? Você sabe me dizer em que hospital ela está?
— Eu não sei.. Acho que no São Camilo lá do centro. Tem que perguntar para o pastor a sala que ela está internada... Por que está se vestindo? Por acaso vai lá?
— Mãe, eu preciso ir urgente. Desculpas, eu te ligo depois... Onde é a casa do pastor?
— É no final da rua da padaria, numa casa de dois andares e um portão preto.
— Muito obrigado, eu já volto... — Disse ele já vestido, e fechando a porta atrás de si. Logo ouviu-se seus passos correndo rapidamente até a casa do pastor. No caminho ele pensara mil coisas, mas corria e corria. Como se aquilo fosse vida ou morte. Sua mente e seu corpo só descansariam após terem respostas.