Príncipe Azul

Bem que diziam: o amor é cego, e esta afirmação encaixava-se perfeitamente em meu caótico caso com o garoto mais legal do colégio. E se era o mais bonito, eu realmente não sabia, gostava dele por diversos motivos e a sua aparência pouco importava. Tá...para ser sincera, observava-o durante os poucos milésimos que passávamos juntos na fila do lanche no recreio, e tanto desenhei na mente aquele rosto ao ponto de decora-lo aos mais escondidos traços.

Ele era alto ( ...tamanho ideal para a idade) os seus olhos redondos estampavam o preto cintilante, a boca abria um largo sorriso bobo( daqueles que surgem do nada enchendo a bochecha), o nariz era grego, grande, pontudo, destacável, e tinha um leve queixo quadrado. Os cabelos eram castanhos, e usava calça jeans larga presa a cintura por cinto de pano e camisa escolar composta pelas cores azul e branco, e por sinal a camisa de pano grosso caia-lhe muito bem apesar da péssima qualidade.

Admito tenho queda por garotos diferentes, que fogem do clichê de jovem adolescente falador de gírias, alcoólatra, sacana e bermuda frouxa sob tênis e chinelos da Nike. Procuro sentimento, carisma e principalmente risadas espontâneas. Mas, mesmo assim não era herdeiro de perfeição,pois ao lado dos amigos agia como um idiota

Não sabia o nome dele (e evitei o trabalho de perguntar), então o apelidei de príncipe azul...Sei lá...Coisa de garota apaixonada criar contos de fadas. Mas a vida segue caminhos esquisitos, melhor, inesperados e estaciona em pontos inimagináveis, e quando percebemos nos tornamos brinquedos do destino. Foi assim comigo, e você entendera o quão grande é a força do destino.

Certo dia( uma quinta ou sexta) esbarrei com a pedagoga na biblioteca. Lucia convidou-me a sentar e iniciou a conversa. Falava em latim, juro,não compreendia aquele embaralhado de explicações: '' Dislexia é um distúrbio de aprendizagem cuja característica principal é a dificuldade de leitura...'' e blá, blá, blá. A cantineira trouxe café, dispensei, a curiosidade atrapalhava meu apetite, e poucas vezes fiquei defronte com alguém da secretaria, a última vez fiquei de castigo e regressei para casa segurando um bilhete de suspensão: Arrependo de ter matado aula na companhia das amigas. '' Tá, mas resuma, por favor!'' Falei envergonha, o meu rosto mudava de moreno para roxo berinjela.

'' Querida, Lucas pegou péssimas notas em português, no primeiro e segundo bimestre, e o motivo: falta de leitura.'' Sacudiu a xícara, a fumaça do líquido quente e preto flutuava.''Hum...continuo perdida, onde deseja chegar? Seja direta!''

O sinal bateu, entrei na sala boquiaberta ao saber do desejo da pedagoga, e pior ainda, o fato do tal Lucas, ser o príncipe azul, abalou as minhas estruturas interiores. Em casa desabei na cama ao lado do despertador: a visita de duas horas exigia auto-controle, e o cochilo era capaz de reduzir os danos sofridos. Contei para minha mãe, a mesma ficou feliz: '' minha filhinha esta disposta a ajudar um colega?! Que orgulho!''

É, pena que a angustia travara minha língua.

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Bateu na porta usando o nó dos dedos. A delicadeza que espero de um real cavalheiro. Ops, novamente entro no terrível mundo das ilusões. Manter o pé no chão, manter o pé no chão! Gravidade, gravidade, gravidade'', repito girando a maçaneta. Momento câmera lenta, idêntico a cena de filmes onde a mocinha reencontra o mocinho após um doloroso período de amarguras causado por um termino idiota. Minhas pernas tremeram,, nos saudamos, convidei-o a entrar( gentilmente bateu os pés no tapete), ofereci biscoitinhos e fomos para o quarto.

