Fall and Fool
“Machados voaram enquanto estávamos pela sala. Tiros foram ecoados enquanto ouvia a voz dela. Toques foram abominados enquanto estávamos frente-a-frente. Não éramos mais o casal predileto do mundo enquanto estávamos ali, olho-no-olho, coração na mão, palavras na garganta. Ela estapeava minha cara enquanto falava que queria sair, fugir, mudar de ares, amar outros caras. Ela me magoava quando abria a boca para falar que eu era incapaz, que não dava mais, que precisava mais dela e eu, mais de mim. Ela me destruiu quando disse que não me amava mais. Ela realmente me destruiu, mas ninguém conseguiu ouvir.”
Dias atrás
No quarto, deitados e quase pelados, ela me analisava como se fosse a nossa primeira vez ali, assim. Era, depois de anos, a primeira vez que eu a possuía em meus braços durante a madrugada. Ela me beijava, mas não sabia o porquê. De alguma forma, eu notava cada detalhe dela como antes, mas ela não sabia. Ela me olhava com piedade, sabendo que eu ainda sentia. Anos depois, meu amor por ela ainda era o mesmo e sabíamos disso. Sendo tão ela, sentiu pena de mim naquele momento.
“Eu estou apaixonado por você.”
Anos depois, a frase voltava a vir. Olhando naqueles olhos claros, eu voltava a profanar o que, sem saber, viria a me destruir. Mesmo depois de anos, sem piedade, eu caia no meu próprio erro, no meu próprio pecado, no meu próprio medo, no meu próprio sentimento...
Eu a amava inteiramente, mas a odiei naquele momento porque eu sabia que só eu sentia, naquela cama suada e bagunçada com o lençol cobrindo nossos corpos quentes.
Eu odiei quem eu me tornei, pois eu sabia que tudo o que eu dissera, fora por impulso e tão rápido, que faria ela soltar o laço de mim. Ela não me amava e aquilo me torturava, deixando-me cada vez pior. Eu só queria me deitar e esquecer o que eu tinha dito.
Deitados, eu a abraço para acalmar meus gritos internos enquanto os demônios dela me sussurravam para eu soltá-la. A noite caia como quem caia no sono e ela caiu em meus braços como eu cai na armadilha dela. Minha cabeça corroeu meus pensamentos e eu tentei enxergar, mesmo com os olhos fechados, algum caminho fora daquela cela. Aprisionado entre seus braços e pernas, eu a aprisionava em meus olhos e em meu peito, pois eu a amava, por mais doloroso que fosse para mim.
Na tentativa de sonhar com um futuro ao lado dela, era impossível, principalmente quando sua consciência não caia mais em armadilhas pregadas. “Se não havia futuro nos meus olhos, por que haveria em nossas vidas?” Talvez eu ainda estivesse num sonho, com os olhos vendados, por não notar o fato de que como as coisas tinham que ser. Novamente, eu estava cego. Adivinha de quem havia sido a culpa?
Dias depois
Antes, minha esposa; hoje, motivo das dores. O ódio se tornou o único sentimento guardado por ela, em mim. Por nós, me fiz e refiz mil vezes para ama-la até o último dos meus dias. De mim, ela se desfez, desacreditando, deixando passar. Como pássaros voam para encontrar onde ficar, eu necessitei voar para me desencontrar. Ela era o motivo por eu ser o que eu fui, mas eu não podia mais ser o mesmo que era capaz de abrir mão de si por alguém que não acreditava que as coisas podiam mudar.