(DES)Encontros
Alana era uma garota estranha aos olhos das pessoas da pequena cidade de São Luis da Barra. Ela usava um boné virado pra trás todos os dias, suas roupas não eram nada femininas e seu cabelo loiro e cacheado estava sempre preso. Ela não ligava muito pro que essas pessoas diziam. “A vida é minha, quem decide o que vestir e usar sou eu porque quem compra sou eu” ela dizia, sempre que sua mãe dizia que os vizinhos estavam comentando.
E ela era diferente, na verdade. Alana sofria de uma doença no coração, que poderia parar a qualquer instante e, por isso, ela resolveu viver a vida sem se importar com o que eles diziam. Até porque a vida é curta demais pra desperdiçar em gente que não valia a pena.
Ela estudava em uma escola particular onde o ensino era bastante rígido e estava indo mal nas provas, então resolveu entrar para o grupo de estudos depois do horário de aula, foi onde conheceu Luisa.
Luisa era de outra turma, mas do mesmo ano. Ela era um ano mais nova, pois havia pulado uma série por ser mais avançada que o restante de sua turma. Ela era toda menininha, basicamente o contrário de Alana. Usava vestidos, o cabelo preto e liso vivia solto e como se fossem folhas das árvores, sempre que o vento batia, eles se moviam como se estivessem dançando e despejavam um delicioso perfume pra quem estava por perto.
Ao chegar na mesa de estudos, os olhos de Alana foram levados aos de Luisa, como se fossem puxados magneticamente, e ela sentiu algo que não sabia explicar. Passou-se uma hora inteiras e as duas não haviam mais se olhado ou trocado palavras, quando no fim da reunião, Luisa aproximou-se de Alana e falou:
- E ai, tudo bem? Meu nome é Luisa. Você é nova no grupo, então é melhor eu te dar os detalhes de como funcionam as nossas reuniões.
Alana quase não entendeu o que ela falou, pois estava mais concentrada na voz dela. Era suave, mas forte ao mesmo tempo e o jeito como ela a olhava estava deixando-a mais distraída ainda.
- Hm.. Oi, meu nome é Alana. Então, você pode repetir essa última parte? É que eu não tava ouvindo direito.
Luisa riu. A risada dela é fofa, pensou Alana.
- Então, a gente se reúne aqui três vezes na semana e um fim de semana do mês. Esse mês já tivemos esse fim de semana, então não se preocupe com os seus planos pra sair. – ela sorriu de um jeito desafiador, como se estivesse esperando que Alana reclamasse por alguma coisa.
- Tudo bem, eu não tenho planos em nenhum fim de semana mesmo. Vai ser até bom ter um lugar para ir.
Alana não sabia se era bom dizer que praticamente não tinha vida fora da escola, mas preferiu dizer a verdade. Ela não gostava de dançar e não podia beber por causa da doença e não tinha muitos amigos pra sair. Na verdade, não tinha nenhum amigo ou amiga.
- Okay. – Luisa parecia não ter acreditado no que Alana disse. – Amanhã teremos encontro novamente. Você vem?
- Sim. Eu realmente estou precisando melhorar meu desempenho pra poder ganhar a bolsa de estudo pro curso que quero.
- E qual curso você quer?
- Medicina Veterinária.
- Nossa, que legal. Eu quero fazer Medicina ou Direito, mas também adoro atuar e cantar, então eu tenho alguns planos Bs. – Ela riu de novo e dessa vez Alana riu junto.
Elas tiveram uma conexão imediata e as duas perceberam.
- Então, até amanhã. E boa sorte com a bolsa de estudos. – Luisa saiu rapidamente, quase que correndo.
Alana voltou para casa e ao chegar encontrou sua mãe chorando. Foi correndo até ela e perguntou:
- O que aconteceu? Porque a senhora tá chorando?
- Não foi nada filha, deixa pra lá. Não sabia que você ia chegar em casa cedo assim, pensei que essas coisas fossem mais demoradas.
- Não mãe, alguma coisa aconteceu. Me conta, por favor.
- Não foi nada demais filha, eu só estou um pouco sentimental.
- Mão, para, você não sabe mentir.
- Tudo bem filha, vou te contar, mas por favor não vai atrás de confusão. Promete?
- Vou prometer depois que você me contar o que aconteceu.
-Então, você sabe aquele pastor que mora no final da rua? Ele estava visitando as pessoas hoje e veio aqui, disse um monte de coisa e começou a dizer que podia “consertar” você, arranjar um namorado bom e um monte de besteira, aí eu falei que não tinha nada de errado em você pra ele consertar e que se você quiser namorar vai achar alguém que te ame e que você ame. Então, ele começou a dizer que você era uma aberração e que não tinha lugar pra gente como você no plano da salvação e eu o expulsei daqui aos prantos. Por isso fiquei assim.
- Não acredito que aquele filho de uma puta veio fazer isso aqui dentro da sua casa! Sinto muito, mas calada eu não posso ficar mãe. Ele invadiu a nossa privacidade e ainda veio me difamar?!
- Calma minha filha, fazer confusão não vai adiantar de nada.
- Mas mãe, ele não pode fazer isso! Olha o estado que a senhora ficou!
- Por isso mesmo, estou te pedindo pra não deixar as coisas piores do que já estão. Deixa isso pra lá.
- Olha, não vou prometer nada, mas vou tentar não fazer nada. Mas da próxima vez que aquele homem chegar perto da senhora, ele vai conhecer a aberração.
Aquele dia tinha começado mais ou menos, mas terminou da pior maneira. Alana detestava que alguém fizesse sua mãe sofrer, pois sabia que ela já havia sofrido bastante cuidando dela. Resolveu então que faria de tudo pra que aquilo não acontecesse novamente, começando com a sua aparência.