Encontro de Verão
Era um dia comum de verão. O sol escaldante fazia com que a praia de Ipanema estivesse lotada de turistas que escolheram as belas paisagens do Rio de Janeiro para se banhar. Eu fazia parte daquele grupo. Era a primeira vez que meus pés tocavam a areia fofa e meu corpo branquelo se banhava na água salgada do mar. Meu sorriso parecia ter sido pintado em meu rosto porque eu não conseguia parar de sorrir. Naquele dia toda a viagem solitária passou a fazer sentido. Naquele dia havia decidido não me preocupar.
A sensação da imensidão de água me engolindo para dentro do oceano e me devolvendo de volta ao continente me fazia gargalhar cada vez mais alto. Não me preocupava que parecesse uma criança que acabara de ganhar um doce. Não me importava com os caldos que eu tomava. Era, sem dúvidas, o melhor dia de minha vida, tudo estava tão bem que me questionei se os problemas existiam de verdade ou se era tudo invenção dos meus pensamentos. O trabalho enfadonho, as decisões ruins que vinha tomando, será que isso era real? Ou só o que era real era minha existência e a imensidão do mundo?
Quando voltei à areia sentindo os raios de sol tocarem toda a extensão da minha pele, a sonolência tomou conta de mim, deixando-me preguiçosa e com uma imensa vontade de dormir sentindo a brisa marítima. Deitei no pedaço de pano azul que eu havia estendido para passar o dia e logo em seguida adormeci gradativamente.
Quando acordei, o sol já estava sumindo no horizonte, a temperatura já estava diminuindo e a praia já estava esvaziando, a grande massa de pessoas já tinha ido embora para aproveitar a noite da cidade maravilhosa.
Sentei e admirei a paisagem. Era tudo tão imenso e pacífico. O barulho do mar relaxava todo o meu corpo.
Estava tão absorta na calmaria que tinha tomado conta de mim, que fui pega de surpresa quando alguém resolveu sentar ao meu lado.
Com raiva, tentei verificar de soslaio se eu conhecia quem tinha se aproximado de mim sem autorização. Me surpreendi ao notar que um rapaz desconhecido e de olhos curiosos me encarava.
- Oi, você mora aqui no Rio? – Ele perguntou.
- Não, e quem é você? – Indaguei na defensiva.
Ele riu do meu comentário. Um sorriso brincalhão e despreocupado tomou conta de seus lábios grossos. Estranhei que alguém pudesse rir assim quando estava conversando com uma desconhecida. Seu corpo relaxado me fazia questionar se ele era maluco de conversar tão abertamente com uma estranha.
- Ora, eu sou alguém, e por enquanto isso deve bastar, e quem é você? – Ele respondeu devolvendo o questionamento.
Quem eu era? A pergunta martelou na minha cabeça me incomodando devido ao efeito que gerou em mim. Nem em um milhão de anos eu saberia responder. Talvez eu ainda estivesse em busca de algo que pudesse preencher aquela dúvida que eu mesma tinha sobre mim.
- Eu sou eu. Você que sentou do meu lado sem sequer me conhecer. – Não demonstrei minhas incertezas.
- É que eu te achei bonita.
A sinceridade crua da resposta me pegou despreparada e me fez sorrir. O sorriso foi incontrolável e me senti livre do receio inicial que ele me causou. Decidi que poderia conversar com ele mesmo sem sequer saber seu nome. Decidi fazer diferente e dar uma chance de conhecer alguém.
- E você, é carioca ou está a passeio? – Retomo a conversa.
Seus olhos castanhos-avermelhados se fixaram nos meus, decididos a não quebrar o contato visual, deliberadamente começou a brincar com as pontas dos meus cabelos, como se nos conhecêssemos há anos.
Estranhamente o gesto me causou certo conforto, fazia dias que eu estava viajando, e durante todo aquele tempo tinha ficado sempre sozinha, só me dei conta que senti falta de conversar com alguém naquele momento.
- Eu não sou de nenhum lugar, na verdade. Meu próximo destino é a Califórnia, você quer ir comigo? – Ele propôs seriamente.
