Arualdo ouvia tudo que se passava no Céu e na Terra, mas ainda não sabia discernir o que provinha de um ou do outro lugar. Percebendo que o discípulo não compreendera, padre Davi explicou:
— O que viste e ouviste foi a recepção de chegada de Generoso no céu. —Aquele engenho é real?
— Queres dizer o alambique? Vá lá, sirva-se. Mas não pense que vais ficar bêbedo. O que beberes aqui, vai curar o mal provocado por aquela que bebeste na terra.
Generoso refletia sobre dançar ao som da música que toca o Bom Pastor.
— Se dancei ao som da música que tocaste, gostaria de uma contradança com uma rosa que deixei no Plante Azul.
— Cumpriste tua missão — disse o Tocador de Flauta que também acendia o lampião.
— Viste Corina por onde andaste, meu Senhor?
— Guardei tua amada para o último dia. Agora venha participar do banquete.
— Corina é você?...
— Meu Cravo, conta-me como foi tua passagem?
— Vi uma luz no fim do túnel e me aproximei dela. O acendedor de Lampião estava à minha espera. Inicialmente, assustei-me ao ver aquele corpo chagado, e sobre a cabeça, uma coroa de espinhos.
— Acendedor de Lampião... Tocador de Flauta...Aquele que traz Luz e melodia para o mundo. Fui também recepcionada por ele. E pela Virgem Imaculada de quem sempre fui devota.
— As pessoas o conhecem por muitos nomes. Cordeiro de Deus, Acendedor de Lampião... E Tocador de Flauta porque... Bem, o tocador de flauta tem seguidores que o acompanham para ouvi-lo.
—Toca pra mim ‘Saudade de Mirabela?’
— Cadê a viola?
— Zé Coco já vem trazendo!
— Queres uma cena em Campo Grande? Vou juntar o gado — disse Generoso.
— Os vaqueiros já juntaram o gado. Quero ouvir moda de viola no alpendre da fazenda Campo Grande, mas primeiro, toque o berrante e cante toada para o gado ficar tranquilo.
Ê boi, ê boi... ê boi bom cara pintada.
Ê boi, ê boi... Ê boi bom, pega a estrada.
Bôooi...
— Atalho o boi, nego mole!
— Não me interrompa, patrão. Ainda não cantei tudo que aprendi com meu pai.
Outra vez, Xandão toca berrante. Os vaqueiros, aboiam.
Avante, Gracioso!... Arreda, Matreiro!...
Vai Samburá... Arreda, menino,
que a boiada vai passar!
Bôooi!
Evem a boiada de Campo Grande...
Chega, João Velho! — disse Euzébia — já tem muito gado no pátio!
Ê boi, ê boi... ê boi bom cara pintada. Ê boi, ê boi... ê boi bom cara pintada. Bôooi!’
Tunico Oliveira calcula por baixo: mais de quatrocentas reses. Veríssimo confirma. Maximiano fica calado.
— Chamaste tia Du pra o churrasco?
— Qual delas?
— As duas: a mãe de Smith e a Ducarmo Lopes.
— Do Carmo está aí, faz tempo!
— Du não vem. Não larga Zeca pra nada. Diz que estava com muita saudade...
— Por que não vem com o Zeca?
— Eles vão chegar mais tarde, o Zeca está na academia.
— Saudade é coisa que só existe do outro lado.
— É modo de falar.
Du demorou muito a sair de Montes Claros. Não queria largar o Hotel Sonia, ali ela viveu um céu com Zeca, mas ele viajou primeiro...Saiu mas não saiu... Estava sempre por ali recebendo a clientela. Foi preciso que Du dissesse: “Vá meu filho, apresente-se a Jesus. Depois chego lá também. Mas ela demorou uma eternidade. Viveu quase cem anos...Isso no calendário dos homens. No tempo celeste representaria uma fração de hora.
— Saudade é sentimento nobre. Só se sente saudade do que é bom.
— O Pastor sente saudade de suas ovelhas. Vontade de sentir a maciez da lá e do cheiro. Nunca reparaste que ovelha tem cheiro bom?
— Nunca pensei nisso.
Chove lá fora.
— Não sabia que chovia no céu.
— É chuva de bênção.
Corina avisa que a mesa está pronta.
— Eu não tinha sentido fome, desde que cheguei aqui.
— Esqueceste que nos transportamos para Campo Grande, meu Cravo? Hoje é a festa do Vaqueiro. Olha como está cheia a capela que construímos.
— Linda!
— O cruzeiro está tão estragado. Se não fosse de aroeira, não teria resistido tanto tempo.
— Tem mais de mil pessoas.
— Só a descendência de Tião Caburé dá essa quantidade.
— Esqueces que não devemos chamar as pessoas por apelido?
— Ora, minha rosa, estamos em Campo Grande.
