Azul Perfeito - À dois

Azul Perfeito: À dois

A turma estava toda agitada por conta de ser horário vago, ou seja, sem professor. Alguns alunos andavam pela sala procurando conversa, ou até jogar baralho, enquanto certa parte simplesmente saiu da sala para ficar esperando lá fora. Como era uma escola pública, havia certa liberdade no que os alunos faziam. Quando não havia professor, eles não eram obrigados a ficarem em sala, mas poderiam ficar lá fora somente se não fizessem muito barulho.

Gustavo permanecia parado em sua cadeira, e não se moveu mesmo com toda aquela agitação. Por mais que sua mãe houvesse dito para ele não se preocupar, não conseguia parar de pensar sobre como seriam as coisas dali para frente. Ele esteve tentando nos últimos três meses arranjar emprego, porém foram apenas duas entrevistas, e ambas fracassadas.

Ele estava se sentindo um lixo, e seu desempenho na escola havia piorado drasticamente.

As vezes quando estava muito triste, pulava o muro da escola e ia para casa para ver sua mãe, que estava doente após o divórcio. E hoje não seria diferente, aproveitou a aula vaga e resolveu simplesmente ir embora. Afinal, ficar parado lá sem aula era apenas perda de tempo, e mesmo que houvesse aula, ele não conseguiria prestar atenção no conteúdo, logo valia mais a pena ir embora.

Ele colocou seu capuz, e olhou para os lados para ver se alguém o percebia, porém, ninguém olhava para ele naquele momento. Tal ato de olhar ao seu redor, foi um sinal de que precisava de afeto, pois no fundo queria que alguém estivesse prestando atenção nele, e o impedisse de ir embora. Tendo a certeza de que sua presença não importava, saiu da sala levemente apressado enquanto colocava a mochila nos ombros.

Ao chegar perto do muro, longe de qualquer pessoa, ao invés de pular para fora da escola ele se sentou em um degrau. Sua mente nesse exato momento hesitava entre calmaria silenciosa e uma tempestade de indagações. Sem uma resposta para sua própria vida, ele colocou as mãos sobre sua face, e então começou a chorar. Mas foi um choro sem lágrimas, foi só a tensão sentimental e os olhos incomodados, porém lágrima alguma descia. Mas isso tinha uma resposta, não era porque ele não estava realmente triste, era por quê já havia chorado demais por aquele mesmo motivo, e logo, seu corpo se recusava a derramar lágrimas novamente, como se talvez, estivesse cansado disso.

Ele começou a balançar a cabeça, em sentido de negação, e a se perguntar baixinho — Por que? Por que eu nunca consigo fazer nada que presta? — E quando parou de se perguntar, logo suas esperanças pessoais estavam exauridas. De modo que, sentindo vontade de extravasar, intentou pular o muro e correr com toda a velocidade até sua casa, e ao mesmo tempo, imaginava-se batendo em seu próprio corpo, como forma de punição. No meio de tal raiva, ele apertou seu punho, e num movimento forte, socou o muro (de cimento e brita) com toda a sua velocidade. Ele ouviu um barulho estalante, possivelmente de seus ossos, ao socar a parede. Ele trouxe sua mão com os tendões avermelhados, e parte de um dos dedos levemente rasgada (porém sangrando) até sua perna, e pensou em gritar. Mas conteve-se para que não fosse percebido.

A imagem do sangue em sua mão lhe trouxe à lembrança certa ocasião. O garoto continuava a falar mal de Alessandra, que parecia muito importunada com o assédio do menino. Gustavo que estava logo atrás, movido pela paixão (ele gosta de Alessandra) se levantou enfrentando o valentão.

— Seu Filho da Puta sai de perto da menina, porra — Ele gritou subitamente, enquanto se levantava para empurrar o valentão.

— Você tá doido zé? Vem então ué, se você acha que é homem... Seu merda. – Disse o valentão parado, olhando para Gustavo, que também estava imóvel sem reação. O menino esperava que Gustavo partisse para cima, porém Gus não conseguiu tirar forças o suficiente nem para dar um passo. A imagem de Alessandra em perigo era o único catalizador de coragem, porém agora, a atenção do valentão estava somente nele, e tal havia parado de importuna-la, logo Gustavo simplesmente não tinha mais motivos para lutar.

Vendo que Gustavo tremeu na base, o menino se aproximou e deu um empurrão em Gus, que se desequilibrou e caiu derrubando algumas mesas ao redor. O empurrão não havia sido forte, porém o corpo de Gustavo estava tão desestabilizado que mal se apoiou, para evitar a queda.

— Retardado, eu só estava brincando com ela. Vai pagar de macho e não consegue nem se defender? — Disse o menino olhando para uma figura impotente, tentando se reerguer depois daquele golpe. Gustavo em nenhum momento se importou em brigar, na verdade sua atenção estava somente em Alessandra, dentro de si próprio ele esperava para que ela fugisse da sala, e saísse de perto do valentão. Porém ele se impressionou quando, ao em vez dela ir embora, ela se aproximou do menino e lhe chutou na costela.

— Deixa o Gustavo em paz e briga comigo. — Disse Alessandra enquanto colocava os dois braços em guarda, como no boxe. O valentão ficou sem entender a cena, de repente todo mundo queria brigar com ele. Mesmo sem entender, e apenas por instinto, ele se colocou na defensiva ao ver o olhar sério e determinado de Alessandra. Ela transmitia uma sensação de agressividade ao mesmo tempo que se mantinha calma, apenas por olhar para ela, ele conseguiu perceber que Sam sabia alguma arte marcial.

— Ahhh se mete não doidinha, ele que começou a briga, eu só me defendi ué. Vai querer pagar de boxeadora também? Vou te jogar pela jane... — Ele recebe um forte soco no rosto mais rápido que podia se esquivar. Antes que pudesse retomar a postura, Alessandra já preparava outro gancho com a direita que o acertou em cheio, no ombro.

Alessandra começou uma sequência de golpes, enquanto fazia o garoto recuar passo a passo. Ele se protegia cobrindo o rosto e a barriga, mas Alessandra parecia não querer parar. Ela começou a gritar enquanto descarregava sua raiva no valentão.

Gustavo observava paralisado a cena. Por um momento ficou com medo da Alessandra, e ao mesmo tempo, admirado pela bravura dela. No fim, foi ela quem o defendeu.

Quando Alessandra parecia ter pedido o controle de si própria, Gus pulou na frente dela, a agarrando e gritando para ela parar. Sem querer, um soco acabou acertando em cheio o rosto dele. Alessandra parou os golpes na hora, e Gustavo se apressou para tira-la da sala o mais rápido possível.

— Você está bem Alessandra? O que deu em você? — Disse Gustavo, após terem se escondido em um canto a parte. Alessandra ainda não havia reparado, porém a boca de Gus nesse momento estava sangrando, foi aí que ela olhou para ele e se assustou. — Mano, sua boca tá sangrando, foi quando o Pablo te empurrou.