Uma paixão adolescente
Aquele garoto vibrava profundamente meu coração. Meu primeiro e último pensamento do dia era ele. Sempre trocávamos olhares no colégio, apesar de nunca termos nos falado. Seus olhos eram de um tom castanho-escuro, assim como os cabelos, e pareciam guardar um mistério encantador. Como fui me apaixonar por alguém da qual nunca dirigi uma palavra? Às vezes eu tinha a impressão de que ele também sentia algo por mim, mas logo pensava que poderia ser ilusão minha. Talvez ele só tenha me notado porque percebia que eu procurava-o muito com o olhar e que frequentemente estava no mesmo ambiente do que ele.
Ah!, como eu gostaria de ao menos conversar com ele. Porém, eu não tinha coragem de tomar a iniciativa. Se nós estudássemos na mesma turma poderia ser mais fácil. Ou não. Mesmo não tendo a certeza de que nos aproximaríamos se isto acontecesse, eu torcia para que no próximo ano o diretor nos colocássemos na mesma classe.
Esse garoto me pertencia em pensamento. Á noite, quando eu me deitava para dormir, sempre nos imaginávamos numa troca de beijos e de carícias. Eu também adorava colocar meus fones de ouvido e ouvir músicas que me faziam lembrar ainda mais dele, do seu olhar e do seu sorriso. Bem, porque eu não poderia sonhar com a possibilidade de que em um belo dia a vida, ao "acaso", nos colocaria frente a frente, ou melhor ainda, permitisse que ficássemos juntos?
Havia um porém: as férias do final de ano estavam chegando e nos restavam apenas mais 5 dias de aula. Sim, eu realmente não gostaria que as férias chegassem. E para aumentar minha tristeza, me chegou a notícia de que o garoto não iria mais para a escola na última semana e, pior, que não iria mais estudar no colégio porque logo mudaria de cidade. Fiquei tão triste! E me senti ao mesmo tempo muito culpada. Se eu não fosse tão travada poderíamos ao menos termos trocado umas palavras e eu ter desfrutado pelo menos um pouquinho de sua companhia; e quem sabe formado um casal? Mas agora minhas esperanças haviam se esvaído.
Eu procurava afazeres e hobbies para me distrair em casa. No entanto, ler e assistir filmes eram apenas alívios temporários da minha dor, e às vezes eles ainda a intensificavam no momento em que eu lia ou assistia algo sobre o amor. Ah!, como eu gostaria de vê-lo novamente, para poder enfim abraçá-lo e sentir a textura e o calor de sua pele!
Na segunda semana de férias recebi um convite de uma amiga mais velha para comparecer à sua festa de formatura do ensino médio. Eu pelo menos iria me distrair com algo diferente, pensei. No dia da festa vasculhei meu guarda-roupa e encontrei meu vestido de cor verde, minha cor predileta, que tanto adorava. Estava um pouco apertado em minha cintura, mas mesmo assim o usei.
No início da festa fiquei meio deslocada, porém após a abertura do baile me senti mais animada. Corri para a pista de dança com minha amiga, que me apresentou aos seus amigos. Estavam tocando muitas músicas que fizeram sucesso no ano, das quais eu gostava muito. Mesmo ali, eu pensava no garoto e tinha momentos de tristeza que tentava repelir ao me concentrar nos passos de dança. Depois de aproximadamente meia hora, começou a tocar uma música que eu achava muito linda e que me lembrava dele. De súbito, tive vontade de chorar. Na tentativa de afastar a emoção, eu virei o rosto para observar as pessoas e os jeitos como elas dançavam. Até que um garoto me chamou a atenção. Não dava para reparar muito nos rostos devido às luzes coloridas, porém eu sabia que aquele lhe era familiar. Observei melhor e ... eu não estava acreditando no que via! Era ele! Minha paixão!
