HISTÓRIAS DE SÁBADOS

Sábado é um dia péssimo. Principalmente depois do meio-dia. Acaba o expediente e temos que arrumar o que fazer. Temos que visitar exposições de artes plásticas nos museus e galerias. Olhar a arte e viajar na visão do artista. Quem sabe dançar regue. Ir ao parque. Na praia. Ver a chuva caindo sobre as torres de salas e apartamentos. Detalhes dos sábados. Ir às lojas e lojas dos shoppings com a esposa, os filhos, a namorada, a noiva, o noivo, o colega, a amiga, primo, irmão, cunhada, amante, no sábado ver alguém que não seja a cara do cara aquele que trabalha na mesa ao lado no escritório, na loja, na oficina. Mas sábado tem show, tem teatro e restaurantes lotados de gente interessante e cantores e cantoras encantadoras. Salva-se o sábado! Tem baile. Ah o baile! O povo a dançar! Olho no olho. Abraço. Vai rolar beijo. Desejo.

Pois foi justamente num sábado assim como todos outros, que aconteceu algo inusitado na vida de Angélica. A menina era pura, comportamento inquestionável. Nunca tinha pulado a cerca ou feito suruba. Sequer tinha estado com outro homem a não ser seu primeiro namorado, o Marcos, aquele filho da puta que a abandonara depois de ter comido por alguns anos seu corpinho sarado, depois de ter casado e traído a menina muitas vezes e descaradamente, humilhando a coitadinha que tinha fama de guampuda entre suas amigas no bairro. Não era magrinha, como as manecas da moda, mas não apresentava gorduras, apesar das perna grossas e corpo recheado. Era poposuda, com uma bunda saliente, seios saltitantes e com bochechas vermelhas. Tinha lábios finos, dentes retos e um sorriso angelical. Meiguice era o que não lhe faltava. Depois de sofrer no silêncio e na solidão, a garota resolveu procurar outro homem para esquecer o desgraçado do Marcos. Ela merecia a felicidade de receber um carinho, uns beijos longos, uns abraços esmagadores, uma massagem nas costas, na bunda, nas pernas, ela merecia orgasmos e chupadas, e precisava muito, estava carente de sexo.

Angélica era uma mulher que nasceu em berço de família tradicional, foi criada num ambiente de bons costumes e muita higiene. Ao contrário de Romário, que foi criado em um lar com muitos vícios e traições. Mas quis o destino que ambos se encontrassem numa tarde quente de janeiro. Angélica de vestido curto, de algodão branco que contrastava com sua pele morena. Romário de bermudas e camiseta com a estampa do Che Guevara no peito. Em uma parada de ônibus. Num bairro de Alvorada, esperando a linha metropolitana para o centro de Porto Alegre.

Romário botou o olho e gostou. Ela percebeu que ele estava olhando muito interessado mas não deu bola, ficou na dela, quietinha. O cara puxou conversa, perguntou as horas e se ela sabia qual o horário daquele ônibus para o centro. Ela disse que passava de meia em meia hora e só. Ele perguntou se ela estava indo para Porto Alegre. Ela disse que sim, ia fazer umas compras nas Americanas. Depois se arrependeu de ter dito que ia fazer compras para um estranho, se ele fosse um assaltante sabia que ela estava com dinheiro ou cartão de crédito. Azar, pensou, e olhou bem para o rosto e as roupas de Romário. Ele não tinha pinta de bandido, até era bem bonitinho. Mas não deu mais conversa. Ele, ao contrário, não ficou quieto e disse que estava indo a Porto Alegre também fazer umas compras.

Nisso chega o ônibus azul claro da Metroplan. Ambos sobem. Ela passa a roleta e ele olha a bunda redonda dela. Ele passa a roleta e senta ao lado dela. Pede licença, ela concede com um sorriso. Aquele sorriso deu uma esperança de conquista e uma leve ereção no cara. Olhou para as pernas dela, para o decote do vestido e teve uma visão parcial dos peitos, só faltou ver os mamilos, mas imaginou como seriam. Ela ficou arrepiada quando a mão dele tocou na dela. Mas ela deixou que ele continuasse tocando. Isso foi um bom sinal para ele continuar avançando. Se olharam e sorriram.

