275 - Amor Clandestino
Assim, sem qualquer explicação, deixou de sentir prazer na sua companhia, começou a ver-lhe os defeitos a já não se excitar com o cheiro da sua pele, a não tolerar o seu humor brejeiro, a evitar os lugares e caminhos onde pudesse encontrá-lo. Oriundos de mundos sociais diferentes, encontravam-se sempre nas ruínas da casa velha, subiam ao primeiro andar, limpavam o espaço do pó e do lixo trazidos pelo vento e ficavam ambos deitados num colchão de praia a ver a lua e as estrelas depois de se terem amado de modo intenso. Os últimos metros até a casa cumpria-os com cuidados redobrados para não despertar a avó e andava pela casa às escuras até se deitar na sua cama de solteira. Agora que a sua aventura amorosa chegava ao fim, que nada mais havia de interesse a preservar é que percebeu que já andava na boca do povo. Alguém os vira a entrar na casa em ruínas, alguém os espreitara. Para agudizar tudo o que sentia, ele surgia em todos os lugares onde estivesse e fazia-lhe comprometedores gestos a marcar novos encontros a que já não ia. Sentiu febre, teve pesadelos, evitava amigos e em todos os olhares percebia alusões hostis à sua vida amorosa. Se pudesse fugia para uma terra estranha, se pudesse enfrentava-os, se, ao menos, tivesse coragem matava-se. Foi deprimida que procurou a mulher para o aborto e que se submeteu às manobras que puseram fim a parte do problema. Quando piorou ele apareceu para a ver e ainda percebeu as mãos rudes a segurar as suas. A seguir, com tudo já muito nublado, perdeu os sentidos.