O olhar que lancei a ele, demonstrou toda a incredulidade que tomou conta de mim. Afinal, eu mal o conhecia, sequer sabia o nome dele. Conversamos por cinco minutos e ele já estava me convidando para deixar o país.
Ergui as sobrancelhas para demonstrar minha descrença em suas palavras e revirei os olhos negando com a cabeça.
- Por que não? Eu gostei de você, do seu jeito quieto, parece ser uma boa companheira de viagem. Eu não to te pedindo em casamento, só quero que viaje comigo. Como amigos.
- Primeiro, é uma ideia idiota. Segundo, eu tenho trabalho e uma vida aqui, não posso deixa-la para sair por aí vadeando com um estranho que nem sei o nome.
- Então se eu te disser meu nome você vai? – Ele ria de mim descaradamente.
- Não.
- Cara, como você é careta.
- Cala a boca.
Ele me empurrou levemente com os ombros. Estava pronta para xingá-lo de todos os nomes que conhecia quando vi que ele estava rindo de novo. Não consegui segurar a risada e ri de volta, fazia tempo que eu não ria tanto perto de alguém. Seu jeito aventureiro me fazia relaxar e me permitir sair da seriedade de sempre.
- Falando sério agora, por que você está tão preocupada sendo que está nesse lugar incrível?
- Eu sempre estou preocupada. – Admiti.
- O que tanto te preocupa? – Pela primeira vez estava sério.
- Morrer antes de viver tudo que quero.
- E você já sonhou estar aqui?
- Sim.
- E você está vivendo essa experiência como sonhou? Ou só está preocupada em realizar outros sonhos antes de aproveitar esse?
Eu o encarei seriamente pela primeira vez desde que aquela estranha conversa começou. Suas palavras tocaram em pontos sensíveis dentro de mim, eu sabia que na verdade ele tinha razão, que minhas preocupações apesar de fundamentadas me atrapalhavam de viver as experiências prazerosas da vida.
Aquela tinha sido a primeira vez que eu tinha me permitido sair sem o celular para checar os e-mails de trabalho. Tinha sido a primeira vez que eu tinha dormido sem me preocupar com o horário de acordar. Tinha sido a primeira vez que eu aceitava conversar com alguém que não conhecia sem sair correndo. Tinha sido a primeira vez em muito tempo que senti que estava vivendo.
- Você está certo.
- Então vamos para a Califórnia comigo amanhã.
- Eu só concordei com você não perdi a cabeça ainda, desista dessa ideia maluca.
- Então vamos mergulhar, ou nem isso consegue fazer?
Antes que pudesse responder me vi sendo puxada por sua mão enroscada na minha. A risada dele me contagiava e me via rindo muito alto, sentindo a brisa em meus cabelos e a areia macia nos pés, as luzes da cidade ao nosso redor, ria cada vez mais sem conseguir controlar.
Gritei quando senti a água gelada tocar meus pés. Tentei voltar para areia e fugir do frio que percorria meu corpo, mas fui impedida pelos braços dele que rodeavam minha cintura. Joguei todo o peso do meu corpo contra ele, fazendo-o cair na água gelada. Ele, revidando, puxou minhas pernas fazendo com que eu caísse também.
- O som do seu riso é engraçado, gostei de ouvir você rir assim. Antes de te ver assim eu te achei bonita, agora é mais do que isso. – Ele dissera.
- Eu vou pra Califórnia com você.
As palavras escaparam sem que eu houvesse planejado. Logo após dizê-las, percebi que queria ir para Califórnia desde o momento que ele propôs aquela ideia idiota. Percebi que queria fazer algo novo, algo que não houvesse planejado simples e por puro prazer. Algo que me desse uma sensação de medo e ansiedade para realizar. Notei que queria ir para Califórnia até mesmo sem ele, mas preferia ter sua companhia para me lembrar de viver o momento e não um depois utópico.
Ele me encarou sorrindo. Tocou mais uma vez os meus cabelos brincando com eles em seus longos dedos. Me deu um leve beijo nos lábios. Um beijo com gosto de mar, aventura e agora.
- Obrigada. A propósito, meu nome é Eduardo.