Desceram na frente da loja Mc Donalds da Voluntários da Pátria. Um calorão. Ele convidou ela para tomarem um sorvete. Ela aceitou. Entraram na fila e foram conversando. Ela disse que estava separada e ele disse que era solteiro. Ela disse que não trabalhava e ele que ajudava o pai nas obras, por isso estava indo na Tumelero ver modelos de fechaduras para portas internas de uma casa que estavam construindo. Ela disse que queria comprar umas roupas e uns cremes com o cartão da mãe, uma aposentada por invalidez. Pegaram o sorvete e ele pagou. Lamberam e gostaram. Ele olhou nos olhos dela, agarrou o rosto e beijou os lábios finos e delicados de Angélica. Ela gostou tanto que beijou ele e agarrou seu pescoço. Ele a abraçou e sentiu tremer o corpo da morena em contato com o dele. Pegou ela pela mão e foram caminhando até o fim do Mercado Público. Dobraram de mãos dadas na avenida Júlio de Castilhos e foram até o primeiro hotelzinho que encontraram. Subiram as escadas, ele pagou uma chave e foram para o quarto. Sem nenhuma palavra, se abraçaram e caíram na cama onde foram se agarrando, se beijando e tirando as roupas. Era muito bom e diferente aquele contato, pensava Angélica, enquanto Romário enfiava a língua dentro da boca dela e chupava seus lábios. Depois abocanhou seus peitos e enfim chupou os mamilos que tanto desejara na viagem de ônibus. Tirou o vestido, as calcinhas e começou a beijar e chupar as coxas dela. Abriu com os dedos a bocetinha depilada e enfiou a língua, lentamente, e puxou com os lábios o clitóris. Ela começou a mexer e a gemer. Ele beijava aquela boceta como se fosse uma boca. Ela fechava os olhos e se contorcia de prazer. Ela agarrou o pau duro dele e puxou pra dentro dela, Enfiou na boceta e abraçou o cara que começou a enfiar e tirar o pau, lentamente, até impor um ritmo mais forte. Abraçaram-se e se enroscaram com as pernas, encaixando os dois corpos num mesmo ritmo com gemidos e caretas de prazer. Ficaram nesta foda por alguns minutos até que não aguentaram mais e gozaram urrando e se beijando. Foram parando lentamente, amolecendo o corpo, porém permaneceram abraçados até o último suspiro. Quase desmaiados ficaram se olhando. Custaram a se mover. Quando conseguiram se mover, resolveram tomar um banho.

Ela foi na frente, ligou o chuveiro e deixou a água fria cair sobre seu corpo. Ele foi atrás e contemplou aquele corpo bonito embaixo do chuveiro. Se agarrou, abraçou a cintura, tocou nas coxas, chupou os peitos, beijou o pescoço, a boca e ficaram com tesão novamente. Ele abriu delicadamente a boceta dela, lavou bem, se ajoelhou, chupou com a água escorrendo pela boca, e se levantou para enfiar o pau nela por trás. A garota se encostou na parede e entregou sua bunda para o recém conhecido parceiro. Ele apalpou suas nádegas, enfiou o pau e começou a mexer, penetrando fundo e dando estocadas sexuais que fizeram a menina gemer de prazer. Seguiram num ritmo lento e prazeroso até mais um orgasmo debaixo do chuveiro. Depois se abraçaram e se banharam. Ela lavou o pau dele com sabonete, passou sabonete nas costas dele e recebeu muitos carinhos e as mãos dele esfregaram todos seu corpo, passando sabonete pelas pernas, pela boceta, pelas costas, pescoço, cabelos e braços. Uma delícia, ambos pensaram e riram ao mesmo tempo quando se olharam. Depois caíram nus na cama desarrumada e ficaram se olhando pelo espelho grande fixado ao lado da cama. Um belo casal, pensou ela, já sonhando em ter um novo marido que lhe comesse todo santo dia. Ele adorou a situação, ficou preocupado porque tinha gostado demais, teria que se cuidar para não se viciar na guria e virar escravo dela.

Ela olhou no relógio do celular e disse que tinha que ir fazer as compras. Ele também precisava ver as fechaduras da obra para o pai patrão. Trocaram os números de telefone e combinaram de ser ver novamente, brevemente, quem sabe amanhã, propôs ele, quem sabe passar o dia todo juntos, ela ficou de dizer depois se poderia ou não, falariam por telefone. Depois se beijaram novamente, com muita vontade, e saíram abraçados do hotelzinho, e foram felizes pela Júlio de Castilhos em direção ao Mercadão. Ela subiu a Borges de Medeiros em direção à Andradas para entrar na loja Americanas, e ele voltou em direção a Júlio de Castilhos para dobrar rumo à Farrapos até o antigo prédio onde funcionava a Tumelero.

