O sol bateu em seus olhos, fazendo-a piscar várias vezes enquanto desviava o olhar para trás. Adélia se aproximava, saltando troncos e pedras com dificuldade.
- Vou te deixar para trás. – Ameaçou sorridente.
- Você que não se atreva. – Adélia a lançou um olhar como se quisesse dizer “você vai se arrepender se fizer isso”.
- É claro que não vou fazer. – Estendendo a mão e a ajudando a subir um pequeno morro.
Adélia olhou para a mata ao redor, árvores altas a cercavam por todos os lados, cipós se penduravam, movendo-se lentamente ao ritmo do vento. O verde ao seu redor era intenso e o ar fresco.
- É lindo, não é? – Disse Valéria, olhando um pássaro pequeno sobre uma árvore à sua direita. – Eu vinha aqui quando era pequena.
- Com o seu pai, não é?
Ela assentiu.
- E o que vocês faziam?
- Andavámos, mas eu preferia sentar na cachoeira.
- É para lá que você está me levando?
- É. Vamos, falta pouco agora.
Valéria seguia um pouco a frente, olhando tudo ao seu redor com ar saudosista. Adélia viu uma aranha enorme deslizar as patas peludas pela teia, caminhando lentamente até um inseto preso. Cerrou o maxilar rapidamente e apertou os passos. O som do canto dos pássaros e de água correndo eram os únicos sons ali.
Adélia desviou o olhar para a copa de uma das árvores, o sol deixava as folhas com um tom de verde-dourado, e enroscou o pé em um galho fino de uma planta rasteira. Suas mãos acertaram o chão com força e sentiu como se tivesse tomado um choque em um dos punhos.
- Você está bem? – Perguntou Valéria, se aproximando.
- Estou. – Sentando-se. – Acho que abri o pulso de novo. – Segurando a mão ferida.
- “Tá” doendo muito?
- Não, eu aguento. – Se colocando em pé. – Quero ver a cachoeira.
- Tem certeza?
- Absoluta, vamos logo.
Valéria abriu um ligeiro sorriso e elas voltaram a caminhar. O barulho da água correndo ficava cada vez mais alto. Valéria a abraçou e beijou seu rosto. O topo da cachoeira apontou e Adélia esqueçou a dor no punho, encanrando-a maravilhada. Uma cascata de água cristalina despencava em uma queda de pelo menos cinco metros de altura.
- É linda! . – Disse Adélia, olhando para a queda d’água da borda de um pequeno barranco.
- Eu disse que era. – Sorrindo.
- É você disse. – Sem olhá-la.
Adélia desviou o olhar para a lágoa em forma de um círculo irregular, as pedras ao redor e no fundo tinham um tom escuro. Uma fenda estreita permitia que a água continuasse seu trajeto.
Valéria saltou o barranco e estendeu a mão, ajudando-a a descer. Se sentaram em uma rocha comprida, de um cinza pálido, as margens da lágoa e ficaram em silêncio.
- Está pensando no seu pai? – Perguntou Adélia, olhando-a rapidamente.
- É. Não tem como vir até aqui e não pensar nele.
- Vocês eram muito próximos, não eram?
- Muito.
- Queria ter conhecido o meu. – Olhando para frente com o olhar entristecido.
- Quem perdeu foi ele. Ele não faz ideia da filha maravilhosa que tem. – Ficando de frente para ela e beijando rapidamente sua boca.
Valéria colocou uma mecha do cabelo da namorada atrás de sua orelha, encando-a.
- Eu tenho sorte, sabia? – Continuou;
- E todas as vezes que disse que jogou pedra na cruz para ter me merecido?
- Eu não falava sério. – Sorrindo.
- Talvez eu acredite.
- Quer que eu te convença? – Com o olhar malicioso.
Valéria apoiou as mãos no chão ao lado do corpo dela, obrigando-a a se inclinar para trás.
- É melhor não começarmos. – Disse Adélia, com um pequeno sorriso.
- Tem razão.
A beijou mais uma vez e voltou a se sentar ao seu lado.
- Meu irmão chega de viagem na terça. – Disse Valéria.
- Ele não ia voltar no ano que vem? – Abraçando as pernas e olhando-a.
- Pois é, ele disse que explicava tudo quando voltasse.
- E o que sua mãe disse?
- Tentou obrigá-lo a falar pelo telefone. – Esboçando um sorriso. – Você conhece a peça.
Adélia olhou para o alto e viu uma nuvem escura se aproximando.
