O BELO RAPAZ DO POÇO

Mês de julho, enfim chegaram as férias... Ansiedade estava saindo pelos meus poros. 

Estava louca para chegar no sítio onde passei grande parte da infância. 

A saudade dos meus pais e irmãos explodia no peito, faziam quase dois anos que não os via. 

Mais duas horas ainda nos separavam. 

A paisagem mudava a cada quilômetro rodado. 

Já avistava as plantações de soja e milho que tocavam o horizonte, enquanto suas folhas dançavam com o soprar do vento. 

Nossa! A emoção tomou conta... Eis a porteira, onde subi tantas vezes tentando avistar quem ao longe vinha. A porteira era um observatório perfeito.

Desci do carro e antes de abri-la a segurei fechada por alguns minutos, relembrado vários momentos, parecia ainda conter ali naquela madeira, as marcas das minhas pequeninas mãos, sujas de argila. 

Alguns metros depois a ponte sobre o riacho, que por inúmeras vezes tomamos banho... Na maioria das vezes todas nuas. Éramos umas dez crianças, entre irmãos e primos. 

Aquele lugar realmente mexia muito comigo. 

Meus pais ouviram o barulho do carro, e foram esperar-me na área da frente, nossa casa é de madeira toda pintada de verde com janelas branca desde sempre. 

Como é aconchegante, o abraço dos pais, não me lembro de sentir nada igual. 

Minha mãe estava com a mesa posta com todas as e guloseimas que eu mais gostava. 

Reunimos todos à mesa fazendo muito barulho, estávamos todos muito felizes. A euforia era tanta, que não percebi um moço sentado em um banco próximo com uma caneca de café. 

Toquei no pé de minha mãe, e perguntei com um gesto quem era a pessoa. 

Ela o olhou e disse, Marcos esta é a nossa filha da faculdade que te falamos, ele já me observava a alguns minutos.

Levantou e caminhou até mim, estendeu - me sua mão calejada e encardida... Muito prazer senhorita Júlia... Desculpe por não cumprimenta-la antes, estavam tão empolgados... Eu não quis interromper. 

Percebi que apesar das mãos calejadas, ele era um homem educado e até polido. Meu pai puxou uma cadeira e ofereceu a ele, mas recusou justificando que suas roupas estavam sujas de terra. 

Meu pai insistiu, e percebi que papai gostava dele. 

Sentou-se próximo e senti o cheiro do suor de sua pele. Era um cheiro de terra com suor e algum tipo de desodorante amadeirado. 

Terminamos o lanche entre prosas e olhares. Ele se levantou dizendo... O trabalho me espera, até mais...consenti com a cabeça e ele se foi. 

Logo depois perguntei quem era , e o que ele fazia por lá. Meu pai sorrio e disse, então você não o reconheceu... É o filho mais novo do seu Jorge nosso vizinho falecido. 

Júlia lembrou que seu Jorge tinha um filho que estava no serviço militar na ocasião. Falava muito nele, tinha muito orgulho por ter um filho seguindo carreira nas forças armadas. 

Sim me recordei agora deste filho, mas acho que nunca tínhamos nos encontrado. Todas as vezes que ele esteve na fazenda do pai, foi muito rápido e eu estava fora.

Depois que seu Jorge faleceu, ele veio para cá, cuidar da mãe e da irmã que está quase formando em odontologia. 

Meu pai explicou isso levantando-se da mesa dizendo... ele está aqui furando o poço artesiano. 

Anoiteceu e fui dormir mais cedo. Estava muito cansada da viagem. 

Acordei de manhãzinha com papai lidando com às vacas leiteiras. Coloquei-me de pé, não queria perder o leite espumante tirado direto da teta da vaca. 

O cheiro de café estava por toda a casa. Abracei minha mãe e disse, hummm... que cheirinho de infância! 

Sorrimos e fui para o curral. 

Lá já estava em cima da cerca do curral Marcos, também com uma caneca na mão esperando o leite. 

