MEU PRIMEIRO DIA DAS MÃES



 
Por ser um dia especial, hoje lembrei-me do meu primeiro dia das mães. Decorria o ano de 1968, eu contava com sete anos de idade.

 No nosso colégio não se falava em outra coisa naquela semana, no domingo seria o dia das mães. A professora dona Stella nos disse que neste ano cairia no dia sete. Nunca mais esqueci dessa data.

Durante a aula na segunda feira a professora nos perguntou o que daríamos a nossa mãe nesse dia. Fiquei pensando do que a minha mãe gostava. Não tinha dinheiro, mas uma ideia me surgiu e pensei comigo mesma: essa semana vou guardar o dinheiro do lanche para comprar um presente para minha mãezinha.

A semana passou rapidamente, no sábado de manhã fui ao mercado para minha mãe que pediu para ir comprar farinha de rosca, pois, no domingo dia das mães iria fazer o bife a parmegiana.
Eu, claro era louca pelos bifes que minha mãe fazia.

No caminho para o mercado passei em frente ao Asilo São Vicente de Paula e fiquei parada alguns instantes olhando o jardim. Se havia uma coisa que adorava era olhar aquele jardim cheio de flores. Havia rosas, imensas margaridas, balançando ao vento em suas pétalas branquinhas feito nuvem. Mais ao fundo percebi que havia uma grande plantação de antúrios e palmas. O contraste entre o antúrio vermelho e as palmas brancas me chamaram a atenção. Seria aquele o meu presente para minha mãe. Um buquê de antúrios com palmas brancas envolto num papel celofane com um laço cor de rosa.

Precisava ver como faria para minha mãe não descobrir o meu presente. Rapidamente fui ao mercado comprar a farinha de rosca e na volta perguntei ao jardineiro do asilo se ele haveria de estar aberto no domingo de manhã bem cedo. Ele perguntou o porque e eu então lhe confidenciei do meu plano para presentear a minha mãe. Sorrindo me disse para escolher as flores. Disse-lhe que gostaria que fossem seis antúrios bem vermelhos, os mais bonitos, e uma dúzia de palmas brancas.

Faltava o papel celofane e a fita rosa. O jardineiro então me disse que havia ali na frente do asilo uma moça que me venderia tudo que eu precisava. Quis saber se isso não iria ficar muito caro. Havia economizado a semana toda de lanche, mas estava com medo de que o dinheiro não fosse suficiente. Meio sem jeito perguntou-me quanto eu havia poupado. Levando a minha mãozinha ao bolso retirei o meu dinheiro que estava todo enrolado num papel de caderno. Contava ali seis cruzeiros. Olhando em meus olhos o jardineiro sorriu e disse que seria suficiente. Avisou-me que o melhor seria comprar as flores naquele dia mesmo a tarde, se não ficaria sem as flores, dada as vendas naquele dia serem muitas para o dia das mães no outro dia. Disse ao jardineiro que voltaria mais tarde então para levar a minha encomenda. Deixei pago as flores.

Correndo fui em direção a minha casa. Já se fazia tarde e minha mãe iria ralhar comigo, com certeza.

Ao chegar em casa levei bronca, mas não disse nada a minha mãe. Não importava a chamada de atenção, no outro dia iria surpreendê-la com as flores.

Passei o resto do dia ansiosa para voltar ao asilo. Para minha surpresa minha mãe disse que iria sair para comprar algumas coisas para o almoço do outro dia. Eu havia lhe pedido que fizesse um doce de mamão.

Aguardei que ela virasse a esquina e fui correndo em direção ao asilo. Ainda bem que não era longe de casa. Ao chegar lá percebi as minhas flores num balde com água. O jardineiro então me disse para antes ir na loja comprar o papel celofane e a fita rosa que ele me ajudaria a fazer o buquê.

