O abajur
Eu havia mandado remodelar o sótão como quarto de hóspedes, e era a primeira vez que Semíramis entrava ali após a reforma. Sentado na cama, coberta por um edredom marrom sobre o lençol azul, observei-a enquanto ela circulava pelo aposento. Olhou tudo com ar de quem estava gostando, e apontou para o abajur art nouveau no criado-mudo ao lado da cama, vidros tingidos com rosas cor de salmão:
- Você comprou esse abajur por minha causa.
- Confesso que estava pensando em você.
Ela experimentou a maciez do carpete caramelo, pés calçados apenas com meias 7/8, pretas e grossas.
- Não sei se devo me sentir insultada ou feliz pela lembrança - ela prosseguiu. - Afinal, trata-se de uma antiguidade...
- É uma homenagem à sua beleza, nada mais. Vai ficar aceso quando eu apagar a luz do quarto.
Ela parou à minha frente, mexendo os dedos dos pés dentro das meias, numa atitude relaxada, brincalhona...
- Um abajur cor de carne... você é um romântico incorrigível.
- Semíramis, mesmo aos 47 anos, você continua a ser a minha Menina Veneno - admiti.
E então, inclinei o corpo para a lateral da cama, e desliguei o interruptor.
[19-04-2017]