Insônia
Deitamos cedo, não era nem meia noite. Ele me olhou tão cansado e me disse que queria dormir. Não me opus, pois também estava cansado. E, além disso, sentir meu corpo gritar pelo dele. Queria abraça-lo, sentir seu calor. Fomos dormir.
Na cama, nus, como sempre dormíamos, encostei meu corpo ao dele. Meu coração palpitava, queria senti-lo. Ele não se mexia, percebi que ele já estava quase dormindo. Contive-me. Há dias não fazíamos sexo, mas isso não me incomodava, nossa rotina era muito cansativa. Eu, muitas vezes, não me sentia disposto a ter relações sexuais.
Virei-me para o outro lado e tentei dormir. Não consegui. A insônia me pegou, e a história de Bentinho me veio à cabeça, há alguns dias eu lia “Dom Casmurro” e por não ter terminado sua leitura, ficava imaginando os acontecimentos seguintes do livro. Sentia-me amigo de Machado de Assis, coisa de louco, ou talvez, loucuras da insônia.
Sei que todo mundo, em algum momento, pensou coisas absurdas, aquele era meu momento. Algum tempo se passou e o sono bateu à minha porta, fui atendê-lo. E já cochilava, quando o toque do celular o assustou e o fez fugir. Voltei ao meu estado inicial, de insônia. Peguei o celular para ver quem era que ousava me incomodar à uma hora daquelas, quase 2 horas da madrugada, não era meu celular. Só me dei conta disso quando já estava com o celular em minhas mãos. O que fazer, caro leitor?
Não sabe ainda que resposta me daria à questão do parágrafo anterior? Então me permita reformular essa pergunta: o que você faria em uma situação como essa? Não me julgue. Eu devolvi o celular para mesinha ao lado da cama, mas a insônia... culpem a insônia por tudo o que aconteceu após esse instante, ela me trouxe um turbilhão de pensamentos e em todos uma ordem que me gritava: OLHE O CELULAR.
Adivinhe o que eu fiz? Exatamente isso que você pensou. Peguei o celular, mas não antes de conferi se ele de fato dormia. Ele dormia como um anjo. Virei-me de costas para ele, cuidando para que a luz do celular não o acordasse, e fui ver que mensagem era aquela. Ele dormia seguro, estava certo de que eu não sabia sua senha, ingenuidade dele. Há tempos observava ele digitar sua senha, se não olhei seu celular antes foi apenas por questões éticas.
Abri a mensagem: era uma conversa no whatsapp. A ousada mensagem que chegara interrompendo meu sono não era demais. Apenas agradecia “Obrigado, Luis!” pelo quê é o que eu não sabia. Seguida da mensagem, algumas carinhas dando “bitoca” com corações. (Emojis do aplicativo).
Respirei aliviado. Mas não me dei por satisfeito em ler apenas aquela mensagem. Algo em mim precisava saber ao que aquela mensagem agradecia. Li toda a conversa. O “Obrigado” não era nada demais, o que era de arrasar era o que Luis tinha feito para merecer aquele “Obrigado”. Não consigo descrever para vocês, desculpem a minha incapacidade, mas não os deixarei na ansiedade. Segue a transcrição da conversa de Luis com Juvenal:
No whatsapp
Juvenal: - Adorei.
Luis: - Tb bb
Juvenal: - Quando vamos repetir?
- ???
Luis: - Amanhã cedo. Falo pro Pedro que vou trabalhar e passamos o dia juntos.
Juvenal: - Te espero!!!
Luis: - Me manda algo pra me animar.
Juvenal: - (Foto da bunda de Juvenal, aberta de tal forma que é possível ver a próstata dele)
Luis: - (Foto da pica de Luis)
Juvenal: - Delicia!!!
Luis: - Até mais!
Juvenal: - Obrigado, Luis!
Juvenal: - (Carinha de “bitoca” com corações).
E agora, caro leitor, es capaz de absorver-me pela invasão de privacidade? A verdade é que não preciso de vossa absolvição, o que vi naquela conversa já me absorve e me isenta de qualquer culpa. Devolvi o celular com cuidado, Luis mexeu-se e me abraçou. Ao sentir seu corpo nu encostar-se ao meu, desejo de algumas horas atrás, tive vontade de vomitar. Ele estava cansado, eu pensei, mas não de trabalhar. Seu cansaço se chamava Juvenal. Senti-me horrível, não sei dizer a vocês como, mas minha alma parecia ter ido embora e em meu corpo um monstro fazia morada. Tive vontade de matar Luis.
O corpo dele agora encostado ao meu me queimava. Lembrei-me da última conversa que tivemos, ele me disse:
- Pedro, faltam apenas 20 dias.
E eu lhe respondi fingindo não saber do que se tratava: - Para quê?
- 10 de setembro de 2016. Essa data não te lembra nada?
Quis me manter no jogo e fingi que não lembrava, só para vê-lo dizer com suas própria palavras: - Não. Eu lhe respondi.
- É o dia em que completamos 5 anos juntos... Ele disse já um pouco irritado.
- Eu sei, amor. Lhe respondi e disse-lhe que estava brincando. Abraçamo-nos.
Não preguei os olhos durante toda a noite. Não foi apenas a lembrança dessa conversa que me assombrou, muitas outras lembranças de momentos felizes me vinha à cabeça e, agora, depois da conversa que li em seu whasapp, parecia não fazer sentido. Eu me sentia acordando de um sonho, em que tudo que vivi não passava de uma mentira. Já dizia Jesus Cristo “Maldito o homem que confia em outro” e naquele momento eu me sentia maldito.
A dúvida sobre a traição rondava minha cabeça, mas não a traição de Luis, infelizmente, essa eu tinha certeza. A dúvida era sobre a traição de Capitu. E como o personagem Bentinho, decidi naquele momento de insônia, escrever a vocês essa desilusão arrasadora: a traição. Mas deixo-vos um alerta: em “Dom Casmurro” Bentino carrega a dor da dúvida, aqui carrego o desespero da certeza: eu fui traído. Eu tinha acordado de um sono de 5 anos. Agora precisava pensar no que fazer quando Luis acordasse de seu sono de uma noite.