DONA DA VINGANÇA
Zeca chegou em casa tarde. Entrou no quarto meio que se arrastando. Tivera um dia cheio. Pensou em deitar-se um pouco, antes de tomar uma ducha quente. Nem tirara a roupa enxovalhada. Aproveitara a oportunidade já que não poderia nem pensar nessa hipótese se sua esposa estivesse em casa. July era obcecada por limpeza e por arrumação. Extremamente caprichosa e zelosa. Excelente esposa. Linda e fiel. Jamais permitiria que ele se deitasse nos lençóis limpos com aquelas roupas sujas. Tirou um cochilo muito breve e despertou. Olhou para o notebook sobre a escrivaninha e pensou em distrair-se um pouco. No canto esquerdo da tela um atalho para a sala de bate-papo parecia seduzi-lo. Estava certo de que uma conversa inocente não faria mal. Afinal de contas, ele amava July e não passava pela sua mente a hipótese de fazer algo que pudesse entristecê-la. Deslizou o mouse sobre a tela e iniciou a conversa com uma jovem que atendia pelo apelido de Dona. Logo surpreendeu-se com a inteligência da interlocutora. Acreditava que nesse ambiente houvesse apenas pessoas vazias, corações frios e mentes tresloucadas, mas Dona lhe passara uma impressão completamente diferente. Uma conversa agradável, educada e interessante. Dona falou da sua busca por um amor verdadeiro, legítimo e puro e de sua vontade de encontrar alguém para amar e fazê-la feliz. Zeca foi aos poucos se encantando e se entregando à sedução daquela moça que realmente parecia ter o coração cheio de amor. Zeca costumava dizer que a boca fala daquilo que o coração está cheio e, indubitavelmente, o coração de Dona transbordava de ternura e de amor. Disposto a dar prosseguimento à conversa, mentiu a respeito do seu casamento e do seu relacionamento com July. Disse coisas terríveis a respeito da esposa com o intuito de conquistar a confiança da jovem. Não fazia isso com segundas intenções, mas, simplesmente, estava interessado na estória da moça. Zeca percebeu que havia muito amor no coração daquela moça apesar da evidência de que estava desiludida por conta do excesso de frustrações. A noite passara sem que percebessem o monte de coisas que haviam compartilhado e Zeca parecia ter renovado as suas forças. Gostou de conversar com ela. Ele mesmo costumava dizer: quando for se casar, case-se com alguém com quem goste de conversar. Se não fosse casado, Dona certamente seria uma bela opção. Dona despediu-se como quem lança um anzol com isca ao mar e Zeca se deixou fisgar. Convidou-a para se encontrarem mais tarde em algum local. Sugeriu um Café e ela assentiu. Zeca ficara curioso a respeito da moça. Precisava confirmar se ela era realmente como se apresentara. À noite, no horário marcado, Zeca adentrou ao Café e se dirigiu à mesa reservada e, para sua surpresa, lá estava July, com os olhos marejados e uma cara de poucos amigos. Ela tinha nas mãos a cópia da conversa entre ele e Dona. A própria Dona havia lhe entregado. Estava tudo acabado. Dona explicara a July que passara a vida acreditando no amor e em tudo que ele poderia lhe proporcionar, mas fora traída por seu noivo e daí em diante iniciou um plano de vingança. Concluiu que o homem que não faz por merecer a esposa, não é digno dela. Desde então passou a caçar maridos traidores e entregá-los como presas às esposas. De certo modo, a culpa pelas separações não devia ser imputada a ela, uma vez que eles eram atraídos e engodados pelas próprias concupiscências. Zeca chorou, pediu perdão de joelhos e implorou para que July o recebesse de novo em sua cama, mas July jamais permitiria que ele se deitasse nos lençóis limpos com aquelas roupas sujas.