GIRASSÓIS
GIRASSÓIS
O suave aroma de café torrado estendia-se por quase toda a fazenda.
Era meados de abril, manhã de muito sol que tornava-se ainda mais bela com o revoar dos pássaros. Numa afinação magistral e incessante, um jovem rouxinol, com seu canto, saudava a vida que desabrochava nas flores. E na sublime sintonia de cores e melodias, a promessa de uma eterna esperança nascia como uma gota de orvalho por entre as pétalas de uma rosa.
Ao longe, uma pequena cachoeira murmurava uma doce cantiga, com voz patética de lira. As suas margens, lírios.
No valsar de folhas secas ao vento, a revelação de toda uma mágica beleza natural.
Os raios cintilantes do astro-mor, filtravam-se suavemente pelas frondosas copas das árvores, acariciando levemente a viçosa relva, ainda orvalhada.
Ávidas borboletas embriagavam-se na celestial fragrância de jasmins. Beija-flores, bailavam sutis à volta de suas eternas namoradas – flores de laranjeira!
- Corre! – dizia uma voz infante.
- Espera! – respondia sua companheira, que com passos mais lentos e desajeitados tentava acompanhar o moreninho, ágil como um coelho.
Era uma trilha de pedras e cascalhos, que conduzia até a parte mais alta da fazenda. A menina, de longos cabelos encaracolados da cor do sol e um corpinho franzino, encontrava certa dificuldade em seu trajeto. Já o menino, de cabelos crespos e olhos que mais pareciam duas jabuticabas, tão naturalmente caminhava que dava a impressão de um animal silvestre em seu habitat natural.
- Vamos parar um pouco. Eu estou cansada!
- Falta pouco!
- Mas eu estou cansada! – insistia aquela voz, com certa manha.
- Tá bom! – cedeu o menino.
Sentaram-se à sombra de um arbusto, a menina, ofegante. O silêncio fez-se senhor naquele momento. Um momento de contemplação e devoção de duas almas gêmeas.
- Já descansou? – perguntou o menino, pacientemente, após algum tempo.
A menina, levantando-se, anuiu com a cabeça.
Continuaram a caminhada. Destino? Quem sabe a felicidade...
- Pra onde você está me levando? – perguntou a menina, com certa curiosidade.
- É surpresa! – respondeu o menino com um certo mistério em seu olhar.
- Ah, me conta! – insistia a menina.
- Se eu contar não tem graça! – Continuou o menino, sem deixar-se vencer.
- Então conta só um pouquinho. – persistia a menina, usando de todos artifícios para tentar descobrir alguma coisa.
Em vão... Minutos depois estavam no alto do morro, de onde podiam ver toda a fazenda. A menina estava cismada, pois para ela, não havia nada de interessante e, destarte, perguntou:
- Por que você me trouxe aqui?
O menino fitava os dois girassóis que ali estavam, com inefável admiração, que não ouviu a pergunta.
- Ei, eu estou falando com você! – disse a menina, colocando as mãos na cintura.
O menino, distraidamente, virou-se para ela.
- Hã? O que foi?
- Você não ouve não, é? Eu perguntei por que você me trouxe até aqui.
- Você não está vendo? – desta vez foi o menino quem fez a pergunta, com uma certa indignação.
- Vendo o quê?
- Os girassóis, ora!
- Tô. E o que é que tem?
- Como o que é que tem?! – o menino estava perplexo!
- É ! São só dois girassóis... – a menina começou a rir, reprovando-o com a cabeça. – Eu não acredito que você me trouxe até aqui só pra me mostrar isso!
- Foi. Eu achei que você ia gostar!
- Dos girassóis?
- É!... – o menino sentou-se de frente a eles, e continuou: - Sabe, eu venho sempre aqui. Gosto de ficar sentado olhando para eles.
- Por quê? – perguntou a menina, sentando-se ao seu lado.
- Não sei direito... – prosseguiu o menino. – Eles são tão bonitos, que a gente até se apaixona!
Dirigiu os olhos à sua bela amiga. Ela, um pouco encabulada, tentou desviar o olhar. Foi então que o vento balançou, de leve, os girassóis fazendo suas enormes folhas entrelaçarem-se, no momento em que as morenas mãos do menino seguraram suavemente as de Clara.
Pedro sorriu... e voltou a fitar os girassóis.
- Eu queria dizer uma coisa pra você... – ainda com os olhos voltados para as enormes flores, cúmplices do seu inocente amor por Clara.
- Então fala... – disse a menina, com os olhos inquietos.
Viraram-se um para o outro, simultaneamente, e seus lábios quase se tocaram na deliciosas sensação do beijo.
- Vo... você é t... tão linda! – gaguejou Pedro, enquanto um arrepio tomava conta do seu corpo.
Clara estremeceu-se toda, porém exibiu um lindo sorriso para o menino que continuava a olhá-la com devoção.
Nada mais foi preciso dizer, pois seus jovens corações fizeram-se um só.
E os doze anos de Pedro uniram-se, num natural sabor de beijo, junto aos onze de Clara.
E voaram... Destino? Certamente a felicidade.