Disse-lhe que faria eu sozinha. Atravessei a rua e fui em direção da loja. Havia muitas pessoas comprando presentes, papéis para os presentes, fitas. Olhei rapidamente em volta e percebi um rolo de fita rosa. A moça no balcão perguntou-me gentilmente o que queria. Mostrei-lhe o rolo de fita rosa. Ela pergunta quanto queria de fita. Rapidamente corta um metro e embrulha num papel junto com o papel celofane transparente.

Atravessei a rua novamente e fui buscar as minhas flores. Estava tão feliz naquela tarde. Minha mãe não iria descobrir o meu presente.

Ao chegar em casa coloquei as flores sobre a mesa e abri o celofane para fazer o embrulho. Fiquei com um pouco de dificuldade, mas consegui preparar o buquê. Com a fita rosa fiz um lindo laço. Havia aprendido com meu pai a fazer laços naqueles dias. Pronto. Agora já estava tudo arrumado. Fiquei olhando para o buquê e pensando onde iria esconder até o outro dia.

Olhei em volta e pensei: bem a mesa é alta, tem uma toalha comprida. Vou colocar em baixo da mesa dentro de uma lata com água para elas não murcharem.

Acabei de esconder as flores e rapidamente limpei a mesa. Havia cortado um pouco o caule das flores. Joguei no lixo e deixei tudo bem arrumadinho.

Não tardou muito minha mãe voltou do mercado. O resto do dia correu lindamente. Até ajudei a minha mãe a lavar a louça. A pia era alta, mas meu pai havia feito um banquinho para mim. Era em cima dele que ficava para conseguir lavar a louça.

Naquela noite quase não consegui dormir. Queria acordar cedo para surpreender a minha mãe. Ouvia o tic-tac do relógio no quarto de meus pais. Naquela época eu dormia na sala. Pois não havia um quarto para mim. Meu irmão que dormia no quarto junto de meus pais. Na madrugada ouvi os passarinhos em sua algazarra. O galo cantando no quintal dizia que já era hora de levantar-se.

Mas, era domingo, meus pais dormiam até mais tarde.

Levantei-me e fui olhar o relógio na cozinha que marcava sete horas da manhã.

Abaixe-me e retirei as flores de dentro da lata que estavam debaixo da mesa. Pé ante pé, silenciosamente me encaminhei em direção ao quarto de meus pais. A cama do lado de minha mãe havia um criado mudo. Coloquei ali bem devagar e sem fazer barulho o buquê de flores. Olhei para meus pais dormindo pesadamente. Pronto, pensei comigo mesma. Agora já está. Quando ela acordar vai ficar feliz.

Voltei para a sala e tornei a deitar. Dormi profundamente, com a satisfação de ter feito o meu melhor.

Mais tarde… acordei com a voz de minha mãe.
Então… que flores são essas? foi você Euclides? Meu pai olha para ela e diz: não…quem será que foi? Foi você Daniel? Meu irmão mau abriu os olhos e sentou-se na cama esfregando os olhos. Fez que não com a cabeça.

Sentada no sofá eu disse: fui eu mãe. Encaminhei-me ao quarto deles e sentei-me na cama. Recebi um abraço apertado de minha mãe e um beijinho no rosto. Meu pai logo me pegou no colo e me abraçou. Ficamos ali deitados abraçados.

Alguém aqui está com fome? Pergunta minha mãe. Euuu…meu irmão também diz: eu mãe, estou com muita fome. Rimos  todos e levantamos.

Naquele domingo fiquei radiante com o vaso no centro da sala em cima da mesinha. Era um vaso de cristal que minha mãe havia ganho de presente de casamento. As flores ficaram maravilhosas nele.

Da mesa da cozinha tomando meu leitinho quentinho com café lembro-me até hoje de ver pequenos raios de sol batendo nas palmas brancas e os antúrios reluziam com a sua luz. Pareciam que haviam sido envernizados.

Meu primeiro domingo de dia das mães. Inesquecível as lembranças.
 
Silvya Gallanni 10/05/2020

 
Silvya Gallanni
Enviado por Silvya Gallanni em 10/05/2020
Reeditado em 21/05/2020
Código do texto: T6943250
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