Vem, primavera!
Quando o vi naquele dia, respirei fundo e, na tentativa de me acalmar, soltei o ar lentamente.
Enquanto ele caminhava em minha direção, tentei em vão controlar meu corpo inquieto que já o desejava e meus pensamentos que, mesmo sem o conhecer bem, já eram seus.
No início, tentei disfarçar e agir naturalmente, mas sei que, apesar dos esforços, minhas intenções escaparam pelos meus olhos e sorrisos.
Não conseguia entender o que estava acontecendo, apenas sentir.
A sensação era de plenitude, ao mesmo tempo que, sem ele, me sentia vazia.
Então, em um surto passageiro de coragem e autoestima alta, tive a ousadia de achar, mais uma vez, que poderia ser notada.
Assim que nos encontramos, sem pensar direito, cuspi no último resquício de amor próprio que ainda subsistia e, despindo a minha alma, o implorei por seu amor e atenção.
Ele olhou fixamente para mim por três segundos, como se tentasse processar as informações, e logo sorriu com certo ar de indiferença, como se eu tivesse dito alguma piada ou algo sem importância, e falou sobre alguma coisa relacionada ao trabalho. Não disse uma palavra sequer sobre o que eu tinha acabado de dizer. Da maneira que ele fez, tive a impressão que não foi a primeira vez que pisoteou um coração.
Logo saiu como se nada tivesse acontecido e eu fiquei tentando me consolar com o "pelo menos, eu tentei".
No solo seco e quase infértil dos improváveis, uma rosa ousou nascer, mas logo foi sufocada pela rejeição do silêncio que é pior que a do "não".
Desde então, tento encontrar em outros textos a sua poesia e em outras músicas a sua melodia. E, nessas paixões efêmeras do cotidiano, chego até a achar, por um momento, que é possível esquecê-lo, mas a verdade é que os pensamentos sobre ele sempre invadem minha mente na madrugada.
Enquanto o ponteiro do relógio avança e a escuridão se dissipa, fico a sonhar: vem, primavera! Talvez em condições propícias esse amor possa florescer.