- É melhor irmos embora, vai chover.
- Essa nuvem é passageira.
- Não quero arriscar, vamos embora. – Olhando-a preocupada.
- Não vai chover. Vamos aproveitar mais um pouco, quase não conseguimos ficar sozinhas.
- Não sei não.
- Se começar a pingar nós vamos embora na mesma hora, está bem assim?
- Tudo bem.
Adélia cerrou o maxilar ao olhar para a nuvem. Não parecia uma boa ideia permanecer ali. Um trovão ecoou estrondoso.
- Vamos embora! – Gritou, se levantando com um salto.
Em questão de segundos uma chuva torrencial começou a cair e uma avalanche de água despencou pela cachoeria, arrastando-as.
Valéria emergiu vários metros de onde estava segunrando o tronco estreito de uma árvore comprida. A correnteza era forte e ela lutava para manter o nariz e a boca sobre as águas. Não via qualquer sinal da namorada.
- Adélia! – Gritou, procurando-a desesperadamente. – Adélia!
Um silêncio tenso e pavaroso ímperou antes que ela voltasse a chamar pelo seu nome. Adélia surgiu poucos metros a sua frente. Segurava um cipó preso ao barraco e sangue escorria em sua testa.
- Valéria! – Gritou sem conseguir enxeguar direito e engoliu uma quantidade generosa de água.
- Eu estou aqui. Vou te buscar não se preocupe.
- Eu não consigo sair daqui. – A voz embargada pelas lágrimas.
- Consegue, eu te ajudo. Confia em mim.
Valéria percorreu o cipó com o olhar e percebeu que ele se extendia até bem próximo de onde ela estava.
- Eu preciso que você fique calma e me escute. Se você seguir o cipó eu consigo te pegar.
- Eu não consigo!
- Consegue sim.
A correnteza a engoliu, porém voltou a emergir logo depois.
- Eu sei que você está com medo e eu também estou, mas você precisa vir, por favor. – Continuou.
Valéria olhou rapidamente para o tronco que segurava antes de voltar a falar.
- Venha.
- Tudo bem.
Adélia agarrou o cipó um pouco acima, a correnteza estava forte demais.
- Isso, você consegue. – Vendo seu esforço.
Valéria soltou uma das mãos do tronco e se esticou toda. Adélia tocou a ponta de seus dedos, mas acabou escorregando e quase foi arrastada mais uma vez. Valéria se esticou ainda mais e quando estava prestes a agarrá-la o tronco que segurava se partiu. Adélia tentou segurá-la, mas seu esforço foi inútil.
- Valéria! – Gritou tão alto que seus pulmões arderam.
Não via qualquer sinal dela. Valéria havia desaparecido em meio as águas.
- Você precisa seguir sua vida, já faz quase um ano que ela desapareceu. – Disse Alana, sua irmã mais nova, sentando-se em sua frente.
Adélia olhava para a janela da cozinha com o olhar perdido.
- Você não escutou uma palavra do que eu disse, não foi? – Dando uma mordida no seu sanduíche.
- Não. – Sem olhá-la.
- Desde o acidente você está assim, distante, perdida.
Adélia encarou a tampa de granito da mesa.
- Talvez porque é assim que eu me sinto.
- Você precisa seguir sua vida.
- Não quero seguir nada. – Se levantando com um movimento brusco.
- Aonde você vai?
- Ficar sozinha em paz.
A porta se fechou com um baque.
Circulava cabisbaixa pelas ruas, lembranças de Valéria pipocavam em sua cabeça. Dobrou a esquina e esbarrou com uma mulher.
- Desculpe. – Disse sem olhá-la e continuou a caminhar.
- Adélia.
Ela congelou, conhecia aquelas voz. Se virou, mas a mulher já havia desaparecido. Tinha sido apenas sua imaginação. Abriu um ligeiro sorriso entristecido.
- Adélia. – Ouviu a mesma voz, mas dessa vez não deu atenção.
Sentiu um puxão no seu braço, fazendo-a se virar.
- Sabia que era você. – Com um pequeno sorriso.
- Valéria! – Parecia estar vendo um fantasma.
- Desculpe não ter te procurado antes. Não lembrava de nada depois do acidente e minha mãe não fez questão alguma de me contar sobre você.
- Você está vida! – Foi tudo o que conseguiu dizer.
A abraçou com força, precisava sentir que era real.
- Eu é que tenho sorte por ter você. – Disse Adélia, segurando seu rosto.
Valéria sorriu.