— É mesmo.
***
Adalberto Lima, trecho de "Estrela que o vento soprou."
— O que viste e ouviste foi a recepção de chegada de Generoso no céu. —Aquele engenho é real?
— Queres dizer o alambique? Vá lá, sirva-se. Mas não pense que vais ficar bêbedo. O que beberes aqui, vai curar o mal provocado por aquela que bebeste na terra.
Generoso refletia sobre dançar ao som da música que toca o Bom Pastor.
— Se dancei ao som da música que tocaste, gostaria de uma contradança com uma rosa que deixei no Plante Azul.
— Cumpriste tua missão — disse o Tocador de Flauta que também acendia o lampião.
— Viste Corina por onde andaste, meu Senhor?
— Guardei tua amada para o último dia. Agora venha participar do banquete.
— Corina é você?...
— Meu Cravo, conta-me como foi tua passagem?
— Vi uma luz no fim do túnel e me aproximei dela. O acendedor de Lampião estava à minha espera. Inicialmente, assustei-me ao ver aquele corpo chagado, e sobre a cabeça, uma coroa de espinhos.
— Acendedor de Lampião... Tocador de Flauta...Aquele que traz Luz e melodia para o mundo. Fui também recepcionada por ele. E pela Virgem Imaculada de quem sempre fui devota.
— As pessoas o conhecem por muitos nomes. Cordeiro de Deus, Acendedor de Lampião... E Tocador de Flauta porque... Bem, o tocador de flauta tem seguidores que o acompanham para ouvi-lo.
—Toca pra mim ‘Saudade de Mirabela?’
— Cadê a viola?
— Zé Coco já vem trazendo!
— Queres uma cena em Campo Grande? Vou juntar o gado — disse Generoso.
— Os vaqueiros já juntaram o gado. Quero ouvir moda de viola no alpendre da fazenda Campo Grande, mas primeiro, toque o berrante e cante toada para o gado ficar tranquilo.
Ê boi, ê boi... ê boi bom cara pintada.
Ê boi, ê boi... Ê boi bom, pega a estrada.
Bôooi...
— Atalho o boi, nego mole!
— Não me interrompa, patrão. Ainda não cantei tudo que aprendi com meu pai.
Outra vez, Xandão toca berrante. Os vaqueiros, aboiam.
Avante, Gracioso!... Arreda, Matreiro!...
Vai Samburá... Arreda, menino,
que a boiada vai passar!
Bôooi!
Evem a boiada de Campo Grande...
Chega, João Velho! — disse Euzébia — já tem muito gado no pátio!
Ê boi, ê boi... ê boi bom cara pintada. Ê boi, ê boi... ê boi bom cara pintada. Bôooi!’
Tunico Oliveira calcula por baixo: mais de quatrocentas reses. Veríssimo confirma. Maximiano fica calado.
— Chamaste tia Du pra o churrasco?
— Qual delas?
— As duas: a mãe de Smith e a Ducarmo Lopes.
— Do Carmo está aí, faz tempo!
— Du não vem. Não larga Zeca pra nada. Diz que estava com muita saudade...
— Por que não vem com o Zeca?
— Eles vão chegar mais tarde, o Zeca está na academia.
— Saudade é coisa que só existe do outro lado.
— É modo de falar.
Du demorou muito a sair de Montes Claros. Não queria largar o Hotel Sonia, ali ela viveu um céu com Zeca, mas ele viajou primeiro...Saiu mas não saiu... Estava sempre por ali recebendo a clientela. Foi preciso que Du dissesse: “Vá meu filho, apresente-se a Jesus. Depois chego lá também. Mas ela demorou uma eternidade. Viveu quase cem anos...Isso no calendário dos homens. No tempo celeste representaria uma fração de hora.
— Saudade é sentimento nobre. Só se sente saudade do que é bom.
— O Pastor sente saudade de suas ovelhas. Vontade de sentir a maciez da lá e do cheiro. Nunca reparaste que ovelha tem cheiro bom?
— Nunca pensei nisso.
Chove lá fora.
— Não sabia que chovia no céu.
— É chuva de bênção.
Corina avisa que a mesa está pronta.
— Eu não tinha sentido fome, desde que cheguei aqui.
— Esqueceste que nos transportamos para Campo Grande, meu Cravo? Hoje é a festa do Vaqueiro. Olha como está cheia a capela que construímos.
— Linda!
— O cruzeiro está tão estragado. Se não fosse de aroeira, não teria resistido tanto tempo.
— Tem mais de mil pessoas.
— Só a descendência de Tião Caburé dá essa quantidade.
— Esqueces que não devemos chamar as pessoas por apelido?
— Ora, minha rosa, estamos em Campo Grande.
— É mesmo.
***
Adalberto Lima, trecho de "Estrela que o vento soprou."