A Brevidade dos Crimes que Não Cometemos

Falávamos sobre o mundo e as coisas que nele habitam. Sobre o céu e as aves, sobre o mar e as baleias, sobre a terra e as criaturas que se escondem nas tocas... Discursávamos também sobre o que ela queria, e sobre o que eu queria; no consenso geral, dentre todos os quereres, um queria o outro.

Vivemos assim, na utopia da felicidade duradoura sob a redoma redonda e o firmamento de estrelas. Até que um dia tudo mudou.

Eu gostava de águias e ela de gaivotas, enquanto marlins eram meu deleite, ela preferia arraias, e quando os animais terrestres caminharam para o mundo, fugindo de seus buracos, ela se apaixonou pelo tatu e eu pelo tamanduá. Éramos indivíduos individuais demais para a recíproca coletividade. Mas decidimos juntos que era hora de parar: com os sonhos, com a vida, com os planos, com os beijos e os amores.

Nada mais existiu entre nós, senão a lembrança: daquilo que juramos ser verdade e não passava de engano. Pois somos seres humanos e estamos fadados ao erro.

No entanto, na mesma intensidade, estamos condenados ao amor.