Luiz Antonio Peixoto de Andrade
Luiz Antonio Peixoto de Andrade
De Herculano de Lima Einloft Neto.
Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2019.
Luiz Antonio Peixoto de Andrade morava no Rio de Janeiro desde que nascera. Raramente tinha viajado para outras cidades, mas conhecia bem a cidade em que morava. Sempre morara na Zona Sul, mas tinha uma boa ideia dos bairros da Zona Norte e Zona Oeste. Desceu do Uber na Voluntários da Pátria, quase chegando à praia de Botafogo. Gostava daquela área de prosperidade de Botafogo, com muitos restaurantes e bares abertos durante o dia e parte da noite. Subiu ao quinto andar de um prédio próximo ao cinema Estação NET Rio para dar um beijo em sua avó, e desceu de novo para ver o movimento na rua Nelson Mandela.
Uma mulher em particular lhe chamou atenção, de cabelos brancos curtos, e um corpo muito bem desenhado, numa saia branca com estampas. Era mais velha que ele, presumia, ca. de vinte anos. Andrade tinha um fraco por mulheres mais velhas. Mas de que adiantava tentar se aproximar se o resultado era raramente positivo? Chegava a admirar o amor platônico que sentia e que o satisfazia, em vez de lamentar a dificuldade de um amor não-platônico. Observou a mulher com calma enquanto bebia um refrigerante zero, era realmente linda para ele. Andrade usava óculos por ter miopia. Pensou que talvez ela aparecesse por ali mais vezes, quem sabe talvez se reconhecessem um ao outro algum dia. Não tinha ambição de um relacionamento, pois tinha uma noção muito clara das dificuldades impostas por um. Era melhor, para Andrade, continuar só, e fazer o melhor que podia escrevendo ao computador seus textos de contos de ficção.
Resolveu escrever um conto em que tudo desse certo. Ofereceu uma bebida à mulher, que estava com uma amiga, depois de trocar olhares com a primeira. Ela aceitou e a amiga logo se levantou para ir embora e os deixar a sós. Começaram uma conversa, ela se chamava Luiza Carvalho de Almeida, tinha sessenta anos, e trabalhava como secretária em uma repartição da Cedae. Andrade disse que ela era linda, e ela aceitou o elogio com gosto. Andrade estava tranquilo e a coisa fluia com naturalidade. Conversaram sobre livros e autores importantes para cada um, Andrade citou Artur Azevedo e Fiodor Dostoievski, Luiza Carvalho de Almeida citou Clarice Lispector e Lygia Fagundes Telles, e quando Andrade lhe perguntou sobre autores em domínio público, Luiza C. de Almeida citou Lima Barreto. Tinham interesse em comum por Lima Barreto, cuja obra Andrade tinha praticamente toda, tanto em formato digital como em papel imprimido, assim como tinha a obra de Artur Azevedo, disponível em www.dominiopublico.gov.br .
Andrade não via a hora de dar um beijo em Luiza de Almeida, e quando a hora de pagar a conta chegou, Luiza pagou o que tinha consumido antes, e convidou Andrade para ir a sua casa. Ela morava na Gávea, e ele também, então era muito conveniente para os dois. Andrade sempre morara na Gávea, Luiza Carvalho de Almeida se mudara de Laranjeiras para lá havia pouco tempo, daí não terem se visto antes por lá.
Luiz Antonio Peixoto de Andrade acompanhou Luiza Carvalho de Almeida até o apartamento dela na rua Marquês de São Vicente, ela lhe ofereceu uma bebida, ele aceitou uma limonada. Eram umas nove horas da noite. Andrade estava fascinado por aquela mulher que parecia ler seus pensamentos e não discordar deles. Passou a noite no apartamento dela depois de avisar a seus pais que ia dormir fora. Passaram uma noite linda e ao acordar tomaram café da manhã juntos, era sábado então, tinham se encontrado numa sexta-feira. Andrade sentia que estava se apegando àquela mulher, e só torcia para que a história não degringolasse em lugar algum. De qualquer forma, já tinha uma boa história e boas lembranças com aquela mulher que até o dia anterior era uma desconhecida para ele. Luiza C. de Almeida era carioca também, como era Andrade, e ambos se identificavam com isso. Ela estava se apaixonando por Luiz Antonio P. de Andrade, e também com medo de que algo desse errado naquela história.
Resolveram ir ao cinema juntos no sábado, foram ao Shopping da Gávea assistir a uma comédia romântica. Luiz Andrade já se sentia em um relacionamento, e as coisas só pareciam melhorar com o tempo. Tinham o WhatsApp um do outro e se falavam com regularidade nas próximas semanas. Luiza de Almeida passou a ser admiradora de Luiz de Andrade como escritor, lendo os contos que Andrade escrevia como escritor amador. Luiza C. de Almeida também escrevia contos, e memórias.
Aquele relacionamento durou até o fim da vida de Luiza Carvalho de Almeida, que viu Andrade atingir reconhecimento como escritor a seu lado. Andrade também tinha outras mulheres, mas isso não incomodava Luiza de Almeida. Andrade teve filhos com sua esposa, mas continuou seu relacionamento com Luiza, e ambos sempre se ajudavam mutuamente no que podiam. Luiza adotou uma criança logo depois de conhecer Andrade, Mariana, e Luiz Andrade foi como um pai para ela. Sua história com Luiza foi um dos mais belos casos de amor de sua vida, quiçá o mais belo. Luiza chegou aos cem anos lúcida, e seu relacionamento com Andrade continuava firme. Andrade escreveu um conto que contava a história de seu relacionamento com Luiza de Almeida.
Luiza Carvalho de Almeida faleceu com cento e dez anos, lúcida, deixando significativa obra literária, e ainda em relacionamento com Luiz de Andrade, então com noventa anos. Mariana Carvalho de Almeida continuou seu relacionamento de paternidade com Luiz Antonio Peixoto de Andrade. Mariana de Almeida se tornou escritora também, como a mãe e a figura paterna, e Andrade escreveu um texto em colaboração com ela, entitulado Amor Duradouro.
Luiz Antonio Peixoto de Andrade viria a falecer com cento e oito anos, deixando um legado, seus textos de contos de ficção, de uma vida inteira, seus filhos, também escritores, e em seus textos autobiográficos jamais deixou de ressaltar a importância de Luiza Carvalho de Almeida em sua vida. Seu grande amor, em uma história em que praticamente tudo dera certo. Um conto de fadas moderno, quase inverossímil de tão perfeito que fora, aquele amor. Mariana Carvalho de Almeida levava adiante os nomes de sua mãe com muita competência, escrevendo textos de alta qualidade. Sua relação com Luiz de Andrade durou até o fim da vida dele.