Angélica não parava de pensar em Romário. Ia olhando as roupas e pensando no cara, na transa, no que tinha acontecido. Romário não parava de pensar em Angélica, nos peitos dela, nos gemidos, nas pernas, na bocetinha depilada, nos beijos e agarrões dela, nas suas mãos delicadas, nos seus braços finos, nos seus cabelos cheirosos. Olhava para as fechaduras, fotografou os modelos com o celular, anotou os preços, mas não saiam de sua mente aquelas imagens de sexo recém realizado.

Saiu da loja e ligou pra ela. Angélica ainda estava na Americanas e tremeu quando viu que a chamada era dele. “Tu já terminou tuas compras?” perguntou Romário. Ela disse que ainda não, que estava provando as roupas e estava muito indecisa. Ele disse que então iria ajudar ela, que estava indo até a loja, e que poderiam voltar juntos, ele carregaria as sacolas dela e faria companhia. Ela disse que tudo bem e em poucos minutos ele subiu a escada rolante e foi até onde ela estava comprando. Ajudou a escolher, ela experimentou, mostrou pra ele que gostava de tudo, até que se decidiram, pagaram com o cartão da mãe dela e desceram para a Andradas, subiram pela Voluntários até o viaduto onde pegariam ônibus de volta para Alvorada.

Na chegada no bairro ele desceu com ela, queria saber onde ela morava e fazia questão de carregar as sacolas com as roupas e calçados comprados. Ela disse que o pai dela era muito furioso, que ela recém estava saindo de um casamento frustrado, e que era melhor irem devagar nesta relação que estava começando. Pediu pra ele ir somente até a esquina da rua dela, que depois trocariam mensagens e marcariam encontros. Ok, ele aceitou a argumentação de Angélica mas beijou os lábios dela antes da esquina, abraçando seu corpo e acariciando seu rosto e cabelos. Ficou olhando ela descer a rua, rebolando aquela bundinha redonda e saliente no vestido de algodão branco.

Angélica entrou em casa e quando chegou na cozinha encontrou o ex-marido Marcos tomando café com os pais dela. “Estávamos te esperando, Angélica”, disse o pai dela com voz grave e sério. A mãe falou que Marcos estava pedindo que ela voltasse pra casa, que sentia falta dela, que tudo iria mudar, que ele não sairia mais com outras mulheres, nem chegaria de madrugada e bêbado em casa. Que também tinha comprado um quarto e uma sala nova para o retorno dela e que pretendia ter um filho, em breve, para construírem uma família. Angélica ouviu estas palavras, olhou para o rosto de Marcos com cara de arrependido, foi ficando tonta, tudo escureceu e ela desmaiou. Caiu no piso com suas compras. Marcos correu e agarrou a mulher amada. Levaram para o quarto, colocaram na cama, abanaram, colocaram sal na boca, levaram água, passaram no rosto até que ela acordou. Abriu os olhos e viu os três rostos assustados que a observavam com preocupação. “O que foi que te aconteceu, Angélica?” perguntou a mãe. Ela começou a chorar e pediu que Marcos e o pai saíssem do quarto. Então falou à mãe que tinha arrumado outro homem, que tinha transado com ele hoje e que estava apaixonada. A mãe começou a chorar também e abraçou a filha. “O que vamos fazer então?” perguntou a mãe de Angélica. Ela levantou-se, secou o rosto molhado pelas lágrimas e tomou uma decisão: “Vou voltar para o Marcos!”

Foram até a sala onde os homens esperavam e comunicaram o decidido. Marcos sorriu e abraçou Angélica que ficou parada, em silêncio, sem corresponder suas carícias. Ela arrumou sua mala e voltou para a casa de Marcos, na rua de cima. Quando passaram pela casa de Márcia, antes da casa deles, Marcos piscou o olho para Márcia, o que Angélica percebeu mas ficou calada. Entrou, tirou as roupas da mala, colocou no camiseiro e no guarda-roupas, e foi ver a arrumação costumeira. Foi até a cozinha e percebeu Marcos bebendo um copo de cachaça. Não contestou, ficou calada. Foi até o banheiro e passou uma mensagem pelo celular para Romário: “Não poderei te ver amanhã, nem durante a semana, voltei para o meu marido. Ele foi me buscar. Fica combinado que nos encontraremos todos os sábados, naquele hotelzinho da Júlio de Castilhos, em Porto Alegre, às 15 horas. Te amo, adorei transar contigo. Não me manda mensagem agora pois já estou na casa do cachorro. Bjs.” O cara recebeu aquela notícia e ficou inconformado, queria Angélica só pra ele, todos os dias. Bebeu todas no sábado à noite, nem foi pra balada, bebeu tanto que acabou dormindo cedo, indignado com aquela situação, frustrado, mas com a esperança de tê-la nos braços no próximo sábado.

