Tinha encontro marcado com a solidão de quatro paredes do quarto de luxuoso hotel na capital maranhense.
Na portaria, o funcionário entregou-lhe um pacote.
— Encomenda para o senhor.
Abriu o Sedex.
Viu muitos textos encadernados e na primeira página, um recado manuscrito:
O livro está concluído. Faça o embelezamento. Beijos, Ravenala.
Explicit. Esplitio, onis.
Julgava  que agora sabia tudo, porque o poema tinha título. Ledo engano! O que  era permitido dizer, ela soltava aos poucos, abrindo a torneira e fechando-a imediatamente, para que uma formiga não se afogasse no dilúvio. Como saber tudo? O mundo do Romance viaja no túnel do tempo. É só  imaginar e pode-se viver o passado e o futuro, quase que simultaneamente. Viver hoje o sol de ontem; e amanhã, o sol que ainda não veio, como se o coração fosse feito para guardar apenas recordações. 'Se olhares  a gaivota, não verás  o sol de relembranças que se põe atrás de suas asas.' Em princípio,  Robert   pensava que o poema queria apenas representar o voou de uma ave. 
Releu o poema, de muito antes conhecido, desta vez  com o título: 
Voo ABS 815.
 
A
Pare
de do
mundo
é azulada,
até onde a vista alcança. O poeta vê além das
nuvens brancas uma aquarela: nuvens amarelas... pássaro
solitário refaz o ensaio de uma valsa. Tudo passa velozmente
no imaginário... Se Fernão olha
a gaivota, não vê
o sol de relembranças
que se põe
atrás
de
su
as
asas
 
 O poeta vê além das nuvens brancas uma aquarela...
— Isto  não é uma gaivota, nem uma jiboia engolindo um elefante. É o voo de uma aeronave.
— O senhor disse o quê? Perguntou o porteiro, por entender que o morador do prédio lhe dirigia a palavra.
— Nada não. Só pensei alto.
Fechou o guarda-chuva. Pôs o pacote debaixo do braço e entrou no hotel, sentindo-se acompanhado por ela. Ravenala  estava ali inteira, naqueles escritos.
 
 ***
Adalberto Lima, trecho de Estrada sem fim...