Medonha

– Medonha, medonha, vai morrer sozinha!

Medonha ainda ouvia as crianças gritando ao longe. Gritavam e corriam, nunca ficavam para ver o que essas palavras provocavam na moça. Seu nome de batismo era Simone, mas desde pequena foi apelidada de medonha, e o pior é que estavam todos certos.

Sua pele era salgada, tinha os olhos vesgos e os dentes tortos, cabelos de palha de aço e pernas finas.

Chorava muito, todos os dias. Era romântica e dedicada, amorosa com a família, preocupada com a comunidade. Sonhava em viver um grande amor, ter filhos. Tudo em vão, ela sabia, então ia para a beira do rio e chorava mais ainda.

Não sabia que era observada chorando sozinha na beira do rio todos os dias. Ignorava que em pouco tempo sua vida mudaria.

A festa junina se aproximava e Medonha se aprontava, procurava o vestido mais bonito, o chapéu mais florido, se perfumava e aguardava. Teria sorte se dançasse com mais de um senhor ainda jovem e solteiro. Ela sabia e não se importava, queria dançar, se divertir e esquecer que era feia.

No dia da festa foi para o rio bem cedo, sentou e chorou todas as lágrimas, imaginou mil amores e fez ainda mais promessas e juras.

Quando a noite chegou estrelada e fria, Medonha estava animada e contente, iria dançar, nem que fosse sozinha.

No meio da festa, já tinha dançado com todos os senhores idosos e com um ou outro jovem com má vontade. Não ligou. Viu se aproximando o homem mais bonito da festa, todo vertido de branco, sapato, terno e chapéu.

Aproximou-se lentamente e a convidou para dançar, foi um perfeito cavalheiro, charmoso e sedutor. Dançaram a noite toda. Pela primeira vez na vida, Medonha era o alvo da inveja de todas as moças da cidade. Nada mais embriagava tão profundamente do que essa sensação.

No final da noite foram os dois até a beira do rio. Amaram-se até o amanhecer. Medonha nunca havia sentido nada igual. Guardaria aquela noite na memória para sempre.

O sol já raiara quando o amante de Medonha se despediu dizendo que ela nunca mais ficaria sozinha, em seu ventre um bebê cresceria e aquela noite de amor para sempre teria. Com um último beijo ele pulou no rio e desapareceu. Medonha nunca mais o viu.

Nove meses depois ela carregava nos braços o bebê mais lindo que já se viu e mesmo sendo mãe solteira, era respeitada e invejada por todas as moças da cidade, afinal, ela era a única a ter um filho do boto naquela região.

Priscila Pereira
Enviado por Priscila Pereira em 15/04/2017
Reeditado em 15/04/2017
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