ROMEU E JULIANO.

Amena manhã, o sol majestoso acena do alto da colina, enquanto as aves alegremente cantavam na copa das árvores, pulando e voando de um galho a outro, parecendo crianças a brincarem, apenas observo.

Amena manhã, é o início de mais um dia.

Na calçada em frente a minha casa, trabalhadores caminham apressados rumo ao ponto de ônibus. Uma brisa suave começa a soprar. O moço de cabelos longos e negros, perfume suave, corpo esguio, caminha com cuidado pela calçada esburacada, aceno, ele responde.

Do outro lado da rua o movimento na creche é frenético, as mães, apressadas, trazem os seus filhos, deixando-os aos cuidados das funcionárias, as crianças, algumas aindas sonolentas, nem se dão conta do que está acontecendo, já outras, um pouco maiores, choramingando reclamam o colo da mãe, mas logo desistem. Ao lado da creche existe duas escolas, estamos no período de férias, portanto, não há movimentos na escola, é até estranho o bendito silêncio.

É apenas mais um dia, e como todos os demais, a vida segue o seu curso, e lentamente se arrasta neste dia tedioso. A impressão é que a segunda-feira nunca vai passar, mas é somente uma impressão. O dia segue o seu curso, como um rio caudaloso, e como todos os outros que foram, e os que ainda virão, assim como as águas da correnteza que nunca voltam para trás.

Amena manhã, com todos os seus sabores, com todas as suas delícias, como poeta que sou, aproveitei para compor um poema, inspirado no moço de cabelos longos e de perfume suave...

Amena manhã, meus pensamentos são tranquilos, brandos, quietos neste momento. Guardei a pena de meus versos. Aproveito essa quietude momentânea, aproveito cada segundo desta manhã tranquila. Logo mais, toda a dor e dissabores da vida virão a tona, trazendo todos os fantasmas do passado, do presente, e do futuro também. O dia então torna-se-a pesado, cansado, e até inoportuno. Mas sou apenas um vulto poético, buscando na flor da vida alheia, o néctar de cada dia, depositado carinhosamente em cada palavra que escrevo.

Estou em uma penosa terça-feira de 2018, à princípio o dia se inicia calmo. É sempre assim, calmo... As primeiras horas da manhã, em geral, são tranquilas.

Logo após tomar o meu café da manhã, aproveito para escrever. Eu gosto de escrever pela manhã, as ideias estão frescas na cabeça, sem a interferência e o calor das angústias decorrentes do dia; assim eu já faço já há alguns anos e não pretendo mudar.

Verdade seja dita, nem todos os dias são assim, nem tudo são flores, às vezes até nas flores mais belas encontramos indesejáveis espinhos. Os dias às vezes são duros, tempestuosos, com ventos fortes que nos desestabilizam. Eu não gosto de dias assim, enfim, quem é que gosta. Sei bem que dias assim são inevitáveis, e não há outra solução ou fórmulas mágicas para driblá-los, se enfrenta, ou será pisoteado por ele. Acontece que, nem sempre enfrentamos, por diversas vezes somos pisoteados, massacrados, feitos aos cacos, é difícil eu sei, ninguém gosta de falar sobre certos problemas.

Eu não gosto de mentir, falo o que o meu coração diz, o que dá na telha, seja bom ou ruim, não sei se é virtude ou defeito. Hoje por exemplo, escrevi um soneto, ele é um pouco triste, acho eu, mas gostei de escrevê-lo. Pretendo fazer outros, mais alegres é claro, carregados de amor talvez.

O penoso dia seguiu-se cheio de lembranças e de meditações.

Houve um momento em que lembrei-me de certo olhos brilhantes, cheios de esperanças, lábios cheios de beijos doces, de admiração e encanto, era àquele também semelhante ao moço de cabelos longos e perfume suave, em certo momento... De repente… Da calmaria se faz a tempestade, e os olhos cheios de esperança se entristece, e do riso se faz as lágrimas, e o encanto vira em desencanto, e da voz se faz o silêncio. Tudo isso, em certo momento de incompreensão - Essa foi uma lembrança ruim - A vida é feita de momentos, se não tivermos isso em mente - que a vida é feita de vários momentos - sofreremos uma eternidade inteira nestes pequenos segundos de dor.

Fora isso, o dia seguiu em seu curso de normalidade, carros apressados nas avenidas, pessoas apressadas pelas calçadas e pelas lojas. Trabalhadores que chegam e que vão, ônibus lotados, crianças de férias que correm e que brincam pelas ruas, nas praças, nos campinhos, em todos os lugares.

A vida segue o seu ritmo desprogramado, as festas do fim de semana nem bem terminaram e o que se fala no momento, acreditem, é das próximas festas que está por vir nos próximos futuros feriados; carnaval, páscoa, enfim, estamos no Brasil. Sou apenas um poeta observador desta geração, entre um risco e outro no papel, entre um verso desajeitado e outro, entre um texto qualquer vou pintando os meus dias com minhas palavras, contando, e às vezes cantando em rimas, as impressões de tudo e de todos, assim sendo, vou caminhando ao sabor do vento e da literatura sem saber o quem sou de verdade.

Talvez eu seja personagem de mim mesmo, rejeitado pela sociedade, poeta, homossexual, expulso de algumas feiras literárias, incompreensíveis.

Estou desempregado no momento. Àquele moço de cabelos longos, perfume suave, semelhante ao meu amor proibido, era o meu Romeu, filho do meu agora, ex-chefe. Ele, Montecchio, por ironia do destino, chamado Romeu - Eu, Juliano - talvez o seu Capuleto - Tenho diante de mim as glórias e desgraças do mundo. Diante de mim tenho um copo pela metade, enquanto o meu Montecchio dorme, após servir-se da metade desse cálice, sirvo-me agora deste último gole da morte, deixo apenas esses escritos, peço-lhes apenas que, em nossas lápides escrevam: "Viveram, amaram, foram poetas até o fim".

Tiago Macedo Pena
Enviado por Tiago Macedo Pena em 16/09/2019
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