Domingo levantou tarde e foi preparar o churrasco com os pais e os irmãos, como já era hábito na família. Enquanto fazia o fogo, espetava a carne e organizava o ambiente, não conseguia esquecer o rosto de Angélica gozando, seus beijos e sorriso encantador. Passou a semana toda com aquelas imagens na mente. Esperou ansiosamente pelo próximo sábado. Trabalhou na obra, carregou tijolos, fez massa, montou andaimes, colocou portas e janelas... e sempre pensando em Angélica.

Chegou o sábado e lá foi Romário para a parada. O ônibus estava atrasado, pra variar. Angélica chegou com o marido e a mãe. Ele ficou calado, só escutando. Quando o ônibus parou, Marcos deu um beijo rápido na esposa e disse para a sogra que mandava um abraço para a tia Delci que iam visitar e estava muito doente. Elas confirmaram e subiram no ônibus juntamente com Romário e outros passageiros. Os três desceram juntos na frente do Mac Donalds. Angélica apresentou para a mãe o namorado. Ambos se beijaram no rosto.

A mãe disse pra filha que o casal de amantes tinha apenas duas horas para matarem a saudade. Enquanto a filha ia para o hotelzinho, a mãe foi mesmo visitar uma irmã doente no bairro Partenon. Pela felicidade da filha, fazia tudo. Angélica e Romário subiram as escadas, pegaram a chave e se meteram num quarto sem ar-condicionado. Beijos, abraços, chupadas, orgasmos e juras de amor eterno. Em casa, Marcos olhava uma partida de futebol na televisão, divertindo-se com a derrota do time rival. Dia de descanso para quem passou a semana toda dando duro nas estradas com seu caminhão.

No fim da tarde Angélica voltou pra casa, depois de deixar a mãe na casa dela e do pai. Marcos queria amor, tentou lhe abraçar e queria sexo pra gerar aquele filho ou filha prometidos. Angélica estava cansada de amar. Disse que hoje não, que estava com dor de cabeça e que ficou abatida com a saúde da tia doente que foram visitar. Disse que todos os sábado iria visitar a tia, juntamente com a mãe, até que a tia morresse. Ele disse que sim e foi preparar a janta, aperitivando uma cachaça com limão e mel.

Meses se passaram e todos os sábados lá iam Angélica, o esposo e a mãe até a parada, às 14 hs. Elas iam visitar a tia que estava com câncer no esôfago. O pai de Angélica confirmava. Para o velho era questão de honra manter a filha casada com aquele canalha que praticamente estuprou sua filha aos 14 anos. E além de tudo ele bancava a filha, com casa, comida, proteção, tinha assumido a menina. O velho sabia que o genro às vezes batia na filha, mas só quando bebia demais e ela não queria transar com ele. Briga de casal, não podia se meter. Angélica era mulher de Marcos, de papel passado e tudo, dizia no leito para a esposa.

Angélica sempre inventava umas dores na hora que Marcos a procurava para transar e não deixava de tomar anticoncepcional para não engravidar, pois acabava tendo que transar pelo menos uma vez por semana com o marido. Abria as pernas e deixava o esposo se agarrar, beijar e chupar. Ela ficava fria e nem gozava. Nem sequer fingia orgasmos. Depois que começou a apanhar, também passou a odiar o marido. Um soco no olho, num domingo de briga, a deixou de olho roxo toda a semana. Quando foi no sábado, dia do encontro com o amante, ele percebeu o hematoma que ainda permanecia e quis saber. A paixão levou Romário a querer interferir no caso. Ela disse que não, que o marido tinha uma pistola, era maluco e ciumento demais. Que se ele fizesse alguma coisa ia prejudicar ela e que acabariam por não poderem mais se encontrar nos sábados. O rapaz chutou as paredes do hotel, beijou ardentemente Angélica, abraçou com mais força, chupou com ímpeto maior, fodeu a mulher de Marcos com mais paixão e força viril do que nunca. Ela gostou. Como nunca. Já não podia ficar longe dele, estava viciada em seus beijos, chupadas e trepadas.

