O Lado de Qualquer Lugar - 1° Parte

De todas as pessoas, a única pessoa que poderia ter recebido, não era a pessoa a quem pertencia o grupo de todas. A existência era por demasiada comprometida, e os estereótipos eram extremamente explícitos e difundidos pela Mãe Árvore.

No vilarejo Lugar Nenhum existia a Comunidade Em Todo Lugar. Nessa comunidade de tudo se via: andarilhos, não andarilhos, pedantes, não pedantes, consonantes, não consonantes, brilhosos, não brilhosos. Para cada ser de Um Lado, havia o ser de Outro Lado e em qualquer vilarejo, a Dicotomia se fazia presente. A paridade era completamente ímpar.

Os serem de Um Lado viviam em perfeita harmonia, da mesma forma aqueles do Outro Lado. A Mãe Árvore é quem decidia qual o lado que o ser haveria de pertencer. Para tal, ela gravava na pele dos habitantes do Em Todo Lugar algo chamado Origem Genealógica Passível de Estereotipagem.

A Origem Genealógica Passível de Estereotipagem, ou simplesmente Orgepasse, era para a comunidade Em Todo Lugar, a Carteira de Identidade que é para os habitantes das outras comunidades de Lugar Nenhum. Há quem diga que a Mãe Árvore data de 1.500 anos, mas de acordo com achados recentes, parece que a Mãe tem bilhões de anos, e que ainda que morasse na comunidade Em Todo Lugar, gravava marcas em todos os seres de Qualquer Lugar, que é onde todos os seres de todos vilarejos habitam.

_ Mãin, não entendo o porque de eu não poder conversar com o Fulano.

_ Fília, já te disse que o Fulano faz parte do grupo Outro Lado. Não sou eu quem estou te proibindo de conversar com ele. Nossa Mãe foi quem decidiu. E não quero que você a contrarie. Ela existe desde que me entendo por gente, e da mesma forma que me guiou, guiou minha mãin e as mãins dela.

_ Mas Mãin, às vezes ele passa por mim e dá um sorriso e não sei o que...

_ Não quero ouvir mais nada, Nomine. E se eu souber que aquela escola de 5° tá tirando as Margens entre os alunos, ou te tiro daquela escola, ou solicito a sua Desorgepassão.

Nomine então foi para seu quarto, e continuava a questionar o motivo de não poder conversar com o Fulano. Sentia em seu âmago que os sorrisos do Fulano tinham significados. E se sentia impotente por não poder corresponder àqueles lindos sorrisos. Pensava que se sua avó Bíblia, ou seu pai Apóstolo estivessem com ela, certamente entenderia e sanariam seus questionamentos.

Bíblia e Apóstolo, eram para Nomine, o que o Sol era para os habitantes de Qualquer Lugar. Ambos faleceram quando foram quando bateram o carro. O pai de Nomine conduzia sua mãin para Alexandria, que é um lugar onde cuida com extrema importância daqueles que necessitam de ajuda. Entretanto, no meio do caminho, Apóstolo confrontou seu carro no muro em que tudo se perde.

Este muro é muito famoso entre todos habitantes, embora os habitantes de Em Todo Lugar achavam que esse muro só subjugava àqueles de Qualquer Lugar. Em sua arrogância se esqueceram que a comunidade em Todo Lugar pertencia a Lugar Nenhum, que pertencia a Qualquer Lugar.

No dia seguinte após a discussão com sua mãin, Nomine acordou, como de costume, incrivelmente disposta. Após tomar café e trocar sequer qualquer palavra com sua mãin, Consueta' Dinária, durante a ceia, seguiu para escola.

A escola Para Todos, onde Nomine estudava, aceitava qualquer aluno de qualquer lado. Quem a colocou lá foi seu pai, Apóstolo, apesar de Consueta ter sido extremamente contra tal escolha.

Ao chegar à escola, Nomine viu o Fulano, que entre o trocar de olhares, lançou aquele sorriso. Dessa vez, indiferente a opinião da Mãin, decidiu retribuir. Entretanto, ao finalizar o sorriso, olhou para baixo, e viu a faixa que a separava o Outro Lado. Sua amiga, Abomine, percebeu a reação de Nomine, tanto olhando para Fulano, quanto para a Linha Da Margem.

_ Amiga, vou fingir que nem vi você olhando para o Fulano.

_ Por quê, Amiga?

_ Olha o Fulano e aqueles amigos, Beltrano e Cicrano! Nossa, nem sei porque falei o nome daqueles seres insignificantes. Enfim, olha minha estirpe. Olha sua estipe. Olha essa Linha da Margem. Acho que nem preciso falar mais.

_ Mas, Abomine, ele é sempre tão simpático comigo que até fico sem graça de não o cumprimentar. Já tem algo em torno de 20 dias que ele sempre sorri pra mim.

_ Amiga, você tem que ficar sem graça é de cumprimentá-lo. Fora isso, tem de ter vergonha alguma.

_ Eu sei di....

Quando Nomine ia terminar a frase o sinal tocou.

_ Nomine, vamos pra sala.

Apesar das palavras de Consueta e Abomine, Nomine não conseguia pensar igual a elas. E embora o pensamento da Abomine tenha sido diferente, Nomine continuava fielmente com Abomine. Ambas sentavam ao mesmo lado, cadeira a cadeira, próximas à Linha da Margem. Abomine sentava exatamente do lado da Linha.

De um lado da Linha havia um professor, e da outra, outro. Ninguém nunca se sentiu incomodado com as palavras cruzantes. Os de uma linha, sempre prestavam atenção no professor da mesma linha, da mesma forma aqueles da Outra.

Mas alguma coisa mudou. Nomine prestava atenção nos dois professores. Sentia que conseguia ouvir os dois. Quando se virou para o lado, não viu Abomine, e sim Fulano. Percebeu que o Fulano também virava a cabeça para ambos lados da Linha, enquanto àqueles a frente dela, e próximos ao Fulano ficavam interditos aos respectivos professores.

_ Será que tem alguma coisa de errado comigo? Conosco? Não deixou de indagar Nomine em seus pensamentos. Sentia que tava traindo sua mãin e amiga. Nossa, como queria ter a minha Avó. Como queria ter o meu Pai - não cansava de repetir em seus pensamentos.

Os dias seguintes para Nomine eram todos iguais. Sem comunicação com sua mãe. Sorrisos escondidos entre ela e Fulano. Percepção da Abomine. Falta de sua avó e pai. Entretanto, num dia fatídico, algo mudou. Abomine não estava esperando ela como de costume na entrada. O sinal bateu e Nomine entrou na sala. Viu Abomine enfurecida e sua mesa no chão. Cumprimentou Abomine, que se recusou. Quando virou a mesa, leu: "Ainda que sejamos de Lados diferentes, quero estar com você Em Qualquer Lugar".

Gabriel Bayer
Enviado por Gabriel Bayer em 09/08/2016
Reeditado em 11/08/2016
Código do texto: T5723916
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