O GAROTO MAIS BONITO DA RUA

Eu tinha uns 11 anos e uma paixão platônica. O nome dele era Diego, talvez uns dois anos mais velho que eu. Era o gatão da rua. Já naquela época, início dos anos 80, Diego era cheio de estilo. Sempre com bermudas coloridas, moreno do sol, loiro e lindo. Tempos depois ele se tornou surfista profissional e... bem, esta é outra história. Eu era louca pelo Diego.

Mas ele não estava nem aí para mim.

Até então eu nunca havia namorado ninguém, porém, na minha mente, Diego tinha todos os requisitos para ser o número um. Eu mal sabia como se beijava.

Bolei uma estratégia para conquistá-lo. Diego costumava andar de bike pela minha rua. Às vezes sozinho, outras vezes com amigos. Minha ideia era abordá-lo em um destes passeios. Ele com a sua bicicleta e eu, com a minha.

Dito e feito. Em um sábado monótono, à tarde, (lembrem, não havia internet naquela época), eu cheguei à janela e me deparei com meu futuro namorado passando de bike pela rua calma. Dez minutos depois eu já estava lá fora, pedalando, ansiosa, procurando Diego. Céus, ele tinha sumido.

Andei mais um pouco e descobri, enfim, onde Diego estava: pendurado na janela do apê térreo da Márcia, uma guria que eu odiava. Metida, arrogante e nojenta, todos estes atributos pertenciam a uma fedelha de doze anos. Fiquei tão furiosa que quase perdi o controle da bicicleta. Minha inteligência emocional aos 11 anos era nula. Fui até o fim da rua pedalando com raiva e voltei. Diego continuava no mesmo lugar. Márcia era toda sorrisos. Eu, puro despeito. Passei várias vezes por ele, Diego não me viu. Me senti invisível e ultrajada. Então, lá pela décima vez, aconteceu algo horrível. O cachorro da Dona Sílvia, um histérico pinscher que eu odiava, resolveu atacar a bicicleta. Sempre morri de medo daquele bicho e quando eu o vi partindo para cima do pneu da frente, perdi o equilíbrio.

E eu caí. Desabei sem glamour nenhum em cima do jardim do edifício da Márcia, ante os olhos do Diego. Não sabia o que era pior. O pinscher surtado ou o meu vexame. Quase fiz xixi na calcinha.

Dona Sílvia arrancou o cachorro de cima de mim e desapareceu. Restou eu com meu joelho esfolado com uma perna por cima e a outra por baixo da bike. Uma cena a ser esquecida.

Então, o milagre. Diego surgiu como por encanto ao meu lado e, com aquele sorriso que me tirava de órbita, me juntou do chão.

Fiquei tão emocionada que quase emudeci. Não olhei mais para a cara da Márcia. Diego, gentil, perguntou como eu estava e ainda me levou para casa. Eu enxergava estrelas de amor por todos os lugares. Depois que ele foi embora levei uns tapas da minha mãe, pois eu tinha saído de casa sem avisar. Mas nem me importei. A felicidade que eu sentia era maior que tudo. Na minha cabecinha delirante eu iria casar com o Diego. Era só uma questão de tempo. Meu futuro havia sido traçado graças a um pinscher perturbado.

Uma semana depois o Diego se mudou para São Paulo e deixou um vazio no meu coração. Foi o primeiro vazio de vários que vieram pela frente. Mas, pelo menos, a Márcia também não casou com o garoto mais bonito da rua.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 09/07/2020
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