Ele olhou-me sorriu e disse... Vamos beber a nossa infância! Concordei completando, na verdade neste sitio tudo, arremete a minha infância, a melhor parte de minhas lembranças foi todas aqui. 

Enquanto Marcos se distraia conversando com meu irmão comecei a observa-lo. Era um belo homem, forte, com cara de mau, mas de gestos gentis. 

Parecia um homem decidido e forte. 

Ele desceu da cerca e veio até mim, olhou nos meus olhos, parecia enxergar minha alma. Fiquei um pouco desconfortável. 

Olhei também nos olhos dele, não consegui desviar, foi mais forte que eu. 

Por alguns minutos ficamos meio paralisados. 

Ele colocou a mão sobre meu ombro e disse, vamos dar uma volta na cidade amanhã? 

Terei de buscar minha irmã, ela vem passar uns dias aqui, sua mãe me disse são amigas, e que a tempos não se veem. Fiquei muito feliz de saber que iria rever Flávia, minha amiga de infância. 

Combinamos de sairmos as nove da manhã de sábado. Marcos apareceu antes e eu já estava pronta. 

Entrei na caminhonete ao lado dele. Marcos estava lindo com aquela camisa do exército e uma calça calças de ganga surrada. 

Observei suas mãos no volante, as unhas bem cortadas e limpas. Estava cheirando algo semelhante ao dia anterior, bem amadeirado. Perguntou me você é mais jovem que minha irmã? 

Respondi que era mais velhos dois anos. Ele disse então está com 25 anos. 

Sim 25, até dia 6 de setembro. Ele sorriu e disse bem... Vou tentar não me esquecer. 

Flávia chegou no horário marcado fizemos uma algazarra, nos abraçamos muito... Marcos ficou observando, depois brincou vai sobrar para mim, o que? 

Flávia saiu correndo para os braços dele. 

Ele beijou-a na testa e disse minha linda pequena que saudades...pegou a mala dela e jogou na caminhonete dizendo, vamos embora garotas lindas. 

Em alguns minutos parecíamos uma família. 

Eu me sentia muito a vontade e feliz. Chegamos em casa e o convidei para o almoço, já que a mãe deles estava viajando. 

Aceitaram, logo após o almoço Marcos puxou - me de lado e disse que precisava falar comigo. 

Ele estava sério e isso me deixou apreensiva. 

Fomos para o sofá da sala, ele olhou-me e disse sem rodeios. Júlia presumo que já percebeu o quê está acontecendo com a gente... Não sou de brincar de amor , então quero saber. 

Percebi que vem me observando, eu também tenho feito o mesmo, você me deixou fascinado desde o primeiro momento que nos vimos. Já não consigo ficar sem pensar em você. 

Preciso que me diga o que está acontecendo com você em relação a isso. 

Fiquei com as mãos geladas, não tinha palavras para expressar o que estava sentindo naquele momento. 

Sabia que era algo muito bom, Marcos ficou esperando a resposta por alguns minutos, percebendo que eu não conseguia responder, levou minhas mãos aos lábios e começou beija-las. 

Não conseguia mover-me, então ele colocou meus braços em volta do seu pescoço e beijou-me a boca com sofreguidão. Tive que sentar-me minhas pernas estavam trêmulas. 

Ele não parou, e eu correspondia​ todo aquele fogo. Ficamos noivos seis meses depois marcamos o casamento para maio do ano seguinte, quando faríamos um ano e quatro meses de relacionamento. 

Nossa festa de casamento foi uma linda na fazenda dele e no estilo cigano, fizemos até o juramento com o pacto de sangue. Já comemoramos muitas coisas juntos e hoje a comemoração é muito importante, e faremos a mesma festa do nosso casamento, 25 anos depois, nossas bodas de prata. 

25 anos de pura felicidade. Ainda fico com as pernas trêmulas quando ele me beija... adoro o seu velho perfume amadeirado. Ainda somos muito apaixonados. Somos parte do outro. Seremos assim, conforme nosso juramento. Até que a morte nos separe.

Pérola Guimarães
Enviado por Pérola Guimarães em 19/04/2019
Código do texto: T6627719
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