228 - O Bragal
Ainda jogava à “Cabra-Cega” e já a mãe falava no seu enxoval. Parte das coisas que trouxera quando se casou e que ficaram anos a fio sem uso possível, iriam para a sua arca de cânfora. - Ficas já com três lençóis de linho, com várias toalhas de renda, naperons que já me deu a tua avó, meia dúzia de fronhas bordadas, uma colcha tecida no meu velho tear. E ela ouvia e quebrava o fastio desafiando o gato, jogando-lhe bolinhas de papel, lendo pela milésima vez o azulejo pendurado à direita da banca da cozinha: Seja bem-vindo quem vier por bem. Esta conversa repetia-se muito mas Aldina cresceu sem lhe dar grande importância. Ainda nem sequer sabia se casaria, ainda nem havia olhares significantes como promessa de alguma coisa possível e a mãe já navegava em risos e festas, já a via de branco e flor de laranjeira, já se imaginava de luvas e chapéu de cerimónia, carteira a dar com os sapatos. O pior seria o pai que não gostava de gravatas e a filha que não havia meio de assentar. Um dia ele chegou. Trazia roupa larga, camisa aberta, barba por fazer. Era, sem dúvida, aquele. Queria-a sem perfumes, simples em tudo, corajosa. Casar, casaria, disse-lhe, mas sem convidados, sem roupas especiais, sem banquetes. E foi, exactamente, assim o dia mais feliz da sua vida. O bragal ficou esquecido e a mãe, desgostosa, não fez questão de lho lembrar.