Entre o céu e o chão - Ilusão - XLIX

Ainda me recordo daquele homem. Era uma noite qualquer de um dia qualquer e de um ano como os outros, ele se aproximou

calmamente de mim como se o vento já tivesse assobrado em seus ouvidos suas futuras tempestades e calmarias. Fitou-me.

Aprisionada em seu olhar coube-me apenas uma interrogação

imprecisa:

- Moço, que "cê" faz da vida?

Ele já havia percebido, ou por motivos desconhecidos já sabia, que minhas asas ainda eram frágeis e que elas ainda não tinham realizado nenhum voo altivo.

- Sou apenas um vivente, moça. Um vivente.

Com sua resposta tão desprovida de ego admirei-o por sua coragem de não tentar ser nada além do que era.

Vestia uma camisa preta e um jeans surrado, carregava consigo cigarros e um coração de poeta. No escuro da noite seguiu seu caminho solitário assobiando suas canções,eu segui o meu perdida entre sua voz e seu violão.

Para minha surpresa, numa manhã seguinte, aquele vivente propôs-me ser linha para que eu pudesse ver o céu do alto. Não tinha a coragem dele, tampouco sabedoria para acompanhar seus passos leves.

Não voei como propunha ele, mas andei a seu lado enquanto

os lobos estavam distraídos.

- Amo -te, menina; dizia -me tão suavemente.

Lamentavelmente ainda recordo que por covardia cortei a linha

que me fazia canção. Ele voou ao céu, aos abismos e ao infinito.

Quando alguém pergunta o que sou ou o que faço ironicamente respondo:

- Sou apenas uma vivente!

Luz de Cristal
Enviado por Luz de Cristal em 03/03/2018
Reeditado em 03/03/2018
Código do texto: T6269685
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.