Quanta falta você me faz...
Mais ou menos à mesma hora daquela primeira semana de abril, um velhinho, apoiando-se num andador, chegava a uma praça caminhando no seu tempo, devagar e cuidadoso, sentava-se no mesmo banco, sob a sombra de uma linda Quaresmeira, ela, plena, mostrava-se por inteira, exuberante, sobressaindo-se o roxo das suas flores mescladas com o verde das folhas ornamentadas pelos raios do sol de mais uma manhã.
Era, talvez, o terceiro dia seguido que o via, lembro-me que na primeira manhã que o notei ele lá ficou por uns 30 minutos, em silêncio, abstraído, apenas e tão somente emoldurava aquela árvore e suas folhas e flores e nada mais ao derredor.
Noutra manhã, logo após se acomodar naquele mesmo canto, vi que ele gesticulava suavemente e parecia conversar com alguém, até um riso discreto percebi, em seguida, após o mesmo tempo dos dias passados, levantou-se e foi embora lentamente, parou após alguns passos, girou levemente o tronco e acenou em direção àquela moldura roxa e verde, dourada pelo sol, para em seguida continuar seu rumo.
No dia seguinte ele não apareceu, justo quando eu criava coragem para tentar uma aproximação e conhecê-lo um pouco mais, claro que seria com jeito, e se ele me permitisse ouviria suas histórias, suas paixões, seus amores e, se houvesse, mágoas e tristezas, no fundo queria mesmo era com ele me desculpar por, sem pedir licença, de certa forma ter invadido sua vida.
Passaram-se mais alguns dias, semanas e nunca mais o vi, mas refiz seus passos, nos mesmos horários, sentei no mesmo banco, olhei mais de perto a beleza roxa daquela que era a estrela da praça e, por instantes, infelizmente breves por demais, adentrei um portal no tempo e lá estive com ele, pedi-lhe uma espécie de absolvição pela invasão e pude lhe confessar a saudade e a falta que ele me faz, dele soube não guardar mágoas de ninguém e que em sua vida só aprendeu quando amou.
Paulo Afonso de Barros