AS CALORIAS DO AMOR
Uma travessa grande de batata frita foi posta na mesa frente a Nataniel. O garoto mal havia engolido o último pedaço de chuleta quando a namorada praticamente despejou todas dentro do prato dele.
- Tem arroz – Aninha sentou frente a ele e apoiou o queixo nas mãos, observando o amado se refestelar com a comidinha que fizera especialmente para aquela ocasião.
- Arroz? Opa, vou querer!
Aninha deu um salto da mesa e voltou em seguida com a panela inteira. Ela mesmo tratou de servi-lo.
- Fiz só para você, amor.
Quem olhasse para Aninha veria dois coraçõezinhos no lugar dos seus doces olhos azuis. Aliás, sua vida era Nataniel. Depois de um mês de flerte, o namoro engrenou de vez. Faziam um casal bonito, a loira Aninha e o simpático e carismático Nataniel.
O único problema era o ciúme da Aninha.
Ela até tinha motivo para isso. Nataniel era um cara popular. Os amigos o adoravam e a mulherada caía em cima. Aninha, apesar de tudo, era uma garota controlada. Não era de dar show de ciúmes. Mas jamais admitiria perder o namorado para aquelas vadias que saltitavam ao seu redor. Por causa disso se vira obrigada a tomar uma decisão forte que, para ela, era a mais acertada naquele momento: deixar Nataniel gordinho. No seu ponto de vista, se ele ficasse rechonchudo, as meninas não o achariam mais um cara tão interessante.
Com a boca cheia de arroz e batata frita, Nataniel ainda gracejou:
- Acho que você me quer ver gordo.
Os pelinhos do braço de Aninha se arrepiaram.
- Quero ver você forte – mentiu ela, descaradamente.
Finalizado o almoço de domingo, Aninha apareceu com um potinho de brigadeiro de colher e que Nataniel devorou sem dó. Mais tarde, depois de uma hora e meia só comendo, o garoto bateu na barriga estufada e comentou:
- Este dia ensolarado está bom para a gente dar uma voltinha, né?
Voltinha? E gastar todas as calorias? Nunca.
- Ah, amor... – miou ela. - Vamos ficar juntinhos assistindo nossas séries na TV. Faço um panelão de pipoca só para nós dois.
Mesmo com todo o esforço da Aninha, Nataniel era magro de ruim. Para piorar a situação, o garoto perdeu mais três quilos depois de pegar uma forte gripe. Aninha ficou tão nervosa que quando soube do emagrecimento do namorado comeu sozinha um hambúrguer de bacon.
Nataniel se recuperou do gripão e quando voltou à escola ganhou uma colega nova: Larissa. Cabelos vermelhos, rosto de boneca, corpo curvilíneo e sorriso sedutor. Aninha chegou a sentir uma dor no peito quando a viu pela primeira vez. Minha nossa, pensou ela. Como irei competir com uma garota dessas?
Naquela noite, horas depois de ter sabido da existência de Larissa, Aninha se afundou em uma lata de leite condensado, entre lágrimas e soluços. Nataniel observou a cena sem entender nada. Para quê tanta tristeza, meu Deus?
- É TPM – respondeu Aninha, fungando, virando a lata de doce inteira dentro da boca para pegar a última gotinha que restava no fundo.
Contente com a explicação, Nataniel voltou alegre para seu jogo no videogame enquanto a namorada pegava o quinto lenço para assuar o nariz. Maldita Larissa.
Os dias passaram, mas a angústia de Aninha permanecia. Enquanto Larissa se firmava como uma das garotas mais cobiçadas da escola, Aninha via sua vida afundar. Não que o namorado estivesse aprontando. Era ela que não conseguia mais suportar o empoderamento de Larissa.
No dia em que a minissaia trancou nos quadris, Aninha teve uma crise de choro. Pegou o pote de doce de leite e devorou até deixá-lo limpo. Nataniel olhou para a namorada sem entender muita coisa. Deitada sobre a cama com o rosto afundado no travesseiro, Aninha era o quadro da dor. Ela não queria se pesar, não queria ver as grandes bochechas rosadas refletidas no espelho. Talvez não estivesse tão gorda assim, mas ela se via como uma baleia, uma elefanta loura.
Um dragão.
- Meu amor – sussurrou Nataniel com as mãos na cintura. - Eu vou te amar até mesmo se você ficar gordinha.
Ela parou de fungar e ligeiramente desencostou o rosto do travesseiro para encarar Nataniel.
- Mesmo?
- Mesmo.
- Jura? – ela não fungava mais.
- Juro, Aninha – suspirou Nataniel.
Naquela noite o jovem casal comemorou o amor eterno com um balde de sorvete. A felicidade não conta calorias.