137 - Cento e Trinta e Sete
O mais difícil era o silêncio. Quando não se dizia nada, a falta de palavras era um mar entre nós. Víamo-nos mas cada um olhava para outro lado para que nenhuma mensagem escapasse dos olhos, para que nenhum gesto traísse o bater do coração, o calor do peito, a necessidade de acabar distâncias e recomeçar. – Olá, alguém diz e a palavra faz desmoronar a parede, esvaziar o mar, acender o dia. Já podemos olhar-nos. E olhando-nos dizer da claridade, da força, da vontade. Tudo como se não existisse interesse, a experimentar a resistência do outro silêncio, a desafiá-lo a ir além, a escolher novo vocábulo, a dar a volta à chave uma vez que o olá simples não chegava. - Vim ver-te, disse. E todas as sete fechaduras da minha alma, num barulho de sinos, rodaram a um tempo, escancaravam-se-me a porta e o sorriso, libertava o olhar para todas as mensagens e, sem me aperceber o barco de há pouco chegava ao outro lado, atracava, pegava-lhe nas mãos, beijava-as e, enfim, as palavras fora da contenção diziam: eu também!