Numa tarde de sábado, inverno chuvoso, a tia morreu no hospital Mãe de Deus. Enquanto preparavam o sepultamento, Angélica transava com seu amante. Depois foi para os funerais, obviamente. Mas o que fazer no próximo sábado? Não temos mais a desculpa da tia doente. Passaram a semana pensando em um novo álibi para os encontros de sábados. Surgiu a ideia de ela fazer um curso de formação profissional, precisava se capacitar e entrar no mercado, não podia passar o resto da vida escrava do marido. Era uma boa ideia. Estava resolvido, e o marido ainda teria que pagar pelo cursinho. Acabava um curso, ela se inscrevia em outro. Estava cheia de diplomas que imprimia num computador numa lan house na Avenida Júlio de Castilhos. E aplicava suas aulas em casa mesmo, culinária da boa, comida japonesa, mexicana, italiana, francesa, coisas que pesquisava em minutos na internet, como instruções para montagem de buffet para festas, organização de eventos, etc, até um curso de cabeleireira Angélica fez, este de verdade, num instituto de beleza na Rua da Praia. Sempre aos sábados à tarde, quando encontrava-se com seu amado Romário.

Num sábado Romário chegou no motel com uma surpresa: mostrou as fotos de uma casa que ele tinha erguido para ambos morarem. Sala, cozinha, banheiro e dois quartos. Já estava mobiliada com móveis novinhos. Disse que desde que começou a transar com ela, desinteressou-se por festas, orgias, baladas e gastanças. Economizou tudo que pode e comprou material de construção e nos domingos de folga trabalhava só na casa, o dia todo, antes e depois do churrasco. Era num terreno de seu avô, em Alvorada mesmo. Falou que a hora que quisesse podia ir para a casa nova dele. Que esperaria um dia que ela tomasse esta atitude. Angélica lhe amou mais ainda e naquela tarde curtiram um sexo muito ardente, como sempre, depois do curso de secretária. Ela era uma espécie de Dona Flor e seus dois maridos, a personagem do genial Jorge Amado. Só que nesta versão gaúcha a esposa gostava apenas do amante e tolerava viver com o esposo para manter a tradição e por conservadorismo. Foi educada para ser esposa, como a avó, a mãe, as tias. O que fazia com o amante, era um desvio de comportamento moral instituído. Ela sabia disso, mas era a maneira de se vingar do esposo e afrontar a sociedade moralista e hipócrita. Conhecia várias mulheres que faziam o mesmo. Sabia que Marcos comia a vizinha Márcia no horário de expediente, quando estava viajando pela região metropolitana com seu caminhão. A mulher da casa ao lado marcava encontros com o caminhoneiro e depois fazia questão de contar para outras vizinhas. Angélica só ouvia o assunto e não se importava. Tinha um homem que a amava com exclusividade, e se sentia toda dele, em pele e alma. Acreditava neste amor mas estava exilada no casamento por mais de 10 anos. Pensava em não envelhecer nesta prisão moral, nem morrer neste sacrifício consensual.

Numa tarde de sábado de primavera Angélica chegou com uma surpresa: avisou Romário que decidiu morar com ele, na casa nova, que ia abandonar aquela vida de esposa infeliz, e que no próximo sábado o encontro deles seria na casa nova. Romário vibrou como se fosse um gol. Naquela tarde amou com muito carinho sua futura companheira de lar. Fez uma demorada massagem e gozaram várias vezes. Ele passou a semana toda preparando a casa situada em um bairro próximo.

Chegou o dia, ela pegou sua bolsa e normalmente deu tchau para o marido, dizendo que estava indo para o cursinho. Ele disse tudo bem, ok, tchau, pode deixar que eu compro o pão. Romário esperava ansioso, roendo as unhas, olhando pela janela, até que avistou Angélica, linda como sempre, vindo em direção da casa. Ele sorriu, abriu a porta e a fez entrar. Abraçou-lhe, a beijou e foram para o quarto para matar a saudade de uma semana inteira sem se ver. Depois do orgasmo ficaram deitados, escutando música. Tomaram um banho juntos, um ensaboando as costas do outro, transaram debaixo do chuveiro e depois Romário foi mostrar a casa para a companheira que chegava para viver ali. Ela pediu que ele saísse e comprasse pra ela algumas coisas que ela não trouxe, como escova de dente, escova para o cabelo, cremes, xampu, calcinhas, sutiãs, calças jeans 38, calçados 36, blusas média, meias e outras coisas urgentes. Não queria nada que tinha ganho do outro marido, queria uma vida totalmente nova. Ele concordou e foi até o shopping. Em duas horas estava de volta, cheio de sacolas, enquanto ela organizava a casa nova.