- Eu lembro quando falei isso.
Adélia aproximou seu rosto e a beijou.
- Vou te deixar para trás. – Ameaçou sorridente.
- Você que não se atreva. – Adélia a lançou um olhar como se quisesse dizer “você vai se arrepender se fizer isso”.
- É claro que não vou fazer. – Estendendo a mão e a ajudando a subir um pequeno morro.
Adélia olhou para a mata ao redor, árvores altas a cercavam por todos os lados, cipós se penduravam, movendo-se lentamente ao ritmo do vento. O verde ao seu redor era intenso e o ar fresco.
- É lindo, não é? – Disse Valéria, olhando um pássaro pequeno sobre uma árvore à sua direita. – Eu vinha aqui quando era pequena.
- Com o seu pai, não é?
Ela assentiu.
- E o que vocês faziam?
- Andavámos, mas eu preferia sentar na cachoeira.
- É para lá que você está me levando?
- É. Vamos, falta pouco agora.
Valéria seguia um pouco a frente, olhando tudo ao seu redor com ar saudosista. Adélia viu uma aranha enorme deslizar as patas peludas pela teia, caminhando lentamente até um inseto preso. Cerrou o maxilar rapidamente e apertou os passos. O som do canto dos pássaros e de água correndo eram os únicos sons ali.
Adélia desviou o olhar para a copa de uma das árvores, o sol deixava as folhas com um tom de verde-dourado, e enroscou o pé em um galho fino de uma planta rasteira. Suas mãos acertaram o chão com força e sentiu como se tivesse tomado um choque em um dos punhos.
- Você está bem? – Perguntou Valéria, se aproximando.
- Estou. – Sentando-se. – Acho que abri o pulso de novo. – Segurando a mão ferida.
- “Tá” doendo muito?
- Não, eu aguento. – Se colocando em pé. – Quero ver a cachoeira.
- Tem certeza?
- Absoluta, vamos logo.
Valéria abriu um ligeiro sorriso e elas voltaram a caminhar. O barulho da água correndo ficava cada vez mais alto. Valéria a abraçou e beijou seu rosto. O topo da cachoeira apontou e Adélia esqueçou a dor no punho, encanrando-a maravilhada. Uma cascata de água cristalina despencava em uma queda de pelo menos cinco metros de altura.
- É linda! . – Disse Adélia, olhando para a queda d’água da borda de um pequeno barranco.
- Eu disse que era. – Sorrindo.
- É você disse. – Sem olhá-la.
Adélia desviou o olhar para a lágoa em forma de um círculo irregular, as pedras ao redor e no fundo tinham um tom escuro. Uma fenda estreita permitia que a água continuasse seu trajeto.
Valéria saltou o barranco e estendeu a mão, ajudando-a a descer. Se sentaram em uma rocha comprida, de um cinza pálido, as margens da lágoa e ficaram em silêncio.
- Está pensando no seu pai? – Perguntou Adélia, olhando-a rapidamente.
- É. Não tem como vir até aqui e não pensar nele.
- Vocês eram muito próximos, não eram?
- Muito.
- Queria ter conhecido o meu. – Olhando para frente com o olhar entristecido.
- Quem perdeu foi ele. Ele não faz ideia da filha maravilhosa que tem. – Ficando de frente para ela e beijando rapidamente sua boca.
Valéria colocou uma mecha do cabelo da namorada atrás de sua orelha, encando-a.
- Eu tenho sorte, sabia? – Continuou;
- E todas as vezes que disse que jogou pedra na cruz para ter me merecido?
- Eu não falava sério. – Sorrindo.
- Talvez eu acredite.
- Quer que eu te convença? – Com o olhar malicioso.
Valéria apoiou as mãos no chão ao lado do corpo dela, obrigando-a a se inclinar para trás.
- É melhor não começarmos. – Disse Adélia, com um pequeno sorriso.
- Tem razão.
A beijou mais uma vez e voltou a se sentar ao seu lado.
- Meu irmão chega de viagem na terça. – Disse Valéria.
- Ele não ia voltar no ano que vem? – Abraçando as pernas e olhando-a.
- Pois é, ele disse que explicava tudo quando voltasse.
- E o que sua mãe disse?
- Tentou obrigá-lo a falar pelo telefone. – Esboçando um sorriso. – Você conhece a peça.
Adélia olhou para o alto e viu uma nuvem escura se aproximando.
- É melhor irmos embora, vai chover.
- Essa nuvem é passageira.
