Paraíso

Dizem, que foi uma tramoia de Lúcifer que me desvairou o coração. Essa coisa demoníaca que é amar um outro homem. Essa afronta à natureza. Não escolhi ter esse desvio, não quero essa perturbação na minha alma. Preciso de ajuda, de cura. Estou doente! Desde que me conheço por gente, tenho essa inclinação, e não consigo entender, não consigo explicar. Sempre luto contra meus instintos, meus sentimentos, é um erro querer ser feliz como eu sou. Eu preciso de Deus, meus anjos são fracos. Há uma disfunção na minha natureza. Não tenho virtude. Não é possível que isso seja normal. Eu sou um ser racional, eu posso escolher o que fazer da minha vida. Paixões tão nervosas me estremecem, me inspiram coragem; e amores impossíveis não existem, eles perecem!

E foi assim que fugi da realidade. Homem e mulher foram criados até que a morte os separem, foi a profecia. Mas mesmo respirando eu já morri. Estou preso em uma pele falsa, essa couraça camuflagem. Sou fruto do discurso alheio, renegando minha essência. Há um trem que me persegue. E não há outros trilhos que eu possa seguir. Eu não consigo mudar a cor dos meus olhos. Até tentei usar lentes, mas elas atrapalhavam a minha visão. Sou areia movediça de mim, um brejo. Finalmente, reencontro a medusa que me assombra. Essa paixão desenfreada quando olho seus olhos tão firmes. Essa maçã tão madura oferecida pela serpente do jardim. Decido me entregar, me arriscar, me permitir... Finalmente me sinto vivo, feliz. Sorrio por pouco, bobamente. Traço planos para o futuro. Estou leve!

O tempo passa, mas para quando estou ao teu lado. E mesmo já com uma história e muita esperança, mesmo sendo teu parceiro e companheiro os teus próximos ainda me querem distante. Mas eu aguento os socos no estômago que a vida me dá, eu perco o ar, mas aprendi a respirar debaixo de tempestades. Todo dia acordo sabendo que vou desbravar o mundo. Empunho espadas tão pesadas, mas luto, luto, luto. Por vezes caio, mas me reergo. Não sei mais me fechar à felicidade. Eu abri o coração e lavei a alma para seguir sempre em frente. Os sussurros, os deboches, os julgamentos se fazem flechas e eu o alvo. Não vou mentir que não tenho medo, mas não vou omitir que alimentei uma coragem absurda dentro de mim só para te ter comigo. São tanto diabos que preciso driblar...

Um beijo de despedida, o último. Nosso futuro tão incerto se extinguiu em dois minutos. Um beijo foi o culpado do seu último suspiro. Essa coisa diabólica, dois lábios que se encostam. Os anjos cantaram, e seu pai tentando te proteger, te consertar, acabou por te matar. Mesmo respirando, você já está morto. Teu próprio pai, assim cheio de amor por ti. E não há faca ensanguentada. Apenas palavras e atitudes tão certeiras e tão mortíferas. Enquanto sua mãe assistia desolada, calada como a mulher deve ser. É que viado desonra o nome da família; por isso não temos nomes. Nossa identidade é pisada, e não basta trabalhar, pagar as contas e ter bom coração. Não, não basta! – gritam. Uma caixa de remédios foi seu desespero na tentativa de se curar. E se curou!

E eu que tarde aprendi a ser corajoso me vi de repente como um menino abandonado, inseguro, sem rumo. Cadê você? Me dá sua mão, não me deixa aqui sozinho. Percebi que era você quem me inspirava a seguir em frente. Mas você foi embora. Eu aguentei tanta coisa tentando ser feliz contigo, tanta coisa me doeu. Eu disse que iria contigo aonde você fosse. Eu prometi. Não nos apontaram arma nenhuma, apenas os dedos. Mas sem você não vou aguentar mais. Estou subindo até o décimo andar para tentar te alcançar, me espera, um anjo me disse que eu poderia voar... E se fomos pecadores por nos amar, estou indo para o inferno te encontrar... Te amo!

Rodrigo Amoreira
Enviado por Rodrigo Amoreira em 07/04/2018
Código do texto: T6302168
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