MAIS UM ADEUS

Siney Cameratti levava uma vida monótona. Isolara-se do mundo há mais de seis meses. Decepção amorosa. Noivado desfeito às vésperas do altar. Sem nenhuma explicação, Lucyle Andersen, seu amor de infância, sua pequena Lucy, simplesmente, dissera “Te amo pra sempre e pra nunca mais.” Muito confuso, Sidney não entendera o que ela dissera. Parecia uma brincadeira, mas Lucy completou “Levarei a aliança, com seu nome gravado, pois você é meu amor para toda a vida.” E disse “Adeus!”.

Sidney ficou paralisado, em estado de choque, inerte, sem reação, e a viu desaparecer de sua vida, deixando-o, sem mais explicações.

Remoendo essas lembranças, Sidney divagava, quando ouviu o carteiro chegando. Havia uma encomenda para ele. Como? Não havia pedido nada. O carteiro insistiu, entregou-lhe o pequeno embrulho e o recibo para que Sidney assinasse. Era frete a pagar. “Que desaforo!, pensou Sidney. “Não pedi nada e tenho que pagar para saber o que há nesta caixa?” Disse, indignado, ao carteiro.

A curiosidade falou mais alto e Sidney, enfim decidiu ficar com o embrulho. Certamente, se estava endereçado a ele, deveria ter alguma importância.

Le3vou a caixa até a cozinha e observou-a antes de abri-la. “O que conteria?” Sentou-se à mesa e com certa apreensão começou a desembrulhar a “encomenda”. Era estranho, seus dedos tremiam, como se, subitamente, tivesse medo de saber o conteúdo do pequeno objeto.

Havia dentro do pacote, outro menor, escrito em letras douradas, “Com todo o meu amor”. Sidney reconheceu a letra de Lucyle. Depois de tanto tempo ela voltava a brincar com seus sentimentos. Lágrimas escorreram por sua face.

Desembrulhou o novo pacote e encontrou a aliança de noivado, que Lucy levara ao deixa-lo. Então, a emoção dominou-o e chorou por todos os anos de angústia e dor reprimidas, desde a inexplicável partida de Lucy.

No fundo da caixa, havia um papel, dobrado várias vezes, um pouco amarelado pelo tempo. Não contendo as lágrimas, Sidney, com as mãos inseguras, abriu-o. Lucy, sua amada Lucy, depois de tantos anos, ressurgia naquela caixinha, naquele pedaço de papel! Era uma carta, escrita dois meses após a partida de Lucy. E dizia:

“Sidney, meu grande amor, meu amado companheiro! Sei que te fiz sofrer ao despedir-me sem explicações, mas não havia o que fazer. Ficar a seu lado, seria condená-lo a uma existência de maior sofrimento ainda. Me perdoe, querido, só tentei poupá-lo de me ver definhar a cada dia.

Naquele dia, recebi o diagnóstico de que estava com uma doença degenerativa, um tipo raro de cisto na coluna, que em poucos meses, poderia deixar-me paraplégica ou levar-me à morte, pois uma cirurgia é muito complicada nessa região afetada.

Querido Sidney, já não tenho a bela aparência com que me conheceu, perdi grande parte de meus movimentos, dependo dos outros para me locomover e fazer minhas necessidades básicas. Estou degenerando a cada dia, à espera da cirurgia.

Escrevo-lhe esta carta, com as últimas forças que me restam e, quando você recebê-la, meu amor, não estarei mais nesse mundo.

Só desejo que siga sua vida, lembrando-se de mim sem mágoas, por isso escrevo-lhe; para que compreenda o quanto seu amor me fez bem. E, por este amor tão grande que você sente por mim, achei que merecia saber o porquê de uma despedida tão brusca.

Estou em uma casa de repouso e lacrei esta carta para lhe ser entregue assim que eu morrer. Com ela, envio-lhe a aliança, símbolo de nosso amor, para que você guarde-a com carinho.

Adeus, meu amor! Eterno e verdadeiro amor!”

Lucyle Cameratti

Sidney estava totalmente descontrolado. Quantas emoções despertadas por poucas palavras. Pobre Lucy, não sabia que ele preferiria estar a seu lado, mesmo sofrendo. Mas, o que fazer agora?

Pegou o embrulho e anotou o endereço de onde ele havia sido enviado. Era uma cidade a uns 70 km dali. Iria, imediatamente. Alguém, na casa de repouso, poderia lhe dar notícias de Lucyle.

Ao chegar lá, foi recebido por Clara, a senhora que havia lhe enviado o pacote e estivera com Lucy em seus últimos momentos. Contou a Sidney que ela havia chamado por Sidney até não ter mais forças para pronunciar seu nome e fizera a Clara seus dois últimos pedidos: “Envie a ele o pacote que lhe pedi e vista-me de noiva,. Sou a noiva de Sidney, meu eterno amor!”

Mas, não foi bem assim que foi feito. Clara, ao perceber que Lucy não resistiria por muito tempo, decidiu enviar o embrulho a Sidney, para que ele pudesse despedir-se dela.

Um brilho surgiu no olhar de Sidney. “Então Lucy ainda está viva?”, perguntou a Clara. Não. Lucy estava sendo velada na capela da casa de repouso; havia falecido na madrugada. Havia se submetido à cirurgia há duas semanas e seu estado de saúde, desde então, só piorara.

Sidney, mais transtornado do que quando recebera o pacote, dirigiu-se à capela, para contemplar pela última vez o rosto de sua noiva. Agora, uma noiva cadáver!

(Conto publicado no livro Fragmentos, 2016)

Cleusa Piovesan

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Cleusa Piovesan
Enviado por Cleusa Piovesan em 21/07/2020
Código do texto: T7011995
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