Caiu a noite e Angélica não voltou para a casa onde Marcos já estava preocupado e bebendo muita cerveja. Abriu outra lata e foi em direção à casa do sogro, nas proximidades. Entrou perguntando por Angélica. O pai disse que não sabia de nada. A mãe saiu da cozinha e disse a verdade: “Ela foi embora, Marcos. Cansou de viver contigo, arrumou outro homem e partiu. Ela não te amava mais há muitos anos, tu deve ter percebido.” Marcos ficou inconformado, bateu na mesa, chamou a mulher de vadia, puta, traidora, que fez tudo sem ao menos lhe dar uma pista de que ia fugir, que iria atrás dela onde quer que tenha se escondido... Ficou bastante atordoado e voltou para casa. Tentou ligar mas ela tinha deixado até o celular em cima da televisão. Não levou nada. Saiu com a roupa do corpo. Terminou suas cervejas e ele foi até o bar comprar mais. Na cruzada encontrou a vizinha Márcia que lhe abordou. Ele a convidou para ir para sua casa, onde beberam e transaram. Marcos contou para Márcia sobre a fuga de Angélica e disse que iria atrás dela para matar a mulher e seu atual companheiro, que não admitia traição e que iria se vingar. Ele chorou e bebeu até dormir nos braços da vizinha. Passou o domingo escondido, de ressaca, protegido por Márcia que passou a cuidar do amante e a lhe consolar dando-lhe carinho e conselhos para que esquecesse a esposa, que matar seria um crime e ele iria para a cadeia, que na verdade ninguém é dono de ninguém... que segunda teria muitos fretes a fazer, compromissos profissionais toda a semana, que deveria tirar a ex-mulher da cabeça. Impossível, Marcos passou toda a semana pensando em Angélica, e assim sucessivamente, meses e meses, sobrando para a vizinha os cuidados especiais.

No outro bairro, distante uns 5 km dali, Angélica não precisava mais das mentiras de sábado à tarde para amar seu homem. Agora passava o dia esperando que ele chegasse do trabalho nas obras para fazerem a festa diária regada a beijos e orgasmos antes da janta e do descanso. Romário estava realizado com sua vida pacata e amorosa. Estava planejando comprar um carro e a mulher estava arrumando um emprego de secretária numa clínica médica. Ele concordou, porém pediu pra ela que nunca arrumasse alguma atividade longe dele nos sábados à tarde. Riam e se beijavam com olhar de cumplicidade.

Angélica e Marcos só se viram uma vez, na frente do juiz, quando assinaram a papelada do divórcio. Foi numa sexta-feira ensolarada, no fórum de Alvorada.

No sábado os ex-amantes e agora noivos Romário e Angélica comemoraram o noivado com um jantar num excelente restaurante no centro da cidade. Foram no carro novo. Ela revelou que estava grávida dele, é claro, mais um motivo para brindarem.

E no mesmo sábado Márcia entregou a casa que alugava e foi morar com Marcos que já estava conformado com a nova realidade de sua vida, livre, sem crimes nas costas e ganhando a vida. Márcia vendeu os móveis velhos que tinha e deu uma festa na casa de Marcos, convidando a vizinhança mais chegada.

Esta é mais uma história real que o velho Matias, pai de Angélica, me contou numa tarde de sábado, tomando um chimarrão, enquanto sua esposa preparava uns bolos de chuva. Eu estava apenas checando uma pesquisa da FEE e disse ao velho que além de pesquisador eu era escritor. O velho não me deixou ir embora enquanto ele não terminasse de contar esta história de pessoas comuns que sobrevivem ao capitalismo aqui na terra brazilis.

- Mas por que estás trabalhando sábado à tarde, me perguntou o velho, cevando o mate.

- Porque ontem choveu e tenho que entregar estes relatórios na segunda-feira, respondi, e porque o dia está bonito e não tenho mais nada pra fazer no sábado.

Um bom sábado a todos nós!, concluiu o velho, levantando a cuia como que fazendo um brinde.

Vladimir Cunha dos Santos

VLADIMIR CUNHA DOS SANTOS
Enviado por VLADIMIR CUNHA DOS SANTOS em 27/10/2017
Reeditado em 29/10/2017
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