Fiquei paralisada de surpresa, observando ele se deslocar lentamente até uma rodinha de amigos perto de mim. Voltei a dançar, mas eu não sabia o que eu fazia. Será que seria sensato eu ir até lá para se juntar com a turma, e talvez dançar com ele? Tentei chamar a sua atenção ao encará-lo diversas vezes, até que começamos a trocar olhares. Que emoção! Depois de alguns minutos com os hormônios à flor da pele, começou a tocar uma música da qual exigia par para dançar. O garoto estava chegando em meu grupinho, olhou para mim e me convidou para dançar. Um imenso nervosismo e felicidade tomou conta de mim e o respondi com um “sim” trêmulo.
Foi maravilhoso sentir suas mãos segurarem delicadamente minha cintura, enquanto eu pousava as minhas em seus ombros esguios. Seu cheiro me trazia uma sensação de conforto e proteção, e naquele momento apenas desejei ficar ali para sempre. Repousei minha cabeça em seu tórax, e levei um susto ao reparar que meu vestido estava com um rasgado enorme na cintura! Eu não deveria ter colocado aquele vestido, estava apertado em mim! O garoto percebeu minha preocupação, olhou bem em meus olhos e pediu para acompanhá-lo.
O lugar em que ele me levou era uma sala mal iluminada, onde eu pude perceber a existência de um guarda-roupa e de um armário. Deve ser o “achados e perdidos”, pensei. Então instintivamente comecei a abrir as gavetas e as portas à procura de uma peça melhor para me vestir, até que eu vi num cabide um lindo vestido de princesa com bordados de prata que reluziam, mesmo na penumbra da sala. Fiquei mais feliz ainda quando consegui reconhecer que ele tinha a coloração verde. No mesmo cabide do vestido, estavam pendurados colares, anéis e brincos de pedras brilhantes. Eu usei tudo. O garoto disse: " Você está linda!" e, depois que senti meu rosto enrubescer, ele entrelaçou sua mão com a minha e me levou de volta até a pista de dança, em um canto mais reservado. Novamente, estava tocando uma música romântica. Ele tomou a palavra:
- Eu reparava muito em você no colégio, mas nunca tive a coragem de ir falar com você. Posso não parecer, mas realmente sou tímido.
- Eu digo o mesmo.
Ele sorriu. Eu estava muito feliz em tê-lo comigo e em ter ouvido aquelas palavras.
- Pena que você irá se mudar de cidade, né?
- Quem lhe disse isso?
- Ah ... – me senti subitamente desconcertada – uma amiga me contou.
- Eu iria porque meu pai foi chamado para trabalhar em outra cidade, mas por sorte surgiu outra ótima oportunidade para ele aqui mesmo.
Tentei disfarçar a felicidade descontrolada que tomou conta de mim com um sorriso discreto. Dançamos mais um pouco, bem juntinhos, até que ele tornou a falar:
- Sabe que eu sempre sonhei com um momento como esse com você? Sei que pode parecer estranho ... pelo fato de nunca termos nos falado antes, mas ... sou apaixonado por você.
Dessa vez, foi impossível disfarçar o quanto fiquei feliz. Um sorriso se abriu em meu rosto, de orelha a orelha. Pude sentir que meus olhos estavam brilhando, e reparei que os seus me fitavam com intensidade. Arrepios perpassaram pelo meu corpo. A emoção que senti era tão forte que não consegui proferir palavra alguma. Oh!, quanto desejei este momento! Depois de alguns segundos, ele começou a inclinar seu rosto lentamente até o meu, enquanto sua mão direita afagava carinhosamente minha nuca. Seria o primeiro beijo da minha vida! E para melhorar, com a pessoa que eu mais gostaria que isso acontecesse! A sua boca naquele instante já estava a um fio de distância da minha. Fechei os olhos.
De repente, abri os olhos rapidamente. Eu estava no escuro da noite em meu quarto, deitada em minha cama. Mas eu não estava na festa? Cadê o garoto dos meus sonhos? Não está aqui comigo, e certamente também nunca estará. Fiquei repentinamente triste e agonizada. Fora tudo um sonho.