'' Sim, já estou a par da história, vou ler e você presta atenção, ok?.'' Falei mexendo na estante. Decidi começar por Eleanor e Park; droga, romance meloso, ele deve ter detestado, mas elogiou e jurou ter gostado... Tenho dúvida, se gostou porque encarava os ursinhos de pelúcia? É fã de Mickey Mouse? Teletubbies? '' Desculpe, é a dislexia'', coçou a cabeça. Maldição, esqueci deste importante detalhe.

Tentei puxar assunto, questiona-lo a respeito dos estudos, e de recompensa arranquei informações valiosas. Sua matéria favorita é educação física (garotos, monstros viciados por futebol), pretende cursar medicina veterinária, influência do pai dono de sítio e de gados carérrimos. O hobbie de jogar vide o-game o atrapalha impedindo-o de realizar as tarefas de matemática ( hum, admito, prefiro lavar a louça do que quebrar a cuca fazendo cálculos). Paramos por ai, e combinamos de continuar no dia seguinte.

Mal dormi a noite lembrando da intimidade que tivemos.Baita loucura, passei de apaixonada para professora de aula particular. E o amor crescia em minha alma formando-se um rio de esperanças. Uma ideia despencou no formato de lâmpada(escrever poemas), porém precisava de mais conhecimento para executa-la.Contentei-me em seguir a diante, mudar de book, e o escolhido pelo próprio ouvinte fora: O Senhor dos Anéis. Curti, tem bom gosto. Segurei firme no objetivo de prender a sua atenção usando de corda minha doce voz, estava adorando bancar a Sherazade de Mil e uma noites.

Agradeço a Frodo e Thorin por conquista-lo, e a frente a intimidade cresceu entre nós ao ponto de compartilhamos histórias engraçadas. Olhava para ele com desejo, e ele olhava-me com intensidade, desconheço as frases escritas por seus olhos, entretanto disparei o '' eu te amo''. Podem me achar uma estupida, ou corajosa, eu mesma desconheço a fonte que roubei energia para esta declaração. Porém, o príncipe reagiu demasiado normal, em troca mandou o:'' eu também tenho interesse em você. Adoraria te conhecer melhor''. Parece frio, porém, considerei como um: '' aceito namorar com você''.

Ele demostrou a diferença masculina que abitava-o e aceitou a falta de relações sexuais. Escondeu inutilmente, boy, pois capto os sinais e sei que ambos somos virgens. Legal, um casal de inexperientes. Beijos não faltaram, a cada capitulo finalizado os lábios tocavam-se formando a serena melodia dos namorados. Ficava encantada com cada caricia.

Até o dia que despenquei do alto do castelo de promessas ralando a cara no chão( sobrou para mamãe limpar as lagrimas, suficientes para encher um balde). Lucas acomodou-se no meu puf tremando dos pés a cabeça. Procurava a mais fácil maneira de destruir a minha vida; optou por usar o machado no lugar da inchada. '' Peço perdão...'' gaguejava. '' Cara, desabafa, juro que entenderei.''Menti. '' Vou mudar de cidade, na semana que vem!'' Páh, o tiro acertou em cheio.

Tranquei o choro. Por mais que gritasse, berrasse, implorasse de joelhos e o pedisse em casamento o destino permaneceria trabalhando. O melhor era suportar a dor de um término em silencio, alias, que culpa ele teve?Consolou-me e prometeu que voltaria, o que não aconteceu e provavelmente nunca acontecera, pois o pessoal da escola, durante os flashbacks, falava que ele arranjou uma menina por lá( uma tal de Letícia Arades) e que planejava ter filhos com a mesma. É provável que se causou, e foi feliz para sempre... o que me deixa alegre.

Passamos momentos incríveis juntos, rimos, compartilhamos leituras e séries. Hoje agradeço por ter obrigado minhas pernas a acompanha-lo no ponto de ônibus, soltar o triste adeus e beija-lo pela última vez. Parece bobagem, quando as rodas do transporte rodaram no asfalto acenei com a certeza de que jamais o esqueceria porque eu o amei intensamento e optei por guardar a imagem do garoto legal que ele foi. E quando voltei, percebi que dentro de mim uma mulher crescia.

Edgar E
Enviado por Edgar E em 12/11/2018
Código do texto: T6501135
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