Amor secreto
Maria se apaixonou quase que a primeira vista. É verdade que não foi nada mágico como poderia ser. Ela não ouviu sinos, nem pássaros cantando, mas se apaixonou mesmo assim e em seu inocente coração viu aquele primeiro amor como algo substancial para a sua vida. É assim que pensam todos os primeiros apaixonados, que aquele primeiro amor será o último. É uma cínica ilusão de que somos diferentes dos demais seres humanos e que nos apaixonaremos uma única vez na vida.
Maria se apaixonou perdidamente. Cada vez que ela o via na estrada seu coração rapidamente disparava, suas mãos soavam e ela tinha dentro de si um misto de vontade que percorria a tênue linha entre sorrir e chorar. Sorrir porque ele olhava para ela e sorria, chorar porque a passagem era tão rápida e lhe faltava tanta coragem para dizer o que sentia que se seguisse naquele ritmo ele jamais saberia que ela o amava.
Ele então traçou um plano perfeito. Ela descobriu o horário com que ele passava, quase que todos os dias, naquela mesma rua e então decidiu deixar para ele bilhetes de amor em cima de um muro. A primeira vez ele não viu. Ela atrás de uma árvore viu quando ele passou pelo bilhete e se foi. No dia seguinte ela colocou um envelope grande, colado com fita no muro e com o nome dele escrito.
Ele viu, era impossível não ver caminhando lentamente até para em frente aquele polposo envelope colado no encardido do muro branco a sua frente e com o seu nome escrito. Ele ficou um instante parado observando, parecia não saber direito o que estava acontecendo. Demorou alguns minutos até decidir abrir o envelope e ao encontrar carta, assinada com “sua admiradora secreta”, e ler ali mesmo encostado ao muro. Depois olhou envolta esperando ver a autora, mas não encontrou ninguém. Ela muito bem escondida foi para casa sorridente naquele dia.
Naquela noite ela sonhou com ele. Foi um daqueles sonhos bobos e românticos. Eles estavam os dois navegando em um pequeno barco a remo. Ele remava sem camisa deixando o peito com os primeiros pelos de sua adolescência amostra, enquanto ela na outra ponta, sentada embaixo de uma sombrinha rosa, sorria para ele e admirava o suor que corria por seu peito e pelo seu rosto. Naquela noite especificamente seu sonho não pareceu tão distante e ela sorriu mesmo dormindo.
No dia seguinte ela fez uma carta ainda mais apaixonada e levou no mesmo muro. Se escondeu atrás da mesma árvore e esperou ele aparecer, mas isso não aconteceu. Ele escolheu outro caminho para ir para casa. Um caminho que ela não conhecia. Então seu coração se despedaçou. Ela chorou, pediu conselhos para as amigas, até que enfim teve uma ideia: Precisa descobrir o seu endereço.
Foi até a frente da escola onde ele estudava e ficou esperando ele sair e então o seguiu. Foi atrás dele até que ele entrou numa casa branca com janelas marrom. Havia uma pequena soleira na frente embaixo dela uma cadeira e ela deixou a carta naquele lugar. Não havia local para se esconder para ver sua reação, então ela foi embora.
No outro dia, em horário diferente ela voltou ao local, ela encontrou uma carta onde havia deixado a sua endereçado à “Minha admiradora secreta”. Ela pegou o envelope que lá estava e deixou um novo. Ao chegar na segurança de seu quarto abriu o envelope e se deparou com um poema escrito a mão. Não havia assinatura, mas ela sabia que ela dele. Ela dormiu abraçada naquela carta.
Nos dias que vieram ela repetiu o ritual. Se deslocava até a frente da casa e lá deixava uma carta e pagava a outra. As que ela mandava tinham verdadeiras declarações de amor, mas as que recebia de volta continham apenas estrofes e versos. Nada pessoal. Nada particular, apenas um poema por vez.
Depois de alguns dias ela encontrou ele em um evento de escola. Ele estava sentado com alguns amigos. Ela caminhou até ele e o encarou. Ele riu, mas desviou o olhar. Ele deve ser tímido ela pensou e então ela foi até ele. Antes que ela pudesse chegar ele levantou e foi embora sem pensar duas vezes e se misturou em meio a outros jovens da sua escola. Ela não conseguiu falar com ele, mas escreveu tudo que sentia na próxima carta e mandou para ele. Foi até dura. Escreveu que o amava, mas que estava cansada de se corresponder e que queria se encontrar pessoalmente com ele. No dia seguinte a resposta estava lá e para sua surpresa e decepção era apenas mais um poema. Um bonito soneto é verdade, mas apenas um soneto e nada mais.
Eis então que ela decidiu que era hora de bater na porta. Ela bateu e para a sua surpresa ele abriu. O que era para você? Ele perguntou. Ela disse poucas e boas. Ele atônito não sabia o que responder. Ela disse que era uma vergonha ele se corresponder com ela por meses e depois fazer de conta não a conhecia. Ele olhou para ela e disse que nunca tinha se correspondido com ela. Maria achou aquilo um descabimento e gritando falou da carta sobre o banco. Ele disse que nem morava naquela casa e que ali morava a sua namorada e que ele nunca respondeu uma carta dela.
Ela entendeu tudo e saiu correndo desesperada. A namorada tinha achado a sua carta e lhe feito de boba. Ela saiu para rua chorando. Parou e olhou para casa uma última vez, enquanto corria pela rua chorando. No segundo andar da casa, da janela de seu quarto, Iago, olhava ela desesperada correndo, enquanto sobre a cama, em uma caixa de sapatos estava, diversas cartas e sobre a penteadeira em um papel em branco apenas um verso de um novo poema: “Não sou quem tu desejas, mas sou aquele que mais te deseja.”