Você não tem o direito
[Continuação de "Seis Meses Depois"]
Marsha ficou um tanto surpresa quanto Cindy telefonou perguntando se poderia vê-la. As duas tinham travado algumas conversas interessantes durante os dois dias do Pink Lid, e perceberam que possuíam pontos em comum, embora as personalidades fossem bastante diferentes. Mas, decorridos seis meses do evento, o contato só fora retomado após um encontro fortuito. O que Cindy queria discutir com ela? A resposta não foi assim tão surpreendente.
- O que nós tínhamos em comum naquele momento, foi a certeza de que não nos interessava entrar num relacionamento apenas para dar uma satisfação às nossas famílias... ou porque outras garotas da nossa idade estavam fazendo o mesmo - principiou Cindy.
- Dizer que está se guardando para o casamento é um método garantido para afugentar pretendentes indesejados - ironizou Marsha.
- Não que não existam rapazes interessantes que possam aceitar esta condição - ponderou Cindy. - Mas surgiu alguém na minha vida que, definitivamente, não soube esperar... e eu fico pensando se deveria dar a ele o benefício da dúvida.
- Na sociedade em que vivemos, mulheres que se guardam para o casamento são valorizadas, - avaliou Marsha - mas o mesmo não é exigido dos homens. Isso é injusto? É. Mas as coisas funcionam assim. O fato do seu pretendente já ter feito sexo, em princípio, não deveria desqualificá-lo. Se for somente isso...
Cindy baixou os olhos, encabulada.
- Ele tem um filho.
- Aí é mais complicado.
A conversa das duas transcorria na sala da casa de Marsha, num sábado à tarde. A anfitriã ergueu-se e chamou a visita:
- Eu vou fazer um café. Vamos para a cozinha?
Cindy acompanhou-a.
- Você já transou? - Indagou Marsha à queima-roupa, enquanto colocava água na cafeteira.
- Não! - Exclamou Cindy, corando até a raiz dos cabelos.
- Desculpe... não quis ser intrometida - alegou Marsha.
- Eu sei... mas não... não fiz.
- Certo. Então imagino que o seu medo seja o de começar um relacionamento com esse rapaz e acabar do mesmo jeito que a sua antecessora?
- Se ele não esperou com ela...
- Lembre-se: você não é ela - atalhou Marsha, colocando pó na cafeteira.
* * *
Vanessa segurava no colo o filho Nicholas, um bebê de dois anos, quando Ted entrou no apartamento.
- O papai chegou - disse Vanessa, estendendo-o para Ted, que o pegou nos braços e começou a beijá-lo, arrancando risos da criança.
- Você demorou - comentou Vanessa, pegando as bolsas de supermercado que ele trouxera.
- Hoje foi dia de inventário... tive que ficar até o final. Mas trouxe tudo o que pediu... - justificou-se ele, sentando-se num sofá com o bebê nos braços.
- Estava esperando você para o almoço... bom, vou fazer o seu prato. Quer tomar um banho primeiro?
- Boa ideia. Ajeite a mesa enquanto tomo um banho...
Meia hora depois, estavam os dois frente à frente na mesa da copa do apartamento. Vanessa já havia almoçado, mas ficou ali com o bebê, para fazer companhia à Ted. Ele não gostava de comer sozinho.
- Isso está bom - elogiou ele, servindo-se de mais batatas coradas.
- Se quiser, faço mais para o jantar - sugeriu ela.
Ted a encarou, subitamente sério.
- Eu não vou dormir aqui, Vanessa...
Ela começou a embalar o bebê, tentando disfarçar a decepção.
- Eu pensei...
- Vim só trazer as coisas do Nicholas - atalhou Ted. - Aliás, seria melhor que, daqui por diante a gente se visse somente como pais do Nicholas... já não estamos mais juntos, mesmo.
- Mas eu voltei a transar com você porque achei que quisesse voltar... - retrucou ela, em desespero.
- E eu achei que você quisesse transar porque estava se sentindo só... e eu também estava só... e a gente juntava a nossa solidão. Mas isso não é o mesmo que dizer que tínhamos voltado - argumentou ele.
- Mas que droga é essa! - Exclamou Vanessa. - Você vem à minha casa e me diz que eu queria transar com você porque estava só! Você não tem esse direito! Nós temos um filho!
- Então, agora você já sabe: da próxima vez em que eu vier aqui, vai ser apenas por causa dele - respondeu Ted, erguendo-se da mesa. Curvou-se sobre o bebê, beijou seu rosto e comentou antes de sair:
- O almoço estava excelente, obrigado.
[Continua em "Ilusões de romance"]
- [04-06-2018]