- Não quero arriscar, vamos embora. – Olhando-a preocupada.
- Não vai chover. Vamos aproveitar mais um pouco, quase não conseguimos ficar sozinhas.
- Não sei não.
- Se começar a pingar nós vamos embora na mesma hora, está bem assim?
- Tudo bem.
Adélia cerrou o maxilar ao olhar para a nuvem. Não parecia uma boa ideia permanecer ali. Um trovão ecoou estrondoso.
- Vamos embora! – Gritou, se levantando com um salto.
Em questão de segundos uma chuva torrencial começou a cair e uma avalanche de água despencou pela cachoeria, arrastando-as.
Valéria emergiu vários metros de onde estava segunrando o tronco estreito de uma árvore comprida. A correnteza era forte e ela lutava para manter o nariz e a boca sobre as águas. Não via qualquer sinal da namorada.
- Adélia! – Gritou, procurando-a desesperadamente. – Adélia!
Um silêncio tenso e pavaroso ímperou antes que ela voltasse a chamar pelo seu nome. Adélia surgiu poucos metros a sua frente. Segurava um cipó preso ao barraco e sangue escorria em sua testa.
- Valéria! – Gritou sem conseguir enxeguar direito e engoliu uma quantidade generosa de água.
- Eu estou aqui. Vou te buscar não se preocupe.
- Eu não consigo sair daqui. – A voz embargada pelas lágrimas.
- Consegue, eu te ajudo. Confia em mim.
Valéria percorreu o cipó com o olhar e percebeu que ele se extendia até bem próximo de onde ela estava.
- Eu preciso que você fique calma e me escute. Se você seguir o cipó eu consigo te pegar.
- Eu não consigo!
- Consegue sim.
A correnteza a engoliu, porém voltou a emergir logo depois.
- Eu sei que você está com medo e eu também estou, mas você precisa vir, por favor. – Continuou.
Valéria olhou rapidamente para o tronco que segurava antes de voltar a falar.
- Venha.
- Tudo bem.
Adélia agarrou o cipó um pouco acima, a correnteza estava forte demais.
- Isso, você consegue. – Vendo seu esforço.
Valéria soltou uma das mãos do tronco e se esticou toda. Adélia tocou a ponta de seus dedos, mas acabou escorregando e quase foi arrastada mais uma vez. Valéria se esticou ainda mais e quando estava prestes a agarrá-la o tronco que segurava se partiu. Adélia tentou segurá-la, mas seu esforço foi inútil.
- Valéria! – Gritou tão alto que seus pulmões arderam.
Não via qualquer sinal dela. Valéria havia desaparecido em meio as águas.
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- Você precisa seguir sua vida, já faz quase um ano que ela desapareceu. – Disse Alana, sua irmã mais nova, sentando-se em sua frente.
Adélia olhava para a janela da cozinha com o olhar perdido.
- Você não escutou uma palavra do que eu disse, não foi? – Dando uma mordida no seu sanduíche.
- Não. – Sem olhá-la.
- Desde o acidente você está assim, distante, perdida.
Adélia encarou a tampa de granito da mesa.
- Talvez porque é assim que eu me sinto.
- Você precisa seguir sua vida.
- Não quero seguir nada. – Se levantando com um movimento brusco.
- Aonde você vai?
- Ficar sozinha em paz.
A porta se fechou com um baque.
Circulava cabisbaixa pelas ruas, lembranças de Valéria pipocavam em sua cabeça. Dobrou a esquina e esbarrou com uma mulher.
- Desculpe. – Disse sem olhá-la e continuou a caminhar.
- Adélia.
Ela congelou, conhecia aquelas voz. Se virou, mas a mulher já havia desaparecido. Tinha sido apenas sua imaginação. Abriu um ligeiro sorriso entristecido.
- Adélia. – Ouviu a mesma voz, mas dessa vez não deu atenção.
Sentiu um puxão no seu braço, fazendo-a se virar.
- Sabia que era você. – Com um pequeno sorriso.
- Valéria! – Parecia estar vendo um fantasma.
- Desculpe não ter te procurado antes. Não lembrava de nada depois do acidente e minha mãe não fez questão alguma de me contar sobre você.
- Você está vida! – Foi tudo o que conseguiu dizer.
A abraçou com força, precisava sentir que era real.
- Eu é que tenho sorte por ter você. – Disse Adélia, segurando seu rosto.
Valéria sorriu.
- Eu lembro quando falei isso.
Adélia aproximou seu rosto e a beijou.