Um dia de Lua de mel
Era uma segunda feira, um dia que, para os nativos de câncer, era de sorte, fugindo da realidade de qualquer outro mortal, já que ela era mundialmente reconhecida como o dia internacional da preguiça.
Resolveram se encontrar próximo de uma movimentada avenida, bem conhecida, na verdade, como o marco da capital. Ele estava só de camiseta e não entendia bem o porquê de todos os outros estarem tão agasalhados. Talvez ele fosse quente demais para sentir frio com uma brisinha a mais, embora seus pés estivessem frios como os de alguém que acabara de mergulhar em um riacho, coisa que só notaria um pouco mais tarde.
Haviam marcado em frente um café moderninho, naqueles que as pessoas se sentem à parte de toda uma sociedade carente de recursos e, talvez, segundo os que lá frequentam, desprovidas de cultura e bom gosto. Ele não gostava desse tipo de lugar e também não podia abusar muito de leite, já que lhe causava alguns desconfortos.
Esperou, ao som de "Ride", da Lana Del Rey, o rapaz chegar. Acendeu um e depois outro cigarro. Ficou observando o movimento da rua e lembrando-se dos anos que virava a noite por aquelas redondezas. Riu de si e viu como o tempo o havia transformado.
Ele estava ansioso. Era algo comum marcar um encontro para ele, mas ele estava ansioso por alguma razão e pensou algumas vezes em ir embora para casa. Mas ficou. Ficou e enfim o rapaz passou pelo outro lado da rua. As batidas do coração lembravam o motor de uma maria fumaça, mas procurou aparentar controle e serenidade. O rapaz estava atravessando a rua. Tarde demais para desistir e, naquele momento, ele já não iria desistir jamais.
Os dois se cumprimentaram com um abraço rápido, porém forte. Ele sentiu, por um segundo, a jugular do rapaz saltar... "talvez ele também estivesse um pouco nervoso", pensou. Para quebrar aquele gelo inicial, propôs de darem uma volta. Volta esta que deu início no ponto que saíram e os fizeram voltar para o mesmo lugar em menos de quatro minutos.
Resolveram tomar um café. Mesmo apreensivo pelo efeito do leite em seu organismo, ele pegou um cappuccino de chocolate para acompanhar algo com doce de leite que o rapaz havia pedido. Ele pôde experimentar aquele algo estranho depois, e de fato não lhe foi de agrado.
Subiram e desceram algumas vezes procurando encontrar um lugar agradável para sentarem, mas os assentos mais gostosos estavam todos ocupados. Decidiram ir à uma mesa no segundo andar e por lá ficaram.
Ele queria tocar-lhe, mas hesitava. Queria beijar-lhe os lábios, mas estes pareciam distantes. Resolveu pedir para ver suas mãos e, como justificativa, disse-lhe que queria ver as linhas de sua sorte, embora não possuísse o dom dos que praticam quiromancia. Sua sinceridade, todavia, lhe fez dizer em seguida que era só um pretexto para sentir sua pele o que acabou quebrando de vez a barreira invisível que separava o corpo um do outro.
O primeiro beijo foi dado. As línguas, enfim, puderam conhecer umas às outras e a noite pareceu perder-se no tempo.
Toques da pele macia ao som de Lana Del Rey. O calor dos corpos fazia suar além da conta, embora fosse uma noite fria. Carícias, carinhos, afeto...sim havia afeto. E ele disse que parecia uma noite de namorados, embora soubesse que, possivelmente, não passaria de uma noite de Lua de mel.
Os corpos dormiam entrelaçados. Como um nó entre dois seres. O calor os acordava hora ou outra. E a vontade em sentir todo aquele sabor e toque era constante.
Foi uma noite de Lua de mel. Sentiu para si que era um encontro diferente de todos aqueles que foram gozos seguidos de silêncio, como costumava dizer.
O dia nasceu. Chuviscando. Em silêncio. E ele foi para as ruas, viver mais um dia com uma lembrança que jamais